Aprendiz de escritor
Não cursou faculdade de Letras. Também não fez cursos literários. Mas tinha o dom para escrever. Era um escritor nato. Um autodidata das letras, mas ainda sem reconhecimento. Abejair Winner tinha sobrenome de vencedor, mas amargava uma vida dura e pobre. Apesar de ter feito nove livros não conseguiu publicar nenhum. Para viver, vendia livros. Trabalhava numa livraria sonhando um dia ter seus livros lá. Mas enquanto este dia não chegava ia vivendo e escrevendo.
Abejair era órfão de pai e mãe. Seu único parente era um tio que morava bem distante dele. Seu tio, Nicanor Santi, era escritor. Quem sabe ele não o ajudaria a publicar seus livros? Nas férias, Abejair Winner foi à Bahia visitar seu tio. Nicanor o recebeu muito bem. Nicanor Santi era solteiro e não tinha filhos. Ele era irmão da mãe de Abejair, mas perderam o contato quando ela se casou com o pai de Abejair.
— Então você escreveu nove livros, Abejair?
— Sim, tio. Mas ainda não publiquei nenhum deles. — Disse, com uma ponta de tristeza, Abejair.
— Você registrou os livros?
— Não tio. Nenhum deles. Vou deixar a editora que quiser publicá-los registrá-los.
— Entendi. — Disse Nicanor Santi enquanto acendia um cigarro.
— Eu gostaria que o senhor me desse sua opinião sobre meus livros, já que o senhor é escritor, tio.
— Pode deixar, meu sobrinho. Vou lê-los. Se eu gostar ajudarei a publicá-los. Prometo.
— Obrigado, tio. Sabia que podia contar com o senhor.
Abejair foi embora no mesmo dia em que chegou. Deixou seus originais dos livros e sua esperança com seu tio, rezando para que ele os aprovasse. Abejair tinha um bom motivo para voltar logo ao Rio de Janeiro: queria encontrar-se com Ana Flávia, sua namorada! Estavam namorando há pouco mais de um mês e a paixão era arrebatadora. Não conseguiam se desgrudar um do outro. Pareciam até gêmeos siameses.
Ana Flávia conhecera Abejair na igreja. Ambos eram evangélicos e frequentavam a mesma igreja no Lins de Vasconcelos. Foi num domingo de manhã, durante uma troca mútua de olhares, que Abejair tomou coragem e foi falar com Ana Flávia. Ela aceitou namorá-lo e estão juntos desde então. A bela morena é professora e dá aulas no Colégio Pedro II do Engenho Novo.
Passaram-se seis meses, desde a visita de Abejair a seu tio, e nada de seu Nicanor ligar para ele. — Será que aconteceu alguma coisa com ele? — perguntou-se Abejair preocupado. Decidiu esperar mais um pouco. Vai ver ele não leu os livros ainda. — pensou Abejair, lembrando-se de um antigo ditado: “quem tem pressa come cru.”
Ana Flávia estava no cinema com Abejair Winner, mas ele não estava nem aí para o filme. Estava com o pensamento na Bahia. Seu tio não lhe retornara os telefonemas. — Será que aconteceu algo com tio Nicanor? — pensou, visivelmente preocupado, Abejair. Resolveu ligar uma última vez. Se ele não atendesse, Abejair iria até a Bahia para saber o que houve. Abejair ligou. O telefone chamou, chamou e... chamou, mas ninguém atendeu. Abejair Winner preocupado com o tio resolveu ir naquele dia mesmo à Bahia. Avisou Ana Flávia e foi até Salvador para saber o que aconteceu com seu tio.
Abejair descobriu que seu tio havia morrido de repente, de infarto fulminante. Mas antes, ele publicara todos os livros do sobrinho... em seu nome! Mas, ironia do destino, ou a justiça de Deus, Nicanor Santi tinha apenas um parente vivo: Abejair Winner! E coube ao sobrinho toda herança do tio, inclusive os royalties dos nove livros que seu “querido” tio tentou surrupiá-lo...