Menina Estrela, Hanabi-men e Outros Apelos Insensatos.

Enforquem o DJ

Eu lembro de estar sentado em um canto do bar, emburrado como sempre com meus fones afundados em minhas orelhas enquanto eu ouvia The Smiths e segurava um livro em mãos "minha descoberta da América", Do Maiakovski, no meu copo uma cerveja aguada e dormida que já não era tocada a no mínimo uma hora e ao meu redor na mesa uma meia dúzia de bêbados falando algumas merdas que estavam sendo abafadas por "hang the DJ".

Ela estava também no bar, parecia em casa, muito a vontade, ela sorria e jogava sinuca, era muito natural, talvez ela tenha sentido meu olhar a perseguir pois em dado momento me encarou e quando nossos olhos se encontraram entornei o líquido amarelo de meu copo que eu jurava ser cerveja a uma hora atrás, mas que naquele momento tinha gosto de água com detergente diluído e umas notas de milho, minha careta ao beber aquilo não a assustou, ela veio caminhando em minha direção e eu juro que o Morrissey tentava me avisar "No Hope, no harm just another false alarm" ainda assim meus músculos do rosto pareciam ter fugido de controle, pois estamparam um sorriso em minha carranca que era injustificável, eu diria até um tanto medonho. Ela se aproximou e quando estava a uns bons 5 passos de mim me disse algo que não pude ouvir com Morrissey cantando suas desilusões, franzi minha sobrancelha em perplexidade e ela apontou para os ouvidos, uma comunicação cômica e insensata, um momento muito privado de nós dois e ainda assim bem em público, me lembro de ter rido, talvez gargalhei um bocado, sei que chamei atenção, e os olhos dela brilhavam em um intenso esmeralda, lindas pedras preciosas que encantavam e causavam inveja até nas estrelas, tomado por esse feitiço de teu olhar apenas tirei o fone e pude ouvi-la:

- Quem vem a um bar com um livro?

- Alguém que não queria estar em um bar. - respondi automático, talvez eu tenha soado um tanto apático, mas é da minha natureza soar dessa forma. - Qual o seu nome?

- Michele - respondeu em tom complacente, era difícil acreditar que ela realmente queria conversar comigo - e o Teu?

- André - Menti, por motivo nenhum, apenas não queria dar meu nome. – Bom, Michele, foi um prazer, até uma próxima.

dizendo isso eu retornei um dos fones para o ouvido, mas antes que eu pudesse me isolar novamente nos meus devaneios, ela sentou-se na cadeira vaga a minha frente e agora me encarava muito próxima, eu podia sentir a respiração dela pelas minha narinas, tinha cheiro de Martini e morango, os bêbados da mesa pela primeira vez na noite estavam quietos, como se esperassem que eu explodisse em mil pedaços ou coisa do gênero, sabe eu nunca fui bom nessas coisas, flertar, beber, interagir com outras pessoas, eu nunca fui realmente bom nisso, então é natural que eu me sinta desconfortável com alguém tão perto, pior alguém que eu achava tão bonita e tentadora a menos de 8 centímetros de minha boca, olhando de perto sua pele estava rosada, eu deveria parecer um balão rubro naquele momento, ensaiei falar algo mas tudo que consegui fazer foi engolir seco, talvez eu devesse falar algo mas o que dizer? "Será que eu posso te beijar agora?" isso soa ridículo e impossível na minha cabeça, meus lábios se contorcem em um sorriso quebrado, e meus olhos por um momento cederam e piscaram vagarosamente e foi nesse momento em que senti a mão dela segurar na minha e me puxar.

Repentinamente eu me via sendo conduzido para fora do bar de maneira abrupta e eu nem pensei em oferecer qualquer tipo de resistência, talvez pelo estado de choque ou só pela sensação agradável que a pele dela causava ao tocar na minha, voltei a mim quando o abafado do bar se perdeu em meio a uma brisa fria e serena, a fumaça dos cigarros enfeitavam a fachada do bar dando um ar de melancolia noturna, ela me disse algo que não consigo de forma alguma resgatar em minha memória, nos beijamos e eu senti borboletas e ela disse que ouviu fogos de artifício, ambos demos risada e depois nos esquecemos, para ela sempre serei o André e para mim, ela sempre vai ser a minha melhor lembrança daquele dia tedioso de outono que fui arrastado para o bar.