A noite dá seu veredito.
Intensamente envolvente pairou sobre minha cabeça.
Senti Deus em meu peito, me afagando e consolando minha alma, eu poderia acreditar que eu nao estava só.
Acreditei que mais uma vez se cumpriria o ele nao quisesse. A luz, o criador estaria comigo.
Passei pelo corredor a passos largos, eu estava mais forte, levava comigo todos os exames, dizendo que minha vida estava perdida, estava em poder da morte.
Alguns meses antes, eu estava feliz. Numa festa dançava e bebia.
Observei uma mulher linda, cabelos castanhos e enrolados davam o ar de sua graça.
Languidamente fui me esguiando num baile de conquista, ela olhou-me de canto no seu lindo olhar azul.
Cheguei perto falei da noite, da música e como no bolero de Ravel, fui desenvolvendo a conversa, branca e macia.
Dançamos, rimos e bebemos.
Ela era maravilhosa e profundamente sedutora.
Eu estava envolvido no perfume suave de flores que exalava de seu tom de pele profundo.
Talvez fosse a magia que nos inspira e nos cega a razao.
No suor de seus poros, sucumbi numa paixao inesperada.
Nos amamos e rolamos nos lençóis macios, do silencio temporal do amor.
Nunca mais a vi depois daquela noite, aquele anjo que me acariciou de mel e me fez ir às estrelas.
Depois disso veio a realidade, fiquei com uma grave gripe, febre, tremor e tudo mais.
Tomei remédios caseiros, como todos fazemos, mas nao adiantou, cada dia eu piorava mais e mais.
Fui ao médico, após quase cinco meses, ele me pediu alguns exames e veio o veredito... eu estava com aids.
Como? eu? minha cabeça rodopiava, eu nao podia acreditar nisso,
sempre usei proteçao, espere... mas aquele dia nao, aquele dia com o anjo, tao linda e perfumada?
Hoje estou aqui para mais um exame, mesmo com os remédios que me fazem me sentir tao mal, definho com o passar do tempo.
Esta é a realidade, só me resta a presença de Deus e eu como numa dramática música de Tchaikovsky nao me vejo num final feliz.
Até hoje existo.