Aos noventa
Aos noventa anos, ele acordou e olhou ao seu lado onde sua esposa (com quase a mesma idade que ele )dormia tranquilamente. Nada falou.
Levantou-se mudo. Arrastando a pantufa ao caminhar, foi até a varanda. Olhou ao longe as arvores florida, ouviu o cantar dos pássaros. Questionou pensativo: Será que TODOS os pássaros realmente cantavam? Será que o som de alguns não seria um choro de saudade? Saudade da vida que se ia.
Sentou-se na varanda depois de olhar os pássaros e a natureza e só então olhou para si mesmo: Suas mãos! Ah! Tanta vida aquelas mãos haviam tocado. Tanto havia feito. E agora...Agora elas estavam finas, enrugadas. Não mais habitava nelas a agilidade. A pele embora fina, não tinha mais o mesmo vigor.
Seu corpo não mais respondia a seus instintos! Mas mesmo assim, se viu jovem se enroscando com a mulher que fora seu primeiro amor (e com outras mais pela vida afora).
Pensou nos filhos, nos netos. Um filme desfilou diante de seus olhos.
Sentia-se numa escada rolante e via que o momento de saltar estava chegando, porém não tinha forças para efetuar o salto. Fechou os olhos e esperou sentia que iria cair. Fechou as mãos firmemente e mordeu os lábios com força!
- Pai acorda!
Olha para a filha (pequena: três aninhos). Suspira aliviado e pergunta para a esposa:
-Querida. Que dia é hoje?
- Oito de Julho. Seu aniversário. Vinte e seis anos! Parabéns!
Nossa! Fora tudo um sonho (um pesadelo). Havia (ainda) uma vida inteira para ser vivida.
Um dia de cada vez. Degustando.(Não queria correr o risco de acordar num dia qualquer de seu futuro e descobrir que a vida havia ido embora sem que ele a houvesse vivido).