Impostos
Depois de anunciar sua presença, o publicano armou a banquinha de cobrança bem no meio do pátio da vila: dez casinholas de dois pavimentos e não mais de 30 metros quadrados, cada. Sentou-se numa cadeira de armar e enquanto aguardava, revisou os números num rolo de papiro. A filha mais velha de Ibrahim, por exemplo, estava completando doze anos: devia cobrar um denário do "tributum capitis". Por outro lado, Ichabod havia feito 66 anos: menos um denário para os cofres romanos. E ainda havia a questão da taxa extra...
- Deus esteja convosco, publicano.
O publicano ergueu os olhos do papiro e viu à sua frente Menashe, o pastor, seguido por outros seis homens.
- Assim seja - respondeu.
Menashe estendeu a mão direita e entregou-lhe quatro denários.
- Eis os tributos referentes à mim, minha mulher, minha sogra, e meu filho Jaron.
- Ah sim, Menashe. Está correto. Só que...
Jogou as moedas numa caixinha de madeira sobre a mesa e anotou "pago" ao lado do nome de Menashe.
- Só que o quê? - Inquiriu o pastor.
- Eu também estou cobrando uma taxa extra para o novo palácio do tetrarca. Cinco perutahs por família.
Menashe e seus vizinhos se entreolharam.
- Cinco perutahs? - Exclamou o velho Ichabod. - As colheitas vão de mal a pior por causa da seca, os romanos inventam impostos e ainda temos que pagar taxa extra para Herodes? Vocês, publicanos, acham que temos jarras com moedas enterradas no quintal?
Um vozerio de aprovação ergueu-se dos demais presentes. O publicano ergueu os braços, pedindo silêncio.
- Calma, povo! Eu imaginei que não teriam como pagar de imediato, portanto já trouxe a solução.
Sete pares de olhos desconfiados cravaram-se nele.
- Todos vocês conhecem Meshullam, o comerciante de vinhos?
Meshullam era uma figura conhecida na região. Ultimamente, começara a comprar terras próximas à vila. Comentava-se que pretendia construir ali uma casa de campo, nos moldes romanos.
- Pois Meshullam vai lhes emprestar o dinheiro do tributo, em troca de uma pequena taxa de juros, naturalmente.
- E para quem não puder pagar nem o principal nem os juros? - Indagou Menashe, desconfiado.
- Certamente que Meshullam terá trabalho para os que não puderem pagar. E, caso precisem de empréstimos maiores, ele está disposto até mesmo a aceitar as terras de vocês como garantia. Viram como é bom ter um vizinho rico por perto?
A resposta de Menashe veio entredentes:
- Se fosse possível aos ricos contratarem pobres para morrer em seu lugar, todos os nossos problemas financeiros estariam resolvidos.
O publicano não se deu por vencido.
- Oh, eu conheço o ditado. Mas pode estar certo, Menashe: Meshullam quer todos vocês vivos, e gozando de boa saúde.
E com um sorriso sardônico no rosto:
- Antes de comprar a casa, ele perguntou pelos vizinhos.
[01-03-2017]