COTIDIANAS ALEGRIAS
Ando um pouco cansada de gente séria. Pouco não, muito. Gosto mesmo é de dentes. Paguei uma bagatela por um kit com três tubos de creme dental e um enxaguante bucal. Sou tão antiga que sinto falta da propaganda da Kolynos. Não que todos os dias tenhamos a obrigação patriótica de ostentar um frescor matinal, mas gente aborrecida demais, ofende.
Tenho evitado falar com Rosilda. De flor agora ela só tem o nome. Anda amarga feito suco de jiló. Já tem décadas que ela me procura para rezar a mesma ladainha: o abandono do seu antigo noivo, Ausêncio. Perder um namorado com este nome deveria ser motivo de festa regada a vinho do porto, mas ela preferiu ancorar nas orlas do sofrimento. Toda vez o mesmo mantra: “Luzinete, por que ele fez isso comigo? ” Por motivo daquele indigno, ela já chorou mais que vela de sete dias em feriado de finados. Perdeu quilos, vontades, fé e o enxoval. Já disse a ela que resposta não tenho e como meus cansaços andam me sondando, prefiro me aquietar. Há respostas que só encontramos na solidão de nossos silêncios. Talvez Rosilda esteja precisando deles. Padre Rivelino já perdoou minhas culpas depois que levei duas dúzias de quindins para ele. Desde então me sinto levinha, levinha. Nada como o sacramento da confissão.
Do meu jeito um pouco esquisito, vou tentando extrair as miúdas alegrias que me são possíveis: Preparar meus pratos preferidos, tomar um cálice de vinho, ler ao som da chuva, conversar sem pressa com os amigos na quitanda do Chico, comer jabuticabas, tomar um cafezinho com Dona Helena, cuidar das minhas flores, fazer brigadeiro de colher e o que mais vir a ser que me faça feliz.
A vida não me entregou sublimes certezas, mas me mostrou singelos caminhos. A ela agradeço.