Ele odeia estudar
Ele odiava estudar. Não tinha algo que ele odiasse mais no mundo do que ir à escola. A escola era chata. Os professores eram chatos. Os colegas todos riquinhos, metidos a besta. Ele odiava a escola, mas não se governava e a mãe o obrigava a ir. E em casa o obrigava a estudar. Estranhamente ele era bom em aprender.
Quando chegou a adolescência o seu ódio por escola só aumentou. Aprendeu a matar aulas quando estava na quinta série. Saia para ir para escola, mas sempre acabava com uma turma de amigos, que também não gostavam de aula, jogando bola escondido, ou então caçando de bodoque por ai. Aulas eram raras na sua vida.
Os professores nunca se preocuparam em chamar a mãe para explicar as faltas. Então ele aproveitava. Era quase um dia sim e um dia não. Suas notas caíram. Sua mãe descobriu suas escapulidas e bateu nele. Ele se revoltou. E agora além de ir pouco na aula, pois seguia fugindo mesmo que isso acarretasse em castigo posterior, ele também não se importava mais com as notas. Resultado, ele reprovou.
A mãe chorou quando descobriu isso. Ele recebeu como castigo não poder sair de casa durante todas as férias, mas sabe como é mãe, não durou nem quinze dias e logo ele já estava com as más companhias novamente. Era assim que a mãe chamava seus amigos. “Más companhias”.
Quando teve que repetir a quinta série ele tinha ainda menos vontade de estudar, mas ai apareceu à linda Lenice. Ela era uma menina moreninha, que sentava na frente na sala de aula e participava de tudo na aula. Ele então se apaixonou e não mais faltou aula. Ele até tentava ficar perto dela, mas ela fazia parte do grupo dos estudiosos e ele dos bagunceiros, então decidiu mudar e tirar boas notas para entrar pro grupo dela. Não surtiu efeito na quinta série, mas ele estava apaixonado e persistiu na sexta, depois na sétima e então quando chegou a oitava ela foi embora sem que ele tivesse cumprido esse objetivo.
Ele novamente se deu conta o quanto ele odiava estudar, mas na oitava ele fazia parte do time de futebol da escola e somente jogava no futebol da escola quem não tivesse notas baixas e então ele seguiu estudando. Era necessário.
Depois veio o ensino médio e com ele a primeira namorada. Maria, ela era um loirinha, filha de uma professora da escola. Ela era a pessoa mais inteligente da escola e fez a maioria dos trabalhos dele. Forçava-o a estudar para as provas e ele como estava apaixonado fazia tudo o que ela queria e assim terminou o colegial e junto o namoro.
Ela foi para faculdade. Ele sem dinheiro arrumou um trabalho numa loja e por ali ficou. Um ano depois o seu patrão, que gostava muito do moço, o obrigou a fazer o vestibular. “Eu ajudo você a pagar a faculdade”, o patrão dizia “mas eu odeio estudar” ele respondia, mas tinha medo de ficar sem trabalho e então prestou o vestibular, passou em primeiro lugar e ganhou uma bolsa da universidade. Se matriculou em física. Não porque queria fazer física, mas porque assim poderia ficar próximo de Maria, ela fazia física, ledo engano, ela já tinha outro namorado.
Ele então descobriu um rival. O novo namorado de Maria era do seu semestre e então, ele fazia o que podia para parecer mais inteligente e para ter notas melhores do que o seu rival. Depois de um tempo percebeu que gostava de física. No final do curso não ganhou Maria de volta, mas suas notas lhe deram um mestrado.
Parou de trabalhar na loja e passou a dar aula numa escola durante o dia e fazer seu mestrado a noite. Foi ai que ele conheceu Lídia. Ela fazia mestrado de biologia. Apaixonou-se e o namoro engrenou. Com o fim do mestrado veio a noticia. Lídia ganhará uma bolsa no exterior para doutorado. Ele estava cansado de estudar e então ficou, mas logo percebeu que Lídia era o amor de sua vida e que não poderia perde-la e então para ficar com ela concorreu a uma bolsa de doutorado de. Conseguiu e foi. Não porque desejasse estudar, mas porque queria ficar com Lídia.
Lá se esforçou o máximo, não porque gostava de estudar, mas porque Lídia estava sempre ocupada e ele não conhecia ninguém e nem tinha grana para fazer turismo e então fazia o que restava, que era se dedicar a sua tese. Concluiu com louvor.
Depois veio o casamento e um trabalho numa universidade. Então o primeiro filho. Agora, já doutor e respeitado, ele está pensando em fazer um pós doutorado, não porque gosta de estudar, porque ele odeia, mas porque com o titulo vai ganhar um aumento e o moço quer comprar uma casa na praia. Vale a sacrifício, mas ele deixa bem claro: Ele odeia estudar. Não há nada no mundo que ele odeia mais do que estudar.