A árvore
A dor invadiu seu coração. Cortou-o como uma faca afiada, cravada por um fazendeiro impiedoso a matar um animal, na frieza da rotina. Teve medo de não voltar a ser feliz. Desesperou-se com a solidão que invadiu seu coração. Era tarde demais.
A sombra do remorso iria persegui-lo para sempre. Tudo aquilo era culpa sua. Só sua. Teria, Deus, deixado de olhar por ele há muito? O silêncio da tarde se fortalecia com o início da escuridão que caía com a noite. O amarelo-alaranjado do horizonte dava lugar ao negro. As primeiras estrelas já brilhavam.
Decidiu se levantar. Caminhou em direção ao carro que encontrava-se há poucos metros dali. Acendeu um cigarro. A noite trazia com ela o frio. Foi sentar-se no banco do motorista.
Queria chorar, mas o choro não lhe veio. Queria gritar. Mas de que adiantaria? Era o fim. Acabou-se e nada que pudesse fazer mudaria aquilo. Lembrou-se da bebida que trazia ao porta luvas. O calor do álcool esquentou sua garganta. Por mais uma vez, ou duas, serviu-se com abundância.
Ligou o carro. Para onde ir? Não tinha nada. Nem lugar para ir, nem com quem falar, nem o que fazer.
Andou sem rumo, com a garrafa ao meio. Numa curva, foi dar com o carro numa árvore. Morreu.
Eis que se faz o velório. Lá estava o espírito do homem. Observou chorar seus velhos amigos. Ouviu os cochichos de parentes mais cínicos. Falavam de suas peripécias amorosas. Irritou-se com um primo sacana, que aumentou um acontecido numa cidade vizinha. Não podia defender-se. Jazia frio em um caixão barato.
Detestava velas e não as podia apagar. Odiava velórios e estava no seu próprio. O que fazer? Já não tinha nada. Para onde ir. Com quem falar.
Caminhou, fantasmagoricamente, até a rua. Viu não estar longe do local onde morreu. Foi correndo lá. Achou a meia garrafa. Por sorte podia ainda beber, mesmo estando morto. Entornava grandes quantidades de bebida goela abaixo.
- Hey, senhor, isso é soro fisiológico. Preciso que volte para a cama ou terei que amarrá-lo.