Esse projeto é meu !
Esse projeto é meu!
Ricardo estava completando dois anos de firma quando o novo chefe chegou. Numa firma supermercadista como o DIA£, as chefias cumpriam um rodizio por setor, e nesta ocasião o novo chefe, recém contratado, chamou a equipe e pediu colaboração e novas ideias, prometendo recompensas. Era exatamente a oportunidade que Ricardo necessitava para pôr em pratica sua estratégia para progredir profissionalmente. Chegou no escritório de Mario Souza, seu novo chefe e explicou que como era ele o encarregado de verificação dos novos pontos comerciais a mais de um ano tinha encontrado oportunidades que resultariam em grande economia para a empresa e uma chance única de superar a concorrência em setor prioritário da cidade. Gostaria de submeter o projeto a presidência da empresa, e contar com o seu apoio, almejando uma promoção significativa.
-Pois pode contar comigo- lhe respondeu Mário- você me ajuda, eu te ajudo e vamos progredir juntos. Confiança mutua, dedicação e trabalho de equipe.
Ricardo Machado Bertoluscchi, 28 anos, 1:80 de altura, paulistano do Tucuruvi, formado em Comunicações, não conheceu os pais. Criado por uma tia sempre trabalhou e mesmo sonhando em ser diretor, era apenas um subalterno de terceiro escalão. Ele verificava endereços já determinados pelo setor de marketing com intuído de instalar uma nova filial do supermercado DIA£. Quem encontrava o imóvel, no bairro determinado pela diretoria era o departamento NU, novas unidades, que depois repassava a Marketing responsável pelas pesquisas de campo, chegando ao seu setor que cuidava da instalação da nova loja.
Ricardo montou uma pasta com seu projeto, cheio de informações fotos e planilhas de demostrando que a empresa podia lucrar algo como 60 milhões de reais já no primeiro ano, e obter um ganho percentual de 12 pontos na participação de mercado, superando seu concorrente mais próximo, Carrefour. Entregou a pasta ao Mario e foi cuidar de seus afazeres. No trabalho trocou ideias com Carlos seu colega de função e em casa, demostrou seu entusiasmo convidando a namorada Marisa para uma noitada de pipoca e cinema na avenida paulista. Marisa não era bonita, mas tinha um corpo escultural, cabelos longos e era simples e humilde.
-Estou entusiasmado- dizia Ricardo, com energia- Esse novo chefe e coisa fina. Um cara legal. Agora vai. Meu projeto é uma oportunidade única. E se der tudo certo eu passo a chefia do departamento de novas unidades. Eu entendo mais disso que as gravatinhas do marketing que nunca entraram num supermercado popular nem para comprar.
-Você sim entrou, Ricardo - afirmou a namorada – Mas era só para me ver, não é mesmo. Trabalhar mesmo você nunca trabalhou. Você devia ser mais modesto e agradecido.
-Sim, logico. Você sabe que eu sempre trabalhei. O mundo é dos lutadores. Eu sou de escritório. Minhas habilidades são para negociar, fechar negócios, estabelecer relações lucrativas...você …você
-O que?
-Você é boa com dinheiro, com caixa...
-Agora que estou na loja de roupas, e ganho mais que você, você diz isso. No tempo que trabalhava do DIA£ você nunca quis emprego no supermercado. Você vivia no mundo da lua com seus projetos.
- queria no escritório, como estou agora. E vou progredir...e queria você também. Você sempre foi minha caixa de supermercado favorita, meu corpinho delicioso... eu te adoro...as coisas melhorando, se Deus quiser, ficamos noivos...
As semanas foram passando e Mário dizia que estava tudo bem. Ricardo ansioso, e inquieto. Já desconfiava do chefe. Um mês depois, durante uma conversa antes do jogo de futebol da empresa, Ricardo ouviu um dos engravatados do setor de marketing dizer que o departamento dele estava inventando coisas e logo ia haver mudanças. Imediatamente ficou imaginou coisas e coisas.
Dias depois, quando resolveu perguntar ao Mário sobre o andamento do projeto este lhe disse que estava tudo bem, mas a diretoria tinha pedido mais tempo para pensar porque achava que o assunto não era prioritário. E não tinham interesse. Mas convinha aguardar.
Ricardo sempre fora atirado. Um jovem arrojado, disposto e cara dura para não aceitar um não. Ele acreditava mesmo que o projeto era valioso. Era sua chance de promoção, de mudar de vida. Não gostou da conversa do chefe.
Aborrecido e um pouco bravo resolveu procurar alguém que pudesse lhe dar uma opinião avalizada. Um animo. E partiu para a internet. Procurou o diretor de marketing do Supermercado Cassino. No horário do almoço, fez algumas ligações, mas não conseguiu passar da secretaria. Sem desanimo, dia seguinte, procurou o diretor de novas unidades do Carrefour. Se apresentou como chefe do setor de novas unidades do Dia e disse que queria discutir um assunto comum ao setor, para uma ação conjunta junto a prefeitura. A secretaria do diretor o encaminhou a uma assistente, que concordou em recebe-lo na semana seguinte
Animado, no retorno do almoço, recebeu recado para ir encontrar o Mário e outro auxiliar na nova loja que estavam inspecionando em Santana. Saiu rápido e quando chegou ao local encontrou um alvoroço. O assistente apavorado, rodeado dos pedreiros com o Mário caído no chão com o pé embaixo de uma viga. Chamada a ambulância Mário foi levado para o hospital, na companhia do auxiliar, e sobrou para o Ricardo atender o chefe:
-Por favor Ricardo leva o meu carro para a garagem do escritório, e encaminha todos esses papéis da obra que estão no banco traseiro para a contabilidade para pagamento dos operários. Obrigado.
Ricardo deixou a moto na loja e levou o carro de Mario para o escritório. Na garagem apanhou todos o papeis que encontrou e levou para o escritório de Mario. Era uma confusão de papeis. Chamou o amigo Carlos, e juntos colocaram tudo em ordem. Separaram os papeis da obra e uma agenda. Curioso, Ricardo abriu a agenda de Mario e achou o que não devia. Uma anotação se referindo ao seu projeto que fora aprovado como Projeto de Novas Unidades PNU de autoria de Mario Souza. Nervoso remexeu toda a sala do Mario até encontrar um memorando da diretoria, dirigido ao Mario, do mês anterior se referindo ao Projeto Novas Unidades, e elogiando o seu trabalho e solicitando algumas alterações e mais detalhes.
- Mas esse filho da mãe não me disse nada. Ele guardou tudo para ele. Me escondeu. Me roubou o trabalho. Está na cara que disse que era ideia dele. Veja só que filha da mãe...
- O que você vai fazer?
- E dizendo que era confiança ... que me ajuda, te ajudo... filha da mãe, vai ver, mais vai ver só...
No dia seguinte enquanto o Mário não chegava no escritório, Ricardo foi até a secretaria da diretoria do DIA£ e pediu para falar como Dr. Marcelo, que era o diretor geral. Ela lhe pediu para informar o assunto
-Não posso ... só posso falar com ele direto...por favor
-Senhor Ricardo, não é possível... o Dr. Marcelo é uma pessoa ocupada, melhor o senhor falar com seu chefe primeiro. Eu não posso...mesmo porque até segunda ele não vai estar aqui...ele está no Rio para a inauguração sábado da loja do Recreio.
Ricardo pensou em apelar para o Sr. Braga, assistente de diretoria, que ele conhecia bem, mas saiu rápido maquinando como ir ao Rio de Janeiro e falar direto com o Dr Marcelo.
- Ele é o dono... o diretor geral, ele tem que saber quem fez o projeto, - pensava. - Eu posso ir para o olho da rua, mas todo mundo vai saber que a ideia e o projeto são meus...
Como o Mario não apareceu no escritório, talvez sem poder andar ainda, Ricardo da sua mesa mesmo ligou para a assistente do Carrefour com quem tinha reunião marcada para segunda-feira . Ligou e falou que surgira um imprevisto, que era urgente, e precisava falar com ela hoje mesmo. Falou e convenceu. A assistente marcou para as 18 horas na lanchonete do Carrefour central, para tomar um café.
A ideia era ter certeza da viabilidade do projeto antes de falar com o Dr.Marcelo no Rio de Janeiro. Passar por cima do Mário, mas com um aval e uma testemunha de quem era o verdadeiro autor. Ou tudo ou nada.
Apanhou sua pasta com os papeis do projeto e foi para o Carrefour. A assistente era uma jovem morena de trinta anos no máximo, de tailleur marrom, saltos médios e postura de doutora. Ricardo se impressionou de pronto, e demostrou isso ficando um pouco inibido e muito fixo no olhar dela. Seu nome era Clara Mendonça, advogada e funcionária contratada do Carrefour para assuntos de regularização de lojas, alvarás e licenças.
- Me perdoe, mas eu estava esperando uma burocrata...jamais uma mulher simpática e tão gentil
-Obrigada. Eu cuido dos assuntos formais junto a prefeitura. Em que posso ajudar?
Seguiu-se uma conversa sobre as empresas e o ramo supermercadista. Ricardo ainda que visivelmente cativado pela jovem, procurou manter o diálogo no campo formal. Contudo percebeu que havia espaço para uma relação comercial vantajosa e muito agradável. E se esforçou em ser cavalheiro e agradável. E ela correspondeu demostrando seu apreço por ele. Descobriram que ambos provinham da FMU e tinham frequentado as mesmas discotecas. Depois de uma hora de conversa, uma amizade por afinidade estava em andamento. Ela era de fato ligada ao escritório do pai que promovia fusão e acordos empresariais. Tinha muito interesse em novos projetos
-Deixa eu explicar em poucas palavras em que consiste o meu projeto. A prefeitura aprovou a construção de 17 prédios condomínios ao longo da avenida Espraiada, onde estão sendo inauguradas as duas estações do metro. Nessa área de dois quilômetros vamos ter 4000 famílias de classe B média alta, em 13meses, e temos quatro áreas possíveis de reservar para lojas de 2000 metros, no único corredor comercial permitido. E para fechar negócio e instalar os supermercados temos apenas dois proprietários fáceis de negociar porque são residentes em Portugal. O entorno já pesquisado e conhecido é 35% do negócio total e garantido. Temos os nomes de 40% dos novos clientes e histórico de compras. E um negócio certo. E o que é melhor nessa linha temos outro local dentro da cidade de idênticas caraterísticas, para daqui a 24 meses, que só vou revelar depois que eu for o chefe do setor.
- E o que você pretende. O que você quer do Carrefour?
- Primeiro quero sua opinião, quero sua ajuda. Acha que é um projeto viável? A minha diretoria não está entusiasmada. A diretoria do Carrefour se interessaria? São dois anos de trabalho nisso. Eu sigo uma lógica diferente do setor marketing. Eu procurei locais de instalação de lojas futuras...não olhando a população local hoje...olhando o futuro...com isso reservo local e clientela com tempo e baixo custo
- Sua ideia é a antiga ideia do loteamento...sabe isso, ne? Ainda hoje pelo interior do pais onde se aprova um loteamento afastado se autoriza uma linha de ônibus e se reserva um terreno no meio do loteamento para colocar o primeiro armazém, do bairro que vai ser formado.
-É viável? É um projeto possível?
- Sim, sem dúvida, pena que não seja novo. Inclusive nesse lugar que você se referiu, espraiada, nós já tivemos uma oferta semelhante.
-Não entendi...o que você quer dizer?
- Não posso afirmar, mas posso verificar amanhã, eu creio que temos um projeto para essa localização que você me diz ... acho que temos um projeto parecido.
- Não pode ser. eu tenho certeza que estou sozinho, já tenho os contatos com a prefeitura e a construtora... só eu tenho.
- Vou te ajudar. Eu vou olhar o que temos e falamos segunda-feira.
Ricardo ficou apaixonado por Clara. Além de linda não é de confiança – deduziu - Como pode me dizer que eles já têm algo para a Espraiada- pensou- Está querendo me roubar a ideia também. Eu tenho exclusividade da opção de compra dos únicos terrenos possíveis. Tenho o pedido do alvará. Tenho em mãos a lista de compradores...ninguém mais pode ter essas coisas.
Foi uma noite difícil. Bebeu uma cerveja e nem ligou a televisão. Também não ligou para namorada com medo de demostrar algo...sentia-se emocionado, enfeitiçado pela Clara
-Mulher percebe só na voz...não vou ligar... ela vai perceber... melhor deixar passar um dia ao menos- pensava alto – Ademais Marisa é uma desanimadora...não fosse o corpão.
Pela manhã, sentou-se e esperou pelo Mario. As dez horas chega o chefe, mancando, com o pé enrolado em gesso. Depois de meia hora de conversas com o pessoal Mario o chama e diz
-Ricardo por favor quero lhe agradecer por trazer o carro...
-Por nada, aqui estão as chaves ...e antes de mais coisas me diga porque não me informou que a diretoria tinha aprovado o meu projeto, o meu projeto...em seu nome?
Mario, ainda que sem demostra surpresa, sentiu o golpe, e respondeu
- Calma Ricardo. Eu fui obrigado a apresentar em meu nome para facilitar aprovação se digo que é seu eles nem iam examinar...e mesmo assim não vão implementar...não vai dar em nada ...até gostaram, mas não acham oportuno, querem mudar muita coisa querem muito detalhe ...de verdade, eu também acho inviável
-Inviável?
-Sim Ricardo ...-responde Mario, com voz firme e autoritária- eu sei que você tinha muita esperança... achava uma ideia boa..., mas não é. Não é possível. Vamos esquecer e partir para outra. Para o DIA£ não interessa. Lamento te dizer...as vezes a gente tem que entender...eu não queria te decepcionar ..., mas...
Ricardo percebeu que se retrucasse iria explodir. Por pouco não insultou o chefe. Calou e saiu rápido da sala. Foi ao banheiro se esfriar.
Passados dez minutos na volta, encontrou o chefe lado da sua mesa.
-Ricardo, sei da sua contrariedade e decepção. Não se acanhe em pedir para sair. Posso encaminhar seu pedido de demissão, se desejar. Mesmo porque não gostaria demiti-lo por tem vasculhado minha sala e meu carro. Infelizmente...
Ricardo, incrédulo, olhou o Mário calado, apanhou o paletó na cadeira e foi saindo a passos largos. O jogo tinha ficado pesado.
Dia seguinte, sábado, embarcou para o Rio de Janeiro a procura do Dr. Marcelo. Durante a inauguração da loja, naquele ambiente festivo, ele iria abordar o Dr, Marcelo, tentar uma conversa e revelar que ele era o autor do maior projeto do DIA£. Aliás ia dizer que ele queria uma promoção, e o chefe queria demiti-lo.
De fato, não foi nada difícil se aproximar do Dr Marcelo e em rápidas palavras chamar sua atenção para o problema proposto.
-Temos uns minutos, por favor venha até o escritório da loja, senhor Ricardo- disse o Dr. Marcelo, enquanto fazia um gesto para seu assistente- Por favor senhor Braga, nos acompanhe.
Chegando na sala, o Dr. Marcelo, empresário experiente, patrão zeloso com mais de 40 anos de conciliar interesses dos dois mil empregados da companhia DIA£, sentou-se em uma das mesas e pediu ao Ricardo, que se mantinha calado, para sentar-se também.
-Por favor Sr. Braga, peça ao senhor Mario Souza que se junte a nos.
Ricardo arregalou os olhos. Por essa ele não esperava. Pasmado olhou para a porta e se ajeitou na cadeira. Em um minuto entrou o seu chefe Mario, mostrando surpresa pela presença do Ricardo.
- O senhor está ao par da reivindicação do senhor Ricardo? – Pergunta o Dr. Marcelo ao Mario que permaneceu em pé no meio da sala
- Sim ...de fato tive que o demitis ontem, por sua impertinência.- responde em voz firme- insubordinado, se acredita injustiçado por sua colaboração no meu projeto de melhoria do nosso setor e das ideias que encaminhei a diretoria.
-Algo a dizer senhor Ricardo?
O sangue de Ricardo esfriou. Estava encurralado. Não via no Dr. Marcelo uma reação favorável. Respiração tensa. E de arremate, descobria que estava dispensado desde o dia anterior.
-Como vejo que o senhor nada tem a acrescentar, Sr. Ricardo, vamos terminar isto por aqui e acaso lhe interesse, segunda-feira encaminhe por escrito para minha secretaria o seu pedido de reconsideração. E agora vamos ao trabalho de inauguração...Bom dia.
Ricardo permaneceu sentado na sala depois que todos saíram. O Sr. Braga do lado de fora da sala, lhe fez um gesto de consolo e acrescentou:
-Escreva suas razoes. Não se aborreça. O Dr. Marcelo sempre pode encaminhá-lo a outro setor da empresa. Se precisar, me peça, lhe ajudo no possível. Também não gosto desse Mario.
Na viagem de volta Ricardo, se acalmando foi direto a casa da namorada. Como ela era do contra, não lhe disse nada do ocorrido. Jantou, bebeu e namorou. De fato, se tranquilizou. Até da doutora Clara tinha temporariamente se esquecido. A única coisa que não fez, foi pensar em pedido de reconsideração. Tinha que reagir. Passou o domingo no Parque, sozinho, engendrando estratégia.
Segunda-feira pela manhã foi a padaria, tomou um demorado café e levou a moto a oficina para revisar. Voltou para casa para examinar os papeis, ligou para Clara e a convidou para almoçar.
Na mesa da praça de alimentação do Shopping, diante de um galeto com batatas, Ricardo entrou de supetão no olhar aconchegante de Clara, que estava linda, e irresistivelmente atraente.
-Você é casada? Perdão...digamos que já somos amigos. Posso chamar de você, de você?
Clara em silencio, mastigando, sorriso discreto, deixou um minuto passar. Levantou um olhar terno e respondeu
- Não...e no momento, nem namorado tenho. Por favor não vá se candidatar, ok?
- Ótimo. Nisso já estamos de acordo. Então me diga porque achou o projeto pouco viável? °
-Vamos comer? Depois falamos de negócios.
-Então falemos do tempo...ou esgotou o assunto com o ascensorista?
Clara riu alto. -Eu sou de Santa Catarina, de Blumenau, e o senhor, senhor Ricardo?
-Senhor não... chame de você ...sou paulistano mesmo. Do Tucuruvi.
- Logo logo vamos ter uma loja lá. E assim a conversa seguiu com futilidades agradáveis.
Terminado o almoço pediram um café. Antes de sequer adoça-lo Clara disse
-Aqui tem a cópia do projeto que está na mesa da minha diretoria. É primeira página. Veja!
Ricardo apanhou a folha e leu. E leu.
-Não é possível... isso é cópia do meu projeto. IGUALZINHO! Tim Tim por tintim...
- Foi o que me pareceu também – disse clara – mas veja que não diz o endereço...não especifica como você me disse... espraiada...acho que foi espraiada que você me disse?
-É verdade...balbuciou Ricardo pensativo- Acho que aqui tem coisa ...como isso foi parar na mesa do Carrefour?
-Isso posso lhe dizer
- Diga por favor
-Uma agencia de publicidade, a A&G, que já trabalha conosco, apresentou esse projeto há uns vinte dias. Ofereceu vender o projeto completo para três localidades. Ofereceu o projeto e a mão de obra de realização. Não sei exatamente o custo, mas parecer ser algo em volta de dez milhões.
- E aceitaram?
-Aceitamos. O departamento jurídico tem um contrato em elaboração. O representante da A&G deve se reunir conosco na semana próxima. Se quiser posso te ajudar.
Diante das evidencias, Ricardo resolveu pedir para a Clara confirmar algumas outras informações que lhe trariam certeza se tratar mesmo do seu projeto e marcou com ela para almoçar no dia seguinte com mais tempo e discutir o que fazer. Depois falou com o amigo Carlos para saber do Mario, e trocar ideias.
-Como dizia meu avô, tem gato na tuba – sentenciou Carlos.
No dia seguinte, depois de ajustar algumas coisas com Clara, Ricardo voltou ao DIA£, recolheu seus pertences na mesa, e sem sequer olhar para o antigo chefe, foi a sala da diretoria falar com o Dr. Marcelo. Ficou 45 minutos, passou na sala do Braga, e foi embora.
Três dias depois, à tarde, no 24º andar de um edifício na Vila Nova Conceição, na sala de reunião da agencia de publicidade A&G estavam reunidos os representantes do Carrefour, a Dra. Clara, o Sr. Josué Riche diretor financeiro, e o encarregado de marque Ting de São Paulo, Sr. Jose Carlos Benta, juntamente com os advogados da A&G e o Sr. Élcio Roman de Marketing e, (vejam só) o Sr. Mario Souza, apresentado como sendo do setor de projetos.
-Antes de assinar o contrato, gostaríamos de receber a minuta com as informações exatas de um dos locais do projeto, aquelas coisas, endereço, nomes, etc. – Diz a Dra. Clara.
-Eu gostaria também de algumas explicações sobre as pesquisas realizadas- Diz o Sr. Jose Carlos.
O senhor Élcio passa uma apostila com os detalhes a Dra. Clara, que se dirigindo ao senhor Mario pergunta.
- Pelo que sabemos o senhor Mario é o autor do projeto, certo? Ok. Poderia me esclarecer alguns detalhes, só para constar?
-Sim claro. O que precisar. - Responde Mario
- Por favor, senhor Mário, poderia nos explicar como companhia DIA£ de Supermercados tem um projeto exatamente igual? E como é possível que haja na prefeitura pedidos de alvará para estes endereços datados do ano passado?
Diante do silencio momentâneo do Mario, perplexo e sem resposta, o Sr. Élcio tentou uma explicação:
-Quanto ao que a doutora...
Súbito, entram na sala o Sr. Braga e o Ricardo, acompanhados de uma secretaria da A&G
-Me permitam uma ligeira interrupção, - Diz Ricardo posicionando-se na ponta da mesa – Mas o Dr. Marcelo da Cia DIA£ que está aqui nesse momento, na sala da diretoria da agencia, pede que lhe aguardem que ele vem participar desta reunião...
Mario Souza, pálido e mudo levanta-se da cadeira. Suspense. Silencio e entreolhares rápidos.
- Por favor senhor Mario, se desejar pode se retirar – Diz o Sr. Braga, olhando-o firme - Como empregado do DIA£ com certeza o senhor tem mais o que fazer, e o Dr. Marcelo certamente não vai gostar de lhe ver.
Ricardo, descontraído aproveita e malha o judas
- Que vergonha, hein seu Mario...roubou de mim a ideia, roubou da sua empresa, enganou esta agencia e ainda queria lucrar com o Carrefour...quanta ambição e safadeza, hein!?
Não fosse cômico o ambiente ficou dramático. Reunião encerrada.
Passados trinta dias, vamos encontrar o Ricardo na sua nova sala de subchefe do departamento de Novas Unidades do DIA£, conversando com o amigo Carlos
- O que eu teimo em acreditar é como é que esse cara teve coragem de vender a ideia ao Carrefour, sem perceber que os nomes e endereços que lhe dei estavam errados de propósito. Como pode crer que ia enganar a todos?
- Um trouxa. Você não viu que foi bobo a ponto de acreditar que o Dr. Marcelo estava na agencia, no dia da reunião? - Diz Carlos.
- Certo. A agencia não agiu de má fé, mas foi ingênua. Entrou numa roubada...
- E no fim você foi promovido e a Dra. Clara ganhou pontos no Carrefour. Beleza!
- Isso não interessa. O importante é que ela ganhou EU ... aliás, lhe comunico que estou trocando de namorada.