- ANGÚSTIA -
 
Sentada no corredor do hospital Helena aguardava. A cadeira era do tipo que fica enganchada em um eixo metálico junto com outras igualmente desconfortáveis. De frente para ela uma sala de exame. Do lado de dentro uma pessoa inerte, alheia a tudo, mergulhava em seu misterioso mundo mágico.

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Foi por causa da escola que ficou sabendo. A diretora a chamou à sala com brinquedos e veio com uma conversa diferente. Neuropediatra, psicopedagoga, avaliação...

- Para que tudo isso, mesmo?

A mulher enrolava. Tirava cartões de uma caixinha de metal. Recomendava.

Ela obedeceu.

- Sua filha é autista.

A primeira reação foi negar, descrer no diagnóstico, brigar com todo mundo. Afinal a menina parecia uma criança perfeitamente normal como as outras. Só não falava, só tinha aquele olhar vazio, só não atendia aos seus chamados, só não retribuía os beijos...

Todos os planos de Helena foram destruídos. A filha era como um projeto fracassado, uma decepção. A excelente situação econômica do casal permitiu que ela entregasse a criança para uma equipe de profissionais. O dinheiro gasto a aliviava da obrigação de ser mãe.

Inventava todos os tipos de compromissos e distrações para ficar longe de casa e da filha, mas assim que girava a chave e abria a porta era o mal-estar da culpa que a esperava.

O marido que pouco olhava para a menina, passou a evitar conversas com a esposa também. Chegava tarde, não sorria, não falava. Não era uma amante. Era a empresa.

Depois da falência. Amanda ficou por conta da mãe. Virou uma filha-fardo. Mãe e menina eram como duas estrangeiras trocando palavras ausentes e olhares vazios.

Enquanto a casa não era vendida, usavam a piscina.

Nas primeiras vezes Helena fazia tudo com segurança. Entrava com a filha na água, colocava a boia. A menina não saía do raso, não saía do canto, não tirava os olhos do ladrilho. Os dias iguais deixavam a menina mais sozinha e a mãe mais distraída.

Uma manhã Helena acreditou que podia ler enquanto a filha ficava parada na água. Na mesma manhã Amanda acreditou que podia conhecer a parte funda da piscina. Foi tudo muito rápido. Num instante a boia de cavalinho girava na superfície sem ninguém dentro.

- Quanto tempo sua filha ficou debaixo d’água?

Quanto tempo? Helena não sabia dizer.

A menina em coma, mais autista do que nunca, sonhava que era normal. No seu reino encantado de princesa e chuva colorida ela falava com as borboletas. A porta lá na colina. azul e sem serventia, parecia um convite. Do outro lado papai e mamãe chamavam para a vida que levava antes.

- Venha, Amanda. Venha.

Um dia foi até lá e fechou a porta para sempre. Para sempre...

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O exame terminou. Helena viu a filha passando na maca. Ia acompanhar, mas, antes que conseguisse; o médico simpático a chamou para uma sala confortável. Na mesa descansava um papel largo cheio de riscos indecifráveis contendo uma sentença que ela não que
ria ler.