Retirou um livro da bagagem de mão.
— Eu gosto tanto disso aqui!  É como namorar. Tem dia que me sento só pra namorar! Olhar pra livro... Fico namorando livros como se a vida real fosse uma ficção que se transcreve para o papel.
Desafivelou o cinto e sentiu o cheiro de cravo e canela escorrendo na caneta de Jorge  que, embora muito  amado, teve também seus dias de calvário na masmorra do exílio. Em seguida, regulou as lentes da imaginação e viu  nuvens que desfilavam  velozes  na janela da aeronave como se ele abrisse páginas armazenadas no cloud computing.
Pensou alto:
— O avanço tecnológico impulsionou a literatura  ao criar livros  para ouvir, esse recurso oferece significativa contribuição para evitar que morram árvores para que livros tenham vida — disse Carrero.
Reclinou o assento buscando conforto no pequeno espaço entre as poltronas. E prosseguiu a conversa com o passageiro com quem há pouco estabelecera laço de amizade.
— A literatura virtual tem muita patacoada, mas não há dúvida de que também há boa medida, recalcada, sacudida e transbordante de bons talentos.  Tu mesmo penetraste bem com Jacó na tenda de Labão. Abençoaste Raquel, sem excomungar Lia.  Camões fez o mesmo em sua lira de 14 cordas.
Fez uma pausa.
— A Internet aproxima o homem do mundo distante, mas, afasta o próprio homem de si mesmo e daquilo que lhe é próximo. Tudo com um simples ‘clicar’ de algumas teclas. Internet é faca de dois gumes... Não achas perigoso disponibilizar tua imagem neste universo virtual?
— Talvez sim, talvez não! Começamos a morrer a partir dos primeiros segundos de vida. 
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Adalberto Lima, trecho de Estrada sem fim