A VIDA
Maio, 21 2017
Olho para minha vida, revejo o que passou, volto no tempo até o interior do Rio Grande do Sul, numa pequena
cidade onde nasci e me criei, dez filhos, eu a última, de uma família simples e muito pobre, mas sobretudo honesta e digna.
Meu pai sempre falava que o maior tesouro de uma pessoa é seu nome, seu caráter, andar na rua de cabeça erguida, sem ninguém a lhe apontar o dedo chamando de ladrão. Coitado, ficaria tão decepcionado se vivesse ainda, pois os homens letrados que foram escolhidos para representar o cidadão, são os mais corruptos, e nem ao menos tem vergonha de seus atos, pois sempre mentem e se dizem inocentes. Pobre papai que acreditava tanto na honestidade, liberdade, respeito.
Pelo menos os filhos que ele gerou, e que infelizmente também já partiram, restando agora só eu, foram todos seus fiéis seguidores, aprenderam tudo que lhes foi ensinado e pode ter orgulho de todos, mesmo lá do outro lado. Felizmente tua lição passou de geração a geração, pois teus netos também são motivo de orgulho.
Me pergunto se foi a pobreza, a dificuldade pela vida que te ensinou tudo isto. Mas naqueles tempos idos, a vida não era fácil para tantos, então deveríamos ter tido gerações mais íntegras. O que aconteceu para que o homem se desvirtuasse tanto. Talvez o poder, que todos
querem e são capazes de tudo, egoisticamente, para alcançar e manter. Olham apenas para fora, para onde querem chegar materialmente, não tem um só olhar para dentro de si, onde talvez
ainda restasse algum sentimento bom, o que os tornaria melhores em tudo.
Não vejo esperança neste cenário, e isto é triste, pois somos movidos pela esperança.
Agora, no tempo que me resta, pois também partirei, embora saiba disso e me assuste a ideia, peço a Deus que hajam reformas, reformas de leis e de homens, se não tudo continuará igual.
Falando em assustar, a morte sempre nos causa medo, embora saibamos que a única certeza que temos neste mundo é que ela chegará um dia, pois ao nascer já a trazemos conosco, mas é como
se fosse um monstro, uma inimiga, que sempre ignoramos e nem queremos ouvir falar. A dor da perda de um ente querido ninguém consola, ela passará, mas é triste demais, e causa muito
sofrimento. Mas este sofrimento nos lembra também da presença dela, e choramos por quem foi e também pelo nosso medo de partir e deixar quem amamos tanto. Pode ser que este sentimento seja só meu, por já estar com 70 anos; mas não vou negar, posso até me envergonhar por isso, mas preciso ser honesta sempre. Busquei sempre minhas verdades, enfrentar meus medos ou quando não souber enfrentá-los pelo menos aceitá-los.
E assim escrevo, para diluir a dor e entender e aceitar que tudo é transitório, e é natural que assim seja. Já plantei meu jardim, colhi flores e frutos belíssimos e só tenho que ser grata à Deus e serenar e enfeitar minha alma.