A Arco-Íres

Arco-Íris

Ela só usava preto. Mas sabe aquelas pessoas iluminadas que parecem ter a alma colorida? Era ela. Impressionante como seu jeito brejeiro e por tantas vezes calado fabricava fãs. Dizem que a pessoa mais orgulhosa pode ser dobrada pelo toque do amor. Esse não era seu caso. Mas era seu lema. Ela sabia que sempre fora boa. Boa filha, boa irmã, boa amiga, e sabia que no fim seria boa mãe e se tivesse sorte seria boa avó. Ela sempre atraíra toda espécie de sorte ao longo de sua vida. E sabia disso. Quase nada a tirava do sério. Fazê-la alterar seu ânimo era uma tarefa hercúlea e a prova de resiliência. Nem todos gostavam dela. Ninguém agrada todo mundo o tempo todo. Assim como ninguém consegue contar mentiras o tempo todo se ser descoberto. Seu maior medo era que lhe sua vida um dia parasse de ter significados, ela os perseguia incansavelmente todo o tempo. Sua maior loucura constava em ser ela mesma. Procurava sempre descobrir novos horizontes todo dia, e quando acordava sem grandes expectativas, dizia a si mesma: ‘ hoje é um bom dia para dominar o mundo!’. Seu humor era volátil. Seu grande calcanhar de Aquiles. Detestava não poder fazer algo significativo a cada hora do seu dia. Teria cem anos, mas continuaria com aquele fulgor de desbravadora aventureira sempre em busca de medalhas e reconhecimento. Temia profundamente as coisas ruins, talvez por isso buscasse sempre cercar-se de pessoas similares. Pensava como em rede, acreditava que todas as pessoas estavam conectadas a algo maior onde ela podia identificar e propagar seus conceitos. Ela tinha o bom senso de ser cautelosa. Nunca deixava que alguém a conhecesse, mas que 60%. Mistério sempre fora um trunfo. Em todos os tempos, desde Cleópatra a Madre Tereza de Calcutá. Não era afeita a jogos, mas sabia que para sobreviver ao mundo tinha que ser muito mais forte e esperta. Isso ela não era de fato. Por baixo de seu semblante delicado, ela tinha uma vivida experiência com o sofrimento. No fundo seu coração era sozinho e levemente solitário. De jeito nenhum ela queria ser triste. Ela desejava tanto encontrar a si mesma que fazia disso uma batalha diária, vencida aos pouquinhos, sem muita esperança, mas com uma fé inabalavelmente perturbadora. Naquela manhã, olhou-se no espelho tentando expulsar o mau sono que assolara sua noite. Passou os dedos alvos pelo cabelo curto, investigou os cantos dos olhos a procura de uma alguma nova linha intrometida de expressão e sorriu. Era um novo dia e apostaria nele. Não deixaria sua tristeza ser mais forte que sua alegria. Por isso tinha que ser como era: alma leve, sorridente, delicada e gentil, e apesar de estar sempre vestida de preto, transparecia sempre ter a alma colorida como um arco-íris depois de uma tempestade. Ela era perita em desenhar e colher arco-íris. Era sim.

Malibe, hoje.

11.05.16