Uma canção
Era uma noite fria, coisa que adorava. Andava em meio à multidão anônima. Não possuía o hábito de olhar para os demais. Muito autocentrada, desde sempre. Sair de casa não era um hábito corriqueiro, mas quis arejar um pouco. Cidade perigosa. O shopping era a única opção. Não a fazia muito bem, pois sentia um pouco de claustrofobia. Mas uma vez ou outra ...
Uma visita à livraria, cafeteria, um sorvete ou milk-shake. Essa necessidade de andar só, de ir aonde quiser e comprar o que desejar sempre me fez bem.
Mas havia o tédio, a vontade de não sair nunca de casa, o que não era algo bom para ninguém. Desde quando se cansara do mundo e se desinteressara das pessoas, exceto umas poucas? Não o sabia ao certo. Mas a solidão tinha um gosto de liberdade. As roupas folgadas que usava em casa, o cigarro sempre à mão. Essa coisa de combate ao fumo a irritava. Por que não combater a bebida, muito mais maléfica? O cigarro é um problema individual, a bebida causa mal a terceiros. Não há nada mais chato do que aturar bêbado. Sem contar os acidentes de trânsito, que tanto matavam. Mas a implicância é com o cigarro. Gente chata! Na verdade, a humanidade é chata, inconveniente, espaçosa. Poucos possuem sentido de limite e invadem os demais.
Sinto que todos me olham. Se eu me importasse com o que as pessoas comentam, juro que teria me matado. Não seguir tendências, ser autêntica, era algo que incomodava os “uniformizados”. Que se danem! Não me sustentam e suas opiniões não possuem força para me fazer mudar. Humanidade vazia.
Pronto! Cheguei à livraria. Boa noite! Estou buscando por algo que me desperte a atenção, não se preocupe comigo. Assim que achar, compro. Tantos livros, tantas opções. Mas preciso me preocupar para não comprar algo que já tenha em minha casa. Clarice Lispector? Li quase tudo, inclusive biografias. Este nunca comprarei, A Paixão segundo GH. Sinceramente, por mais que adore Clarice, colocar barata na boca me enoja. A Hora da Estrela, tentei ler. Deu-me agonia ver uma vida tão vazia e repetitiva. Desisti no meio. E foi assim com O Processo, de Kafka, e com Macunaíma. Achei-os chatos.
Lygia Fagundes Telles, todos os que estão aqui já li. Vai ser complicado achar algo que me interesse. Beauvoir? Hum, A Convidada e A Velhice. Quero-os. São livros que desejo ler. Simone de Beauvoir tem uma sensibilidade ao tratar dos problemas humanos que me faz refletir. Já li e reli A Mulher Desiludida tantas vezes! Levarei estes dois. Obrigada.
E agora? Acho que chega. Vou para casa, lugar a que pertenço. Um táxi, 5 minutos e pronto. Que beleza!
Chego a casa, entro, vejo meus gatinhos e minha cadelinha. Saudades da mamãe? Sigo em frente. Retiro a roupa, tomo um banho, coloco algo bem confortável. Que delícia! Agora só falta ligar o som e ouvir uma canção.
Campos, 20 horas e 9 minutos. 17/08/2017