Boneco palito

Olhos baixos, a criança sentou-se na cadeirinha indicada pela psicóloga. Na mesinha à sua frente, havia lápis, canetas hidrográficas, lápis de cor, giz de cera, papéis de vários tamanhos, uma régua e borracha.

- Pegue um papel e faça o desenho - disse a psicóloga, em tom amistoso.

- Você vai ficar olhando? - Perguntou a menina, desconfiada.

- Não, eu vou ficar na minha mesa, ali no canto. Quando você terminar, me chama.

- Tá bem.

Cautelosamente, a menina começou a mexer no material de desenho. Pegou um papel médio - metade de uma folha A4 - e um lápis comum. Pressionou a ponta do lápis contra um dedo, antes de começar. Satisfeita, pôs-se à desenhar.

- Terminei - disse após algum tempo, erguendo a cabeça.

- Traga aqui - chamou a psicóloga.

Desenho sobre a escrivaninha, a criança sentada ao seu lado, a psicóloga começou a fazer suas observações. "Desenho monocromático feito na parte inferior da folha", escreveu num bloco de anotações amarelo, preso à uma prancheta. "Uso de lápis comum apontado, traço contínuo."

- Me fale do seu desenho - disse para a menina. - De quem é esta casa?

- É a minha casa.

Desenhada no meio da folha, a casa era pequena, porta pequena, com uma fechadura diminuta à esquerda. Duas janelas à direita da porta. Pela chaminé, saía um rolo de fumaça escura.

"Tendência à introspecção, caráter reservado. Pensamentos ligados ao passado, necessidade de segurança futura, condições desfavoráveis no presente", anotou a psicóloga.

- E estas, quem são? - Indicou dois bonecos palito desenhados à direita da casa, mãos dadas.

- A maior é minha mãe. A menor é minha irmã caçula.

"Olhos e boca pequenos, sem ouvidos. Braços para baixo, sem mãos. Impotência ou omissão perante a situação atual?"

À direita da folha, no alto, um sol enorme, dardejante.

- Esse sol parece quente - comentou a psicóloga, olhando para a menina.

- Ele está com raiva - respondeu ela, desviando o olhar.

À esquerda da casa, havia dois bonecos palito em tamanho menor. O maior parecia pressionar o menor contra o chão. O menor, cabelo comprido, não possuía boca nem pés, e os olhos eram apenas pontos.

- Quem são?

A menina apontou o boneco maior:

- Este é o tio Frank.

E indicando o boneco menor:

- Esta sou eu.

A psicóloga parou de escrever por alguns instantes, olhando para a porta fechada do consultório enquanto tamborilava com a caneta no bloco de anotações. Finalmente, virou-se para a menina e perguntou:

- Por que você e o tio Frank estão afastados da sua mãe e da sua irmã, Marsha?

Cabeça baixa, a menina respondeu em voz baixa:

- Porque o tio Frank diz que eu sou só dele.

[07-04-2017]