1029-CRISE NO ELITE SOCIAL CLUB -

CRISE NO “ELITE SOCIAL CLUB”

1ª. PARTE

— Ora! — Disse enfaticamente o doutor Fontes para que todos os companheiros da reunião o ouvissem. — Se a minha idEia não agrada a todos, vamos ver quem tem outra igual, ou melhor.

Os membros da diretoria e os outros sócios entreolharam-se e alguns se puseram a cochichar.

Era uma questão administrativa — a queda da receita do clube — que se desdobrava num problema social: aumentar o quadro social para elevar a receita, abrindo as oportunidades para a admissão de pessoas de todas as classes, sem distinção da situação econômica, de cor e de religião.

O doutor fonte, médico com boa clientela, milionário devido ao seu trabalho e à boa administração que imprimira à magnífica Fazenda Aurora, herança da esposa, homem esclarecido e sem preconceitos, patroneava o “Elite Social Club” e lançava agora uma idéia um tanto quanto antipática aos sócios conservadores e fiéis à condição do nome do Clube: eram elitistas.

Tempos difíceis para o “Elite Social”, que, em função do rigor (elitista) aplicado na seleção das propostas de novos sócios, diminuíra em muito o quadro social.

A cidade estava em fervilhante transformação com a instalação de duas grandes indústrias e de numa nova agência de grande banco e a construção de barragem da Hidroelétrica do Oeste. , Esperava-se que dezenas de funcionários e grande número de técnicos e operadores de máquinas, todos vindo “de fora”, isto é, de outras cidades do país, e até alguns engenheiros do estrangeiro, iriam fixar residência na cidade.

Eram esses novos residentes e suas famílias que o doutor Fontes queria como membros do “Elite”. O ingresso de bom número de sócios viria certamente resolver os problemas financeiros do clube que o médico dirigia com competência.

O “Elite Social Club” era antigo, quase centenário, e com estatutos inadequados para os tempos atuais. Nos critérios de seleção das propostas apresentadas, o que mais pesava eram a situação econômica, a religião e a cor do proponente. Claro que não havia nenhum item na proposta que se referisse a essas questões, mas sabia-se que era um clube de ricos, brancos e católicos. Sem exceção.

Por patronear o clube, e homem de visão que era, o doutor Fontes percebia de antemão que, se o “Elite” ao acolhesse aqueles novos residentes, independentemente de cor, de religião e de boa situação econômica, fatalmente elas formariam o seu próprio clube. E aí, sim, o Elite acabaria por desaparecer.

Tudo isto fora exposto àquela assembléia, que causou cochichos daqui e dali. Durante uns dez minutos ninguém ousou levantar a voz, manifestando as opiniões.

A tendência era negar a abertura do “Elite” ao pessoal “de fora”.

— Imagine — cochichava Comendador Lampedosa ao seu parceiro de carteado de todas as noites — se vêm pessoas de bom cacife para nosso clube. Nem pensar!

Outro radical, o Evandro Celeste, fiel ao nome, carola e dono do cartório, e por isso, endinheirado e prestigiado, cochichava para o Armando Cruz, responsável pelos bailes:

— Vê lá se aparecem pretos ou protestantes no nosso clube! Deus que me livre!

— Sem falar que pode aparecer até algum maçom querendo ser sócio!

Por outro lado, os sócios de bom senso, como o atacadista Luiz Pelegrino, já tinham ideia formada:

— Se a idéia do doutor Fontes não vingar, ele ficará em cheque, e por mais boa vontade que tenha, perderá o entusiasmo, ao ver o clube definhar.

Sim, este pensamento era lúcido: o doutor Fontes, magnânimo patrono, mesmo esclarecido e com boas idéias, poderia perder o ânimo e o entusiasmo com que vinha impulsionando o clube nos últimos quinze anos.

Todos estavam de certa forma, ansiosos, tinham opiniões, mas ninguém ousava levantar a voz, dizer alguma coisa à proposta do patroneador, do líder, do simpático diretor-presidente.

Eu disse todos? Enganei-me.

Do fundo do salão levantou-se o Fernando Maia, conhecido como Nando Maluco, dizendo:

— Peço a palavra, senhor presidente!

Todos os olhares se voltaram para a figura esguia do gerente da Cooperativa dos Leiteiros. Todos com um único pensamento:

“Qual será a idéia que o Nando Maluco vai apresentar?”

= CONTINUA =

ANTONIO ROQUE GOBBO

Belo Horizonte, 19 de agosto de 2017.

Conto # 2019 da Série 1.OOO HISTÓRIAS – PLUS

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 21/02/2018
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