E.L.E.

Ele era um menino bonito. Ela achava. Não o conhecia, não sabia seu nome, mas sempre o via pela rua. Alto e forte, porém, nada musculoso, o típico professor de academia, traços angulosos e suaves. Seu rosto estava sempre emoldurado por um desses sorrisos que iluminam o dia da gente, e era feliz, parecia feliz. Andava despreocupadamente de tênis e roupa esportiva, mochila nas costas. Usava uma barba rala bem cuidada que era um charme só. Ela o admirava de longe, sempre. Não que o desejasse, mas lhe fazia bem vê-lo. O sentimento era sempre de saudade, o que lhe era bem estranho. Saudade de que? Ela se perguntava sempre. Seu sentimento na verdade sempre era um misto de alegria e falta. Por uma ou duas vezes cruzara com ele pela rua. E novamente ele sempre lhe sorria, e como era bom! Com certeza aquele rapaz era colírio para muitas vistas cansadas, não as dela que ainda não eram tão cansadas assim, mas ficavam felizes ao vê-lo. Sempre. Não existia nenhuma espécie de desejo pecaminoso, mas ela sabia que por alguma razão desconhecida ele lhe era perturbadoramente familiar. Não ansiava encontros, nem pouco palavras e sabia disso porque esses sentimentos difusos só apareciam ao vê-lo e por menos ainda não se preocupava com a falta deles nessa ausência. Sua indagação era genuína, algum dia iria, quem sabe iria buscar respostas que com certeza de nada teriam de prosaicos, ela sabia. Abordá-lo estava fora de questão, dar uma de investigadora particular também, contratar alguém para esse papel, pior ainda. O certo seria lançar mão do destino. Tudo na vida uma hora sempre se encaixa. Os sentidos, a vida, os encontros, reencontros sempre acontecem, e sempre terão dia, lugar e hora, quem sabe ao som de uma nova música e uma xícara fumegante de café.