Bilhete

Ana não havia dormido a noite e no entanto, quando amanheceu estava disposta como um passarinho que canta á luz do dia. Abriu as janelas e se sentou para ver as pessoas passando, umas apressadas, outras nem tanto. Ana gostava muito de observar as pessoas enquanto estas faziam suas coisas rotineiras, ela achava aquilo extraordinário. Já ela, quase sempre não fazia nada além de ler seus amados livros de segunda mão empoeirados que mesmo amando tanto, não tirava tempo para limpá-los. Ela só sabia ler.

Tomou seu café, penteou os cabelos e foi novamente sentar-se perto da janela, mas agora com um livro nas mãos. E era ela, a solidão e o livro. Depois de passar algumas páginas, notou, bem no meio do livro, um papel dobrado várias vezes. Achou aquilo algo muito extraordinário e entusiasmada abriu o papel com cuidado para não rasgar. Datava de 1978 e estava escrito: "Olá, se você descobriu este bilhete acredito que seja uma pessoa muito especial e eu gostaria de saber se está lendo este livro ou apenas folheando, responda-me por carta para o endereço que está logo abaixo..."

Ana logo quis responder áquele bilhete tão inesperado e especial, então foi para a escrivaninha e escreveu uma carta a pessoa misteriosa. Na carta dizia que ela estava sim lendo o livro e que estava gostando muito, e que o autor devia ser muito talentoso para escrever um livro como aquele, terminou a carta e foi ao correio.

Passaram-se dias, e ela não obtinha resposta para a carta que enviara, então resolveu ir mesmo pessoalmente conhecer a pessoa que havia lhe escrito. Não era muito longe de sua casa, afinal, era uma cidade pequena e de bicicleta ela foi.

Chegando lá tocou a campainha cinco vezes e esperou até que um senhor bem idoso a atendeu e perguntou quem era. Ana disse que encontrara o bilhete e que havia enviado a carta, mas que sem resposta quis ir ver com os próprios olhos a pessoa que lhe escrevera. Ana não quis entrar e ele lhe contou que aquele livro fora ele mesmo quem havia escrito e que pouquissimas pessoas o tinham lido. Seu sonho era ser reconhecido como escritor, mas como não tinha muitos leitores resolveu escrever um bilhete e colocar no meio de um livro seu e doar-lhe para a biblioteca da cidade que fazia doações de livros semanalmente. Ele lhe disse que a finalidade daquilo era saber se alguém algum dia leria seu livro e que descobrir que uma menina tão jovem o lera foi incrível.

- Quero ser escritora. - Disse Ana.

- Ora, pois irá de ser. Quando for escrever, você apenas tem de viajar para onde quer que você queira estar, e entrar na história que você está escrevendo. Os mistérios da escrita, ninguém desvenda, e ninguém sabe para que escritores escrevem. Para que eles escrevem? Ora, para serem lidos. E por que querem ser lidos? Para que serve ler um livro? Para obter sabedoria. E não só sabedoria minha cara, serve também para fazer você viajar. Já eu por minha vez, não consegui sucesso sendo escritor, mas você conseguirá, vejo em seus olhos. E não preciso saber que vendi muitos livros ou que me tornei um famoso escritor, para mim, escrever só me basta, muitas vezes só preciso ser lido por mim mesmo e assim, eu me entendo.

Samela Samaí
Enviado por Samela Samaí em 01/08/2017
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