A Quadratura do Círculo-cap. XVI

-Nem tanto assim; às vezes temos uns lances de generosidade; se bem que ajudamos a velhinha a atravessar a rua; cinco minutos depois “puxamos o tapete” do colega de trabalho.

Refletiu por uns instantes enquanto lavava um copo de requeijão. Parou um pouco e disse:

-É , o ser humano tem a contradição como uma de suas principais características; a bondade não é exclusiva do ser humano, porém é entre nós que ela se faz mais necessária. Não tenho esse pessimismo todo-disse Apolônio-só acho que as boas ações são louváveis.

Saí de lá outro; uma luz raiou em mim; pode ter sido de lanterna a pilha, mas tudo bem, afinal, o ser humano não era tão detestável assim; tinha algumas ações até que boas; há muitas coisas boas no mundo, o céu é azul e... topei com ela :

-Oi, tudo bem? O que você está falando?

Tomei um susto; vinha pensando alto, murmurando algumas coisas, quando topei com aquela figura magra, de cabelos ralos, escuros e escorridos, com um sorriso enorme a me fitar.

-Eu estava dizendo que o ser humano no fundo não é tão mau assim; tem uns lances de bondade de vez em quando...

-Eu sou sempre boa !

-Duvido!

-Duvida por quê ? Eu sempre agi com minha consciência; nunca fiz mal a ninguém e quero bem a todo mundo!

Quem era aquela figura?- pensei-será possível que teria que falar com todos os birutas que me aparecem pela frente? Ela possuía um ar simplório e inofensivo. Por que me sentia atraído por essas pessoas? Talvez me sentisse seguro com elas. Conversamos por três horas seguidas no quisque da esquina; ela só tomava guaraná.

Não é que me deu o endereço, telefone, nome da mãe, tia tios, avós, sobrinhos? Na semana seguinte estava na casa deles:

-Oiii! Você chegou!-disse ela, pulando-essa é minha tia Matilde e o Zeferino, meu primo e a Cláudia Letícia, minha afilhada !

A mesa era farta, com aquele macarrão com molho em lata; uns cachorros corriam pela cozinha; o telefone tocou três vezes. Depois ligaram o som na sala e todo mundo dançou. Não acreditei que participei de tudo aquilo, eu, tão chato e amante de Stravinsky. Mas ela me ouvia com uma cara embasbacada; talvez não soubesse o que dizia, mas ria.

E não é que nos entendemos? Eu, que no começo desse relato, por despeito, afirmei que não é a mulher a coisa mais importante para o homem, revejo minha teoria. Ela não era linda, nem bonita; quantas pessoas que conheci, mais inteligentes, mais belas, mais cultas, e... ela me conquistou! Paloma?

Ângelo Ranieri
Enviado por Ângelo Ranieri em 17/02/2016
Código do texto: T5546760
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