Momentos Difíceis
Parte IV
Não foi fácil entrosar com um grupo de assaltantes. Primeiramente precisou encontrá-los e como este tipo de profissional prefere o anonimato, não se pode conseguir os endereços nas páginas amarelas da agenda telefônica. Foi um trabalho árduo de investigação, de boteco em boteco, de ferro-velho para sucateiro, enfim todos locais mal vistos nas comunidades.
Depois de escolhida a gangue em que imaginava que daria certo, o gatuno levou um baita susto — exigiram-lhe um teste de iniciação. Teria que comprovar perícia, ousadia, destemor para merecer a confiança do grupo. Foi difícil acreditar que essa parada sinistra que, geralmente, ele via em filmes e séries existia na vida real.
Os veteranos da quadrilha, armados de pedaços de pau, garrafas quebradas e até facas, formaram duas filas. O rapazote teria que conseguir chegar ao outro lado. Atravessar aquela coluna maldita para provar que conseguiria defender outro comparsa, caso seja necessário. Foi tapa na cara, pescoção e chute no traseiro! Nosso amigo ficou uma semana de molho, todo doído e ainda tendo que disfarçar para a tia que o hospedava. Fora atropelado por uma carreta, foi o que inventou.
O frangote não correspondia bem ao que os metralhas almejavam, mas teriam que se virar assim mesmo porque não dava para ficarem esperando um herói cair do céu. Havia um assalto já em andamento...
Os novos companheiros deram umas dicas para o recruta. Todos tinham um serviço, com carteira assinada, salário, para fingirem ser gente de bem. Ele deveria fazer o mesmo. Assim ele conseguiu um emprego em uma oficina mecânica. Parecia ser tão sério que até a tia comemorou, fez um bolo, bateram foto para registrar e ligaram para a mãe do moço, tranquilizá-la quanto ao futuro do filho.
Terminou que tudo ia dando certo. Garagem durante o dia, barraco na periferia à noite.
O plano era invadir a agência do Banco da Cooperativa na cidade vizinha. Já estavam monitorando a movimentação do local havia uma semana. Decidiram que o serviço seria executado na madrugada da segunda feira seguinte. Era o quinto dia útil do mês, pagamento de assalariados e aposentados, deveria haver bastante grana então, o suficiente para dividirem pelos cinco homens que participariam do ato. Usariam armas e dinamites para o assalto.
Cá entre nós, quando o inexperiente ouviu estes últimos detalhes, tremeu nas bases... Roubar é distribuição de rendas... E, se alguém atirasse... homicídio... E, nem podia deixar que o restante da corja percebesse seu medo... Mas, estava animado! Desta vez teria um sucesso!
Chegou o grande dia... isto é, a grande madrugada. Os cinco trajavam blusas escuras de moletom; na ação encobriram o rosto com os capuzes. Foram logo estourando a porta de entrada, sem nenhuma preocupação com o barulho. Três deles entraram no recinto, enquanto os outros ficaram na entrada monitorando polícia e vizinhança curiosa.
— Fecha esta janela aí, se tiver amor à vida.
— Entra logo! E, não viu nada, hein?!
O acesso ao cofre não era tão fácil como entrar no Banco. O cofre em si era protegido por um sistema de bloqueio dual: uma combinação e uma fechadura com chave, com aço reforçado. A parte fundamental foi fácil, já que duplicatas da chave tinham sido feitas com antecedência. A fechadura de combinação foi um pouco mais difícil, acabou que conseguiram quebrá-la.
Por trás dessas duas fechaduras havia um alarme de segurança que notificava a polícia assim que o cofre era aberto, quando os ímãs não se tocavam mais, o alarme soava. Era automático e não podia ser desligado. O cofre foi derrotado com o mais minimalista dos movimentos: o time de assaltantes cortou os ímãs de seus locais de repouso e os deixou juntos, permitindo que a porta do cofre fosse aberta sem separá-los. Porém, e o dinheiro?
— Ué! Cadê o dinheiro? Nem uns trocados?
Nada. O cofre estava vazio! Os bandidos esqueceram-se do básico: consultar a folhinha local. Era feriado municipal ali, Dia do Padroeiro. Na sexta feira anterior, o carro-forte não trouxera dinheiro, mas, sim, levara, até os miúdos!
O tempo era esgotado... com toda a algazarra das explosões, a polícia já estaria alertada.
Os ladrões, inconformados necessitavam de um desabafo. Seguindo pelas ruas da cidade conforme a rota de fuga planejada, desceram os vidros do automóvel, gritavam a todo pulmão:
— Cidade de pobre!
— Lugar de quebrado!
— Fechem esta porcaria de Banco! — e, mais alguns palavrões censurados...
E fugiram tomando rumo ignorado... Segundo informações estariam em um carro Fiat Punto vermelho sem identificação de placa.
Bem, saíram sem nenhum tutu, mas ninguém foi ferido, preso! Foi somente um dia de azar. Será que o pé frio era o nosso conhecido? Não. Mera coincidência. Planejariam outro serviço, desta vez de olho no calendário. Haveriam de ter aprendido com os próprios erros.