O SUMIÇO DO CASEIRO

Na década de 1980 no interior de São Paulo, morava em uma fazenda o caseiro conhecido como Jacó, um homem de aproximadamente quarenta anos vivia só no mundo não sabemos se tinha algum parente, pois nunca falava de sua vida.
     
Jacó morava no fundo da casa da sede, sua casinha era composta de uma pequena cozinha com um fogão a gás velho, um outro cômodo que servia de sala e quarto com uma cama igualmente velha e duas ou três cadeiras de madeira e um ínfimo banheiro. Era um homem muito simples, analfabeto tinha uma visão muito curta do mundo, não sei informar de onde veio, mas pelo que se notava conversando com ele, era que tinha pouco conhecimento, vivia somente o mundinho a sua volta, era supersticioso, ignorante uma mente fechada.
   
Para seu patrão, empresário de cidade grande que comprou a fazenda era cômodo ter como caseiro o Jacó, que lhe devotava uma fidelidade canina e era quase como um cachorrinho mesmo que era tratado, pois ele não morava na fazenda, só vinha passar o fim de semana e nem todos.

 Quando chegava era sempre recebido pelo caseiro com manifestações de alegria e com um aperto de mão, um abraço e algumas palavras de carinho, mesmo que fosse da boca pra fora, tinha um empregado fiel e dedicado vinte e quatros horas por dia por um salário mínimo.
   
A sede da fazenda era composta por uma grande casa, ao lado um salão para festas, na frente jardim, piscina e ao fundo um grande pomar com variadas espécies de frutas, logo próximo a porta da cozinha havia um grande pé de castanhas e muitos pés de jabuticaba.
   
Jacó cuidava de toda a sede, mantinha tudo isso em ordem e por determinação do patrão vendia frutas para o pessoal da colônia, durante o mês ia marcando tudo num caderninho de uma forma que somente ele entendia, com alguns garranchos imitando letras e alguns números controlava tudo.
   
No final do mês ia ao escritório para entregar a relação das compras que seria descontado no pagamento dos trabalhadores, era mais ou menos assim: meia dúzia de limão, uma dúzia de laranjas, um litro de jabuticaba, um maço de almeirão, dois maços de couve, porque tinha também uma horta e assim por diante.
 
O interessante é que a família do patrão morava em São Paulo, a casa ficava a maior parte do tempo vazia, as frutas apodreciam as jabuticabas que madurecem tudo de uma só vez, perdia praticamente tudo, mas nem uma fruta era dada a uma criança, tudo vendido e o Jacó levava ao pé da letra não deixava passar nada.
   
Ele também era assim como o povo da roça dizia sistemático, para conversar com ele tinha que medir as palavras pois uma palavra dita que ele não entendesse ou interpretasse mal era o suficiente para deixa-lo magoado.
   
Com as suas coisas era também avarento, ele pegava uma caixa de fósforo e rachava os palitos um por um transformando-a em duas, a comida era o básico para sobreviver e ele mesmo cozinhava.
  Era um homem respeitador e muito trabalhador, mas de uma estupidez de dar pena, tinha lá suas esquisitices, um dia ele queria ir embora porque um urubu pousou em cima da casa que ele morava.
    
Certa vez Jacó resolveu abrir a mão, comprou uma televisão de 14 polegadas preto e branco, mas o que deixou todos de boca aberta foi em 1986 ele comprou uma mobylette Caloi na loja zero km.
   
No mesmo ano aconteceu que Jacó anoiteceu na fazenda e não amanheceu, sumiu, evaporou sem deixar rastros ou qualquer pista. Para uma pessoa como ele que de um palito de fósforo fazia dois, deixar tudo e sumir era algo que não dava para entender. Deixar as tralhas velhas de casa não era estranho mas ele deixou a televisão, a mobylette nova, o salário do mês e seus direitos pois já trabalhava ali há alguns anos.
   
O gerente da fazenda foi a delegacia dar parte do sumiço de Jacó, a polícia civil foi até lá verificou tudo, procurou algum indício de algo estranho ou pista do rapaz mas nada encontrou, depois de algum tempo uma tarde chegou à fazenda uns policiais de outra cidade, conversaram com os moradores que eram próximos a ele, fizeram perguntas mas concluíram que ninguém tinha nada a esconder, tratava-se mesmo de um abandono de emprego e de tudo.
   
Até hoje passado trinta anos ninguém teve notícias do paradeiro de Jacó ou do motivo que o levou a tomar essa decisão, o sumiço do caseiro continua um mistério.
João Batista Stabile
Enviado por João Batista Stabile em 24/09/2016
Reeditado em 26/11/2020
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