Vida de cão

O cachorro, uma bola alaranjada de pelo, correu direto para mim quando a porta foi aberta. Cheirou meus sapatos, deu uma volta inteira ao meu redor e depois, aparentemente satisfeito com a rápida inspeção, voltou a deitar-se no tapete da sala.

- Ele decidiu que você não é uma ameaça - disse-me ela sorrindo.

- Não me parece ser lá muito inteligente - retruquei.

Ela continuou sorrindo.

- Chow-chows não são exatamente conhecidos pela sua inteligência, é verdade...

Sentamo-nos no sofá. O cachorro levantou a cabeça e nos encarou. Depois, relaxou, focinho entre as patas.

- Se não fizerem algo para deter o aquecimento global, vai ser difícil que os chow-chows sobrevivam no Brasil - ela ponderou.

Dei de ombros.

- Quem pode pagar por um chow-chow, pode pagar pelo ar condicionado. Este não é o tipo de animal que você vai ver numa feirinha de adoção...

Ela me encarou com ar de desafio.

- Ah, claro! Ou então eu vou morar em Petrópolis. Permanentemente.

Ergui as sobrancelhas.

- Mas o que é isso? Não posso consentir que o aquecimento global ponha em risco o nosso relacionamento!

Ela ficou subitamente séria.

- Pois quando você se dispuser a fazer alguma coisa a respeito, lembre-se do meu cão.

Balancei a cabeça em concordância.

- Analisando por este ângulo, dificilmente eu poderia imaginar um cão mais sortudo do que o seu.

Ela desviou o olhar para o animal que dormia, e sussurrou.

- Sim. Ele tem a mim como dona...

[02-01-2017]