ESSAS COISAS ACONTECEM
Outro dia, Hermes vinha pela Avenida Paulista, calmo, distraído, quando o vento levou seu chapéu. Correu feito louco, chegou a tropeçar, mas alcançou-o justo quando o dito ia parar na frente de um ônibus. Ao apanhar o chapéu, notou que estava sendo filmado. Mas o que será que uma moça bonita dessas está olhando. O ego se colocou em polvorosa, mas logo foi contido pela consciência. Nada disso, imagine só, até parece que a moça sofre de alguma alteração na capacidade dela de ver ou é mentalmente enferma para achar algo em você. Mas, mesmo assim, sorriu, meio sem jeito, quase caindo pela sarjeta. Foi correspondido. Claro, deve de ter sido uma cena engraçada. Só pode ser isso. Não tinha lá uma auto-estima dessas que preste, mas também não era nenhum palhaço. Resolveu arriscar e se meteu a falar pelos cotovelos. Quando viu, já estavam sentados em um restaurante. Por sorte a hora parecia apropriada e aquele monte de paulistano em volta nem percebia o que estava acontecendo. Hermes descobriu que a moça não tinha nenhum tipo de miopia ou coisa parecida, nem mesmo nenhum distúrbio mental. Era simpática e muito culta. Aproveitou e levou-a na Livraria Cultura, com um pretexto qualquer. De mais a mais, o local foi inaugurado recentemente e antes tinha sido um cinema. Já era interessante só por isso, imagine então, o monte de assunto que se arruma em um lugar como esse. Aos poucos percebeu que o assunto era ele. A moça, uns dez anos mais nova que ele, só fazia elogiar. Percebeu que esta mulher estava sinceramente interessada era nele, em mais nada. Passou uma das melhores tardes de sua vida e foi para casa, munido do telefone dela e de uma estranha sensação de juventude. Ao chegar, sua neta perguntou: mãe, o vovô ficou abilolado? Que é isso menina? Isso são modos de falar de seu avô? É que ele está rindo sozinho... olhando um papel com um número...