Santo cunhado
Paulo e Paula assistiam ao noticiário das oito quando a campainha tocou como uma risada assombrosa. “Quem seria uma hora dessas?”, perguntou a mulher, se levantando do sofá. “Pelo jeito da campainha só pode ser o folgado do teu irmão”, resmungou o marido, sem se mexer de seu canto favorito. Era ele mesmo, o irmão caçula de Paula – largara a faculdade, o emprego e vivia pedindo dinheiro para montar o próximo novo negócio que ele iria falir em dois meses. Foi chegando na sala contando uma piada sem-graça, filou o cigarro de Paulo, pediu à irmã uma cerveja gelada, mudou de canal, e Paulo tinha certeza de que ele tinha soltado um peido. “Sabe aquele dinheiro que eu estava te devendo?”, começou o caçula, “Investi em um carrinho de lanches. Em dois meses eu vou estar rachando o bico de ganhar dinheiro. Daí eu te pago, com juros, pode me cobrar. Mas no momento, eu preciso pagar a taxa da prefeitura, e...”. A mulher chegara com um bolo de notas enroladas em um elástico e entregou ao irmão. “Valeu, mana. Você é a maior! Valeu, Paulinhô! Vocês vão agradecer por terem financiado mais um empreendedor de sucesso!”, e saiu, afanando mais um cigarro. A mulher se recostou no peito do marido, agradecendo pela paciência, aclamando-o como o melhor marido do mundo. Desligou a TV e foi para o quarto trançando os cabelos. “O filho de uma égua bebeu a última cerveja”, pensou, antes de ir atrás da esposa toda generosa, e em meia hora tudo estaria esquecido – a cerveja, o dinheiro, tudo –, e estaria pronto para receber o cunhado na semana seguinte. Santo cunhado.