Queremos voz ativa
Hugo estava com medo.
Muito medo. Mas muito, muito medo. Sabe muito medo? Muito mais que isso. Sabe muito mais que isso? O triplo disso vezes três.
Ele apertava a mão da mãe. Mas a mesma suava em exagero e ia escorregando. Quando as mãos se separavam, ele berrava, arregalava os olhos e corria para conseguir agarrá-la novamente.
A mamãe, toda adulta, maior que Hugo e soberana, reclamava:
- Quieto, moleque!
Coitado do moleque. Tava com medo.
Sabe medo?
- Mãe... – todo trêmulo, tadinho. – Eu to com medo.
- Vira homem, moleque!
- Mas é isso, mãe. Eu sou um moleque.
Ela só ignorou.
- E to com medo.
- Não vai doer.
- Vai sim. Sempre quando falam que não vai doer, é porque vai. Eu sou criança, mas já sou velho o bastante pra saber disso.
- E você é pequeno demais para falar ‘’velho o bastante’’. Isso é jeito de criança falar? Vê se cresce, moleque!
- Mas quando eu crescer, aí eu vou falar mais difícil ainda.
- Cala a boca, moleque!
E ele, todo criança, menor que a mãe, e amedrontado, calou.
E andaram mais. Quase chegando. Hugo já conseguia ver. O coração saltando pela boca. A mãe andando como se nada de estranho estivesse acontecendo.
‘’Por que os adultos se acham donos do pedaço?’’, pensava Hugo inconformado no auge dos seus dez anos.
Mais trinta metros.
A mamãe cumprimentou alguém, mas que se dane, não é mesmo?
Poxa, Hugo estava com medo!
Mais ou menos uns quinze metros. Quase lá, quase lá. E o Hugo com seu medo? E a mãe com sua razão absoluta?
Hugo diminuiu o passo. Ficou um pouco pra trás, tropeçou em seus próprios pés e quase caiu. E nesse quase cair, quase caiu também a mãe.
Que caísse, não é mesmo? Hugo estava com medo, caramba!
- Você quase me derruba, moleque! Olha o vexame! Anda direito e me dá a mão!
- Mãe...
Mãe, mãe, que mãe?
Uma mãe quereria saber por que o filho sentia medo. E não o chamaria de moleque o tempo todo.
Olha só:
- Cala a boca, moleque!
Não to falando? Coitado do Hugo. Só um garoto com medo.
E quase lá. Vinte, quinze, dez metros.
Até que chegam. Mas não interessa aonde, nem quando nem por que. O que interessa é que Hugo estava com medo. E no fim das contas, é apenas uma criança com medo.
Chegaram. E daí?
Por que ninguém ouve as crianças?