A prima Nanette

A prima Nanette

Maju Guerra

A avó desligou o telefone toda alvoroçada, quase aos gritos:

- Minha Nossa! Adivinhem! A minha prima que mora no exterior, a Nanette, a que se casou com um homem riquíííííssimo, está no Brasil e vem almoçar conosco no domingo. Ainda bem que vem sozinha, é um alívio. O marido é tão chic. Precisamos de um almoço impecável, mesa bem-posta, talheres de prata, a porcelana da família, ela está acostumada com tudo do bom e do melhor.

A filha concordou, ela precisava sair de lá muito bem impressionada com a acolhida. A neta perguntou pra avó:

- Vó, vou ter que conhecer a Nanette? Com este nome, ela deve ser muito boba.

A avó respondeu:

- Claro que vai e para com a ciumeira. Chega de perguntas, vai brincar no quintal, vamos começar os arranjos.

No domingo, a menina toda arrumada, impecável, laço no cabelo, sapato de verniz preto, o vestido azul de festa...

Finalmente a Nanette chegou. A menina pensou cá consigo:

- Ela é muito esquisita. O cabelo é tão vermelho que a cabeça parece um tomate, tomate? É cabeça de beterraba. O rosto é tão pintado, parece que ela usa máscara, tão branca que parece uma alma penada, acho que as almas penadas são assim, magra demais mesmo sendo muito rica, a prima devia passar fome como os filhos da D. Santinha que era pobre de verdade, bem estranho. Usava um monte de joias douradas, uma roupa diferente, mas a mãe disse que era de um costureiro francês famosíííssimo. O cachorro, um branco bem peludo todo penteado e com um cordão dourado no pescoço, sentado no seu colo, aliás, ela comeu com Chéri no colo. Falava uma língua misturada. E todo mundo paparicando a Nanette.

A menina conseguiu sair de casa escondida, tirou o sapato e a meia e foi para o quintal pegar goiaba no pé. Sujou o vestido e perdeu o laço do cabelo, mas estava contente, naquele dia não gostou da comida da avó.

Depois que tudo acabou, a menina pensou, pensou e concluiu:

- Não é ciumeira, é verdade sim. A Nanette não é educada, onde já se viu comer com um cachorro no colo dizendo que era filho? Conversava com a vovó como se estivesse fazendo um favor. Comia um pouquinho de casa coisa, com cara de quem comeu e não gostou...

A menina concluiu de que não queria ser igual a Nanette quando crescesse, ponto final. Não gostou desse negócio de ser riquíííssima como havia dito sua avó, não lhe pareceu uma coisa tão boa assim, rico já estava bom. A pessoa nem parecia gente de verdade. Vai ver tinha sido trocada por uma extraterrestre, ouviu isso na televisão. Dizem que é muito difícil saber a diferença.

Maria Julia Guerra.

Salvador, maio de 2010.