O Desenhista - Capitulo 1: O Primeiro Dia
Era uma ensolarada e encantadora manhã de verão. Fazia um calor agradável. Visto meu vestido mais leve e florido, um perfume fresco, maquiagem delicada, pulseira em macramê bem colorida, colar de sementes morototó. E saio. Chego em meu horário. Pego uma xícara de chá e sento-me à minha mesa. Observo os raios de sol que transpassavam sorrateiros e precisos pela belíssima janela de nosso escritório, e fico pensando... Essa manhã acordei ansiosa. Era começo de mês e de um novo e importantíssimo projeto, o qual nos daria mais visibilidade e abriria novas portas. Trabalho há mais de um ano em um coworking, escritório colaborativo, que apelidamos carinhosamente de A Casa dos Pardais. São várias áreas de criação no mesmo espaço: escritores, jornalistas, fotógrafos, desenhistas, web designers e a Maria que faz um chá delicioso! Ela é nosso braço direito na arrumação e limpeza. Trabalhamos com reunião, organização e disseminação de conteúdos impressos e online. São revistas e catálogos feitos como verdadeiras obras de arte. Qualidade, funcionalidade e beleza são nossas prioridades. Somos em sete em nossa equipe. Mas, há pouco tempo, perdemos nosso melhor ilustrador e desenhista. Ele recebeu uma proposta, irrecusável, de uma bolsa de estudos fora do Brasil. Hoje conheceremos nosso mais novo colega, que irá substituí-lo. Um jovem desenhista, latino americano, que está de passagem por São Paulo.
Meus pensamentos são interrompidos pelo som de deliciosas risadas e um burburinho alegre que vinham da entrada do escritório. Era ele chegando. Um belo jovem em seus vinte e poucos anos, amigo de um colega nosso. Não muito alto e magro. Sua pele era morena, cor de canela, aparentemente queimada de sol. Seus cabelos curtos e negros, cuidadosamente arrumados e despretensiosamente desalinhados. Seus olhos, dois âmbares cor de mel, tão vivos e tão curiosos. Ah... seu sorriso... contagiante e tão alegre, como se a todos fizesse uma festa. Seu visual era simples, sem excessos, despojado, mas com muita elegância. Vestia calça jeans cor clara; camiseta básica, surrada, cor grafite, colada ao corpo; tênis all star preto. Um charmoso brinco na orelha esquerda, corrente no pescoço e no pulso uma delicada pulseira de tecido, dessas de promessas. Eu estranhamente permaneço ali, atônica e sem saber o que fazer, com aquela tão atrativa e enigmática figura.
“Alice! Alice! Que foi? Tudo bem?”
“Quê? Hã? Falou comigo?”
“Aff! Acorda!! Está sonhando acordada? Trabalho chamando Alice, trabalho chamando Alice!”
Quando ia pensar em responder, eis que ele surge na minha frente, junto a mais dois colegas.
“Alice, Ana, esse é Rodrigo. Nosso novo companheiro de trabalho.”
Eu que trabalho tão bem com palavras, fico inexplicavelmente sem saber o que dizer, não conseguia organizar as falas em minha mente e a voz teimava em não sair. Seu olhar era curioso e me desarmava, era como se conseguisse me ler por inteiro. Quando penso em esticar minha mão, sou surpreendida por um inesperado e muito afetuoso abraço. Seu toque era delicado. Seu perfume inebriava e era marcante, apesar de muito suave. Não pude deixar de notar.
“Seja bem vindo Rodrigo! Eu me chamo Ana. Sinta-se em casa. Espero que goste de nosso escritório.” – diz muito animada e também o abraçando.
“Gracias! Eu me adapto bem. Sei que será bem interessante.”
“Ah, e essa é minha colega meio sem noção e sem palavras Alice, nossa escritora e jornalista” – completa Ana, deixando-a ainda mais sem graça.
“Faço minhas as palavras da Ana. Tirando o sem noção é claro! Acho que não dormi bem está noite, estou um pouco dispersa, peço desculpas. Mas nada como um bom chá mate para acordar, aceita uma xícara?”
“No pasa nada. Acontece. Quando não durmo bem, fico pior do que um zumbi. Entendo. Aceito o chá. Mas pode deixar que eu pego, só me diga onde.”
Alice explica sobre a cozinha e onde ficam as coisas. O rapaz, desenvolto e desinibido, como se o ambiente já lhe fosse familiar, prepara rapidamente a bebida. Pega uma xícara para ele e outra para Alice.
“Não sei se gosta mais ou menos doce. Eu costumo beber quase sem. Você é escritora, que bacana! Ler é um dos meus esportes favoritos. Posso perguntar se de algum escritor gosta mais?”
“Eu já prefiro mais doce. De amargo já bastam alguns dias em nossa vida... Olha só! Que bom que gosta de ler. Gosto muito de poesias. Acho que não tenho um favorito. Mas leio muito Guimarães Rosa, não sei se conhece? Grande escritor brasileiro. Já que perguntou, e você, o que gosta de ler?”
“Já ouvi falar. Mas não conhecer muito. Também gosto muito poesias. São nossas janelas da alma. A poesía es vida y muerte, es pasión!”
“Oi! Desculpe interromper o tricô das duas comadres, mas o trabalho nos chama. No almoço podem se conhecer melhor, quem sabe até combinar um drink. Mas agora, temos um projeto para começar e terminar para ontem, esqueceu senhorita Alice?”
“Nossa é mesmo! É que quando alguém que escreve encontra um leitor é um momento único, nos perdemos no tempo...”
Eles e os demais colegas sentam-se em uma mesa num dos cantos próximo a janela. Ana começa a explicar o projeto, o que eles teriam de fazer, e como ela pensou. Alice não consegue tirar os olhos de Rodrigo, reparando em cada detalhe. Ele, por sua vez, muito distraído, esboça algum desenho em um papel de rascunho. Ana chama atenção de sua amiga umas duas vezes e continua a explicação. Alice não saberia dizer por que não conseguia parar de olhá-lo, porque ele chamava tanto sua atenção? E porque sentia-se tão atraída? A manhã passa rápido e logo chega o horário de almoço. Alice resolve comer em um restaurante próximo, pois não havia trazido nada; e Ana diz que irá acompanhá-la. Elas convidam Rodrigo, que diz não estar com muita fome e que ficaria por ali mesmo, comendo um lanche. O restaurante era bem perto, logo chegam. Pegam uma mesa mais afastada e fazem o pedido.
“Nossa Alice! Nunca te vi dar tanta bandeira! Tá certo que o cara é o maior gato. Mas logo no primeiro dia! Imagina o que ele deva estar pensando de você.”
“Bandeira? Eu? Como assim? Pensando o que? Só achei o rapaz bacana. Não é sempre que encontramos um homem que gosta de ler, ainda mais poesias. E eu escrevo, não é?! Só isso!”
“Você acha que não reparei você olhando para ele a reunião inteira. Aposto que não foi a camiseta dele e nem seu visual despojado que te chamou tanta atenção!”
“E eu que sou a escritora! Quanta imaginação! Se eu falei que não foi nada é porque não foi. Se fosse alguma coisa eu diria.”
“Ok! Ok! Vou fingir que acredito. Mas, não tem nada demais achar o cara interessante. Só não quero paixonites atrapalhando nosso projeto mais importante, ouviu bem?”
“Sim, ouvi muito bem! Vou lembrar-me disso.”
Elas rapidamente terminam o almoço e voltam ao escritório. Rodrigo parecia estar bem enturmado, conversava desenvolto e animadamente com alguns colegas. Seguem com a reunião, que duraria o resto da tarde. O dia foi de muito trabalho, muitas discussões sobre o andamento do projeto, definição das divisões de tarefas e datas. Terminado, todos se despendem e Alice segue sozinha para o ponto onde pegaria seu ônibus. No caminho é surpreendida por Rodrigo que ia na mesma direção, pegar um ônibus que o deixasse no metrô. Ao ver o rapaz, pergunta se ele também iria para o ponto.
“Sim. Vou pegar o ônibus para o metrô. Assim chego bem mais rápido.”
“Eu moro perto. Só alguns pontos estou em casa. E ai, está gostando do trabalho? Ana me disse que você está só de passagem por São Paulo.”
“Tão bom poder fazer o que se ama! Si, estoy só de passagem. Um amigo me convidou para ir ao Rio de Janeiro, daqui há uns meses.”
“Que bacana! Mas, uma pena ficar pouco.”
Subimos no ônibus, passamos a catraca e sentamos no fundo, próximo à porta.
“Tengo parentes aqui em São Paulo, por isso resolvi ficar uns meses e meus compromissos são só para depois. Meu amigo disse que o Rio é belíssimo! As praias... os parques... os museus... a Biblioteca Nacional... as mulheres... quero muito conhecer tudo!”
“É muito bonito mesmo! Tenho parentes distantes lá, já fui algumas vezes. Você que gosta de ler vai amar a Biblioteca Nacional. Nossa! Tem também o Parque Lage, fica ao lado do Jardim Botânico. Lá, está sediada uma faculdade muito conceituada de Artes. Sua arquitetura renascentista junto à belíssima vegetação do parque dão um charme todo especial! Perfeito para quem gosta de desenhar. Aposto que ficará horas desenhando por lá!”
“Que interessante! Não tinha ouvido falar. Obrigado pela dica. Com certeza irei. Aqui, gosto de ir ao Parque Ibirapuera, geralmente bem cedinho. A mim me encanta caminhar, sentar a grama, rascunhar alguns desenhos, pensar en la vida, sin prisa.”
“Nossa! Deve ser muito bom mesmo. Quanta inveja! Quem dera ter esse pique todo logo de manhã. Sou notívaga. Gosto de escrever a noite, e nem vejo a hora passar. Estou escrevendo poemas sobre o amor. E começando algumas histórias.”
Não estava me reconhecendo, normalmente sou mais tímida, principalmente com pessoas que não conheço muito, mas com ele não conseguia me conter. Era como se quisesse contar minha vida inteira, ali, naquele tão pouco tempo.
Quase faço Rodrigo perder seu ponto. Nós nos despedimos, com outro carinhoso abraço e desço alguns pontos depois. Decido passar na padaria para pegar alguns pães fresquinhos e um delicioso pedaço de bolo mousse! Precisava de um doce urgente! Chego em casa, deixo os pães e o bolo na cozinha e sigo para meu quarto. O dia foi de muito trabalho e um tanto cansativo, precisava de um bom banho para relaxar. Mas, não posso reclamar da vida, faço o que gosto e tenho colegas de trabalho muito bacanas.
Deixo minhas coisas à cama. Pego meu som, queria ouvir um pouco de música. Deixo tocando uma seleção de músicas românticas que curto bastante. A primeira era ‘Set fire to the rain’ da cantora Adele de quem gosto muito. Como adoro sua voz e suas letras, me perco nelas... Deixo cair levemente a água em meu corpo, enquanto lembro-me de meu dia. Deveria estar pensando em nosso tão importante projeto e reorganizando as informações de hoje em minha mente mas, surpreendentemente me pego divagando sobre Rodrigo. Sua figura misteriosa de alguma forma me atraia. Causando-me sentimentos que não saberia expressar bem. Algo nele me chamava muita atenção. Talvez fosse jeito tão enigmático, ou quem sabe seu visual todo roqueiro, misturado a seu excelente e tão único gosto pela literatura.
Saio do banho, visto uma roupa bem confortável e sigo para a cozinha. Apesar de ter almoçado bem, por conta do dia atribulado, estava com muita fome! Lembrei que ainda tinha congelado uma porção de um risoto de funghi delicioso, e uns files de frango para grelhar. Faço uma salada para petiscar enquanto o frango grelha. Peguei uma excelente promoção de parmesão faixa azul no mercado perto de casa, aproveito para ralar. Estava tão distraída em meus afazeres, que quase não escuto o telefone tocar. Corro para atender.
“Alô. Oi Mãe! Desculpe a demora, estava preparando uma comidinha.”
“Nossa Alice! Estava quase desligando. Você e esse seu mundo! Não sei como ainda não perdeu a cabeça de vez! Isso ainda pode ser um perigo, minha filha. Já pensou se algum ladrão entra aí, você nem escuta.”
“É que tive um dia tão corrido. Lembra que te falei que pegamos um projeto novo? Vai ser muito importante para o escritório. São tantos detalhes para pensar...”
“Acho que comentou sim, mas não lembro bem. Fazendo hora extra e trazendo trabalho para casa!! Espero que esteja ganhando bem por isso!”
“Mãe, você sabe que gosto muito do que faço. E não estou trazendo trabalho para casa. É que como estou me empenhando ao máximo, acabo pensando um pouco a mais, só isso! Ah! Hoje conhecemos o substituto do Felipe. Ele me pareceu ser bem bacana. Rodrigo, um jovem latino que está de passagem por São Paulo. Vai ficar uns meses. Olha só mãe, ele gosta muito de ler.”
“O Felipe que fez o mais certo tendo aceito a bolsa de estudos e não você! Ler deveria ser obrigatório e não apenas um gosto.”
“Mãe... Lá vem você de novo com esse assunto. Não era melhor hora de eu aceitar aquela bolsa, e nem momento de eu morar fora. Tinham outros candidatos muito mais preparados e que mereciam mais do que eu!”
“Aff!! Você e essa mania chata de se diminuir. Quando é que você vai aprender a só pensar em você e não nos outros? Assim você nunca vai ser alguém, de fato, na vida!”
“Nossa! Obrigada pelo incentivo sempre tão construtivo, mãe! Fique sabendo que o escritório está indo muito bem, e muito em parte por sermos uma equipe unida. Mas, acho que para você nada disso importa? Bom vou lá jantar, estou morta de fome.”
“Ah é assim! Eu começo a falar as verdades e você diz tchau. Nem pergunta como foi meu dia... Quanta consideração... Agradecida.”
“Oke! Como foi seu dia, querida mamãe?”
“Mas quanta espontaneidade. Obrigada por perguntar. Foi excelente! Ah, sua tia nos convidou para um almoço no sábado.”
“Bacana, até lá combinamos. Boa noite.”
Ela desliga o telefone e fica pensando, enquanto termina a comida: – Juro que não entendo minha mãe. Fiz uma excelente faculdade, tenho um bom emprego e faço o que gosto. Moro bem. E nem assim ela fica contente. Não sei que mais ela pode querer? Eu não deveria me importar tanto com suas opiniões! Sei que temos valores e pensamos muito diferente. Fico tão chateada com isso.-
Alice termina de comer, pega a deliciosa fatia de bolo que comprou e resolve assistir um pouco de TV no quarto. Liga e deixa em um desses canais de filmes água com açúcar. Hoje só queria ver bobeiras. Estava passando uma dessas comédias romântica inglesas em que americanos atravessam o mundo para dizer eu te amo. Alice suspira pensativa: – Doce e bobagens! Tudo que eu mais estava precisando para relaxar. Hummmm... Como eu amo chocolate! E esse bolo mousse é fora de sério! - Ela degusta cada pedaço como se fosse o ultimo e único, percebendo o sabor de cada elemento e sentindo o deslizar macio do doce em sua boca.
Nunca fui de engordar, sou do tipo magra, por isso, às vezes, acabo exagerando nos doces. Fiz yoga durante um bom tempo, o que me ajudou a manter uma boa forma. Tenho o corpo trabalhado por conta dos exercícios, não muito alta; tenho a pele morena por descendência de meu pai; meus olhos são verdes como os de minha mãe; e meus cabelos castanhos levemente cacheados.
No momento estou só. Namorava Felipe, desenhista e colega de trabalho. Mas, quando recebemos a proposta da bolsa de estudos nos EUA, ele queria dar um passo que para mim era grande demais: casar antes da viagem! Nos dávamos bem, mas ele via meu dom para escrita como um sonho bobo e minha profissão como um mero passatempo. Dizia achar bacana eu querer estudar, mas que não achava que eu precisasse trabalhar. Até preferia que eu cuidasse da casa. Como eu poderia deixar de lado meu sonho, minha carreira e ganha pão, e depender dele? Jamais. Coisas que nunca quis para mim. Eu também via atitudes machistas por parte dele, que minha mãe dizia ser carinho e proteção. Em excesso é claro. Não culpo minha mãe. Ela nasceu em uma época onde éramos criadas para pensar assim. Estava quase adormecendo, quando surge em minha mente a figura de Rodrigo e de seu estonteante sorriso. Seu jeito calmo, doce, atencioso e sua alegria realmente me marcaram. Não gosto de limões!
Na manhã seguinte, acordo mais tarde do que deveria e meu corpo pedia para descansar mais. Fico um pouco na preguiça. Começo a me lembrar de um sonho que tive a noite, via as imagens em relances, era como se sentisse a presença de Rodrigo ao meu lado. Sentia o calor de seu corpo, o perfume de sua pele, sua respiração e seu toque suave. Tudo era tão real. Difícil dizer que foi apenas um sonho. Minha mente reproduzia seu delicioso sotaque castelhano. Era como se ele sussurrasse poesias em meus ouvidos. Algo em mim estava mudando. Não me reconhecia, meus sonhos costumavam ser mais comportados.
Levanto e sigo para um banho rápido. Já estava quase me atrasando e para me atrapalhar ainda mais as imagens daquele sonho não saiam de minha mente. Vinham em flashes, prendendo minha atenção e me distraindo de meus afazeres. Fazia calor, visto uma saia mais comportada, camiseta de banda de rock, botas de couro, cano médio em tom vinho, pulseira de couro vermelha. E minha correntinha de prata que sempre uso junto a dois pingentes: uma delicada gaiola com um pássaro a voar e o olho de Hórus. Eles me lembram a sempre ser livre e ter mais confiança. Venho de uma família muito católica, mas não tenho nenhuma religião especifica. Apenas acredito nas forças da natureza e uso alguns amuletos.
Tomo café. Pego minhas coisas e resolvo levar uma coletânea de poesias que gosto muito para ir lendo no ônibus. Quando chego, todos já estavam à mesa discutindo os detalhes do projeto. Sento-me ao lado de Ana. Vejo que Rodrigo repara em meu livro e sorri quando me vê.
“Nossa Alice! Agora vai começar a chegar atrasada? Está acontecendo alguma coisa?” – diz Ana baixinho em meus ouvidos.
“Acabei perdendo a hora. Mil desculpas, prometo que não vai mais acontecer.”
“Espero! Bem, agora que a senhorita atrasadinha chegou, vamos dar seguimento à reunião. Relembrando, a ONG que nos contratou quer que façamos uma revista, um portal de noticias e um livro (anuário) com os frutos do projeto. Nele irá conter os melhores textos escritos pelos jovens junto a fotos dos melhores grafites. Assim, fortalecendo o trabalho em equipe e contemplando mais pessoas. Rodrigo, eles também querem alguns desenhos para ilustrar a revista. E acompanhamento nosso dos trabalhos. Pensei que você Alice, e você Rodrigo poderiam ir pessoalmente.
“Boa idéia Ana!” – diz Alice mais animada do que de costume.
“Bom, hoje acho que terminamos de fazer o cronograma e a divisão de atividades, delimitando as datas. Assim, Alice e Rodrigo, vocês poderiam ir amanhã mesmo. Já deixem combinado. E Alice ligue para ONG avisando. Podem ir direto, e já que o lugar é longe, tirem o resto do dia de folga.”
A manhã passa voando. Chegando o horário de almoço. Alice diferente de ontem, estranhamente estava sem muita fome. Assim, pensa em pegar uma saladinha leve e um sanduíche na padaria ali perto. Rodrigo resolve sair para comprar alguma coisa. Quando estava sentada em minha mesa comendo, Ana chega e diz:
“Apesar de não conhecer muito do Rodrigo, me contaram que ele já deu aulas de desenho para crianças em uma ONG. Por isso pensei que seria interessante que ele ir com você.”
“Nossa! Que bacana! Com aquele sorriso todo e alegria, as crianças deveriam adorar. Posso imaginar a farra que deveria ser.”
“Ai...Ai... Mas pelo seu comentário todo animado, estou quase me arrependendo de ter mandado vocês dois. Comporte-se viu!! Lembre-se de que dependemos que esse projeto dê certo para sermos bem aceitos no mercado.”
“Já disse que não vou esquecer! Você realmente cismou que estou interessada nele, não sei de onde tirou essa sandice, enfim... Vou fazer meu melhor para que tudo corra bem.”
“Assim espero! Ai Alice... você me coloca em cada uma! Sabe que somos amigas há séculos, mas aqui sou responsável por coordenar tudo, tenho que ser linha dura e sem distinções. Mas, fora daqui não. Que tal darmos uma esticadinha depois do expediente? Podemos ir naquele bar aqui perto. Quem sabe assim, você não conhece alguém interessante e sai dessa solteirice. Faz quanto tempo que você terminou com o Fê?”
“Acho melhor não, viu. Não sei se é ansiedade por conta do projeto, não tenho dormido bem. E pelo que eu vi, o lugar é bem longe, amanhã teremos de quase madrugar.”
“Assim, enfurnada em casa, vai acabar ficando é para titia!”
“Ahahaha. Boa! Acho que levo jeito para tia. Mas, não pretendo ficar sozinha o resto da vida. Tenho esperança de que ainda vou conhecer alguém bacana e que valha apena.”
“Aff Alice! Falando assim até me lembrou sua mãe! Como você é exigente.”
“Nem de longe diga isso! Nunca vou ser como minha mãe nunca! E não sou exigente, acho até que sou bem desprendida. Só não saio ficando com qualquer um, muito menos machistas que só sabem malhar o corpo, que é o que mais tem por ai. Pessoas com uma mente bem exercitada podem fazer loucuras!!!”
“Eita! Como assim? Agora vai me dizer que um belo corpo não conta não? Duvido que você não reparou no físico bem trabalhado do Rodrigo? Aposto que ele deve malhar.”
“Você fala cada uma!! Só quis dizer que seres pensantes são bem mais interessantes e não que não reparo! Ah deixa para lá.”
“Desculpe entrar na conversa de vocês. Mas, o que tem seres pensantes? Curioso eu. Acho que sou um desses.” – pergunta Rodrigo tentando se enturmar.
“Aposto que irá concordar comigo. Estava falando para a Ana que não basta ser bonito se não tiver uma mente bem exercitada.”
“Ah sim, concordo. Ser apenas bela até conta em um primeiro momento, mas depois, sempre faltará algo! Conversar sobre assuntos interessantes, a dois, pode ser bem instigante!”
“Ahahaha! Olha só! Aposto que vocês antes de ficar sério com alguém pedem uma lista de livros favoritos, e dependendo do que verem tratam logo de dispensar.” – expressa Ana.
Os dois caem na gargalhada. Mas pensam que não deixa de ser mais ou menos assim. Voltam ao trabalho. Alice liga para a ONG e deixa tudo combinado para amanhã. Vendo o endereço constata que realmente terão de madrugar! O resto da tarde transcorre rápido. Terminam de passar os últimos pontos importantes e dividir as tarefas. Todos se despedem. Juntos, no ônibus, Alice aproveita o percurso para deixar combinado com Rodrigo a visita.”
“Como você prefere fazer amanhã? A Ana disse que nem precisamos vir ao escritório, podemos ir direto. Pelo que eu vi, teremos de pegar mais de uma condução.”
“Tem metrô perto? Eu sempre prefiro, pego pouco ônibus!”
“Podemos marcar de nos encontrar na catraca do metrô Vila Madalena. Mas terá de ser bem cedo. Umas 7h, ok?”
“Tudo bem. Estarei lá. Até amanhã Alice.” – despede-se Rodrigo descendo do ônibus.
Ela desce alguns pontos depois. No caminho lembra-se de que sua dispensa estava vazia, então resolve fazer umas comprinhas. Sabia que voltaria com fome e cansada para cozinhar amanhã. O supermercado não estava cheio. Rápido ela termina as compras. Chega em casa. Deixa as coisas na cozinha, guarda o que é de geladeira e vai para um banho, mais que merecido! Veste uma roupa confortável e vai para a cozinha. Resolve de comida, fazer um strogonoff de carne, fácil e prático para congelar. Assim não gasta almoçando e jantando fora. Aproveita e faz um molho de tomate e cozinha um macarrão rápido para a janta. Ela não sabia dizer bem por que, mas tinha horas que sentia uma fome descomedida e noutras nem se lembrava dela. Ela termina de comer e resolve dar uma olhada em seus emails e no seu facebook. Assim que entra em seu perfil, vê que tinha um pedido de amizade. Era Rodrigo. De imediato ela aceita, e entra em seu perfil para dar uma fuçada. Nele muitas fotos de seu país e de sua família. Parecia ser uma pessoa muito ligada a eles. Em suas publicações pensamentos profundos dele, frases de autores famosos. E vez por outra, algum quadrinho muito bem humorado e sarcástico do Quino. Sua lista de livros favoritos era extensa e de fazer inveja. Seus filmes eram muitos e dos melhores. Seus artistas musicais favoritos iam desde música típica do seu país a rock melódico, passando por música brasileira e clássica. Eclético o rapaz! Ela deixa uma mensagem carinhosa, dizendo que a amizade está aceita, que ele tem muito bom gosto e que quem dera tivesse lido metade dos livros que ele leu! Não estava online e suas postagens eram muito de vez em quando. Ela termina de usar a internet e resolve ir deitar cedo. Amanhã seria um longo dia. Liga a TV e deixa em algum desses canais de documentários musicais. Agitada e confusa vagueia, não conseguindo se ater à TV e a um pensamento só. Eles vinham e sumiam rapidamente, em flashes. Quando de repente se dá conta de que linhas brotavam e se alinhavam precisas e rítmicas em sua mente. Era ele!! Era ele!! Um singelo poema estava nascendo. Ela pega à mesinha ao lado da cama um caderninho e caneta. Sem muito esforço e muito pensar começa a escrever. Em poucos minutos eis que ele surge:
E como fica o desejo?
Onde cabe o amor?
Como viver não sendo um padrão?
Como viver, amar e desejar...
Nele refletia sobre seguir padrões e como ser você mesma. Assim terminando ela apaga a luz, deita e logo adormece.