Mascaradamente

Josenílson era uma cara boa pinta, daqueles que fazia a mulherada suspirar. O corpo vem definido, devido ao trabalho duro. Josenílson era pedreiro. Esperto. Muito bom. E sério. Josenílson não era de brincadeira. Se falasse, podia confiar, nunca faltava com a palavra. Aliás, o seu falar era o que o tornava uma figura. Precisasse de conselho, era só consultar Josenílson.

- Josenílson – disse um dia Lucivalda – tô com uns pobrema meio imbaçado.

- Pô, fala aí Lucivalda que derepentemente eu posso ajudar a sua pessoa.

- É o Edicarlos. Tô disconfiada que ele num tá mais afim d’eu.

- Calma, Lucivalda, derepentemente ele só tá preocupado. Conhecendo o Edicarlos como eu conheço, vejo claramente que tá somente preocupado. Afinal, o Edi Júnior tá crescendo rapidamente. Ele é um ser humano bom.

- Será Josenildo?

- Certamente! Agora esfria a muringa senão o barato indóida.

- Falô Josenildo. Cê é firmeza mêmo!

- Nem...

E assim era a vida de Josenildo. Gozava de muito prestígio no bairro de Nova Esperança. Sempre extrovertido. Brincalhão. Carregava em si uma aura diferente. Josenildo parecia um anjo. Como aqueles que, vem demonstrar sabedoria, compreensão e humildade. Como muitos anjos que aparecem em nossas vidas.

- Vâmo pro samba, Josenildo? Vai rolá um show do Zeca.

- Certamente, Rosicarla. Tô involvido nessa inteiramente. Vâmo sambá divagar divagarinho... Sei tudo dele, curto o cara pra caramba. Presta atenção, ó: Já tive mulheres de todas as cores, de “variedades”, de muitos amores...

- Xi, Josenildo, esse aí é outro? Cê tá confundindo as bóla.

- É que derepentemente me veio essa música na cabeça. Olhando assim pra você, Rosicarla, me deu rapidamente uma inspiração.

- Ai, Josenildo. Você é firmeza!

- Intão cóla aqui no papai e vâmo dança até dimanhã. Ui ui ui.

A noite não foi de muito romantismo, de Romeu à janela de Julieta declarando o seu amor. Foi amor demais. Sem rodeios. Mostra pro que veio e pimba. Foi assim ou não foi, Josenildo?

- Certamente, mano, foi maravilhosamente boa!!! A Rosicarla derepentemente me puxou pra si, e aí... Só Prazer.

Josenildo era assim, sempre achava num deslize uma saída, fazia da situação uma cantada. Filósofo e periferia. O que não o fazia diferente de Nietzche. Josenildo era assim. Forte por fora. Forte por dentro, tão famoso quanto um popstar. Todos queriam estar perto dele, falar com ele, ser amigo dele. Mas como todo ser humano que se preze, Josenildo tinha um ponto fraco. Lembre-se que até o superman, o homem de aço, tem na criptonita o seu ponto fraco. E é delas que seus inimigos se utilizam quando pretendem derrota-lo.. Talvez a criptonita de Josenildo fosse uma mágoa... Uma feria aberta. Daquelas que nem o tempo consegue remediar. Não queria, mas sentia. Mas o que? Bem...

Certo dia, estava Josenildo andando pela rua. Conhecido de longe pela sua ginga e pelo seu falar, caminhava (des)preocuopadamente quando uma lembrança lhe veio à mente e à frente. Era um rosto obscuro. Parou... Tremeu... Perdeu a fala... E quase os sentidos. A lembrança que corrói e machuca estava bem ali. À sua frente.

- E aí, Josenildo, sentiu saudades?

(Pausa)

Nova Esperança jamais seria a mesma depois desse dia. Josenildo também não. Seria um fantasma? Não, não seria possível porque Josenildo não acreditava em fantasmas. Mas bem que uma assombração poderia aparecer para que ele mudasse o seu conceito. Não! Sim? Uma mistura de sensações o levam para trás e para frente, passado! Presente... Futuro? Uma tempestade cerebral se forma! Mas Josenildo está ali. Parado... Em pé... diante daquilo que não acredita. Bom ou ruim? Nem isso ele sabe mais. Falar? Correr? Agir?

- O que tu faz aqui – perguntou Josenildo.

- Senti saudades e vim te ver!

- Tu sabe que eu já não quero mais te vê, caramba!

- Mas eu não resisti. Nunca vô consegui fica longe de você.

- Me deixa em paz.

- Não!

- Por que?... Por que tu faz isso? Já não foi o bastante?

- Não!

- Que merda!

(Pausa)

Os dois se olharam, mas o que será que havia entre eles? Será que a criptonita está fazento efeito? Acho que sim. Josenildo tem o semblante tenso. Diferente do que estamos acostumados a ver. Aquela alegria desaparecera – se é que um dia existiu. Mas Josenildo está ali. Parado. Sem ação. A fala custa-lhe a sair. Sai rouca. Está sendo sufocado.

- Que merda! Que merda! Logo agora?

- É agora mesmo. Mas vai sê a última. Pra sempre! Adeus Josenildo!

Um estouro corta o silêncio. Corre-corre. Muita choradeira. Corre-corre. Sirenes. Ambulância. Polícia. Um corpo. O corpo. Sangue e indignação. Choro e revolta. Indignação e revolta. É o fim de uma história. Mas que história? Aquela que não foi revelada. No circo, sempre há um alguém por trás da pintura. Atrás do nariz vermelho existe alguém que chora... sofre... Mas faz os outros rirem. Aquele palhaço é o que é no picadeiro. Até que o circo seja desmontado e vá embora. As crianças que sorriem com as fantasias não sabem que aquele palhaço é humano. Talvez nem seja. O que se sabe é que ele vive para o sorriso dos outros. A máscara esconde a face de um passado cheio de segredos. Segredos que já não podem ser revelados. Os moradores de Nova Esperança estão com medo. Mas para eles, Josenildo ainda é um ídolo. Embora, nunca se saiba dos fatos por trás da máscara!

Jean Xavier
Enviado por Jean Xavier em 09/08/2007
Código do texto: T599382
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