Passado e presente
Saudade da infância.
Inocência, pureza de infante.
Morávamos em fazendas distantes das cidades.
Meninice deixada para trás.
Na lembrança constante.
Tudo supervisionado pelos meus pais.
Brincávamos e tínhamos deveres.
Tudo divertido, até as tarefas.
O amor, o carinho, o respeito mantínhamos.
Presentes em todos os momentos do dia.
Antes do nascer do sol.
Coando o café na cozinha meu pai eu ouvia.
Minha mãe preparando as quitandas (biscoitos e bolos), assim se dizia.
Tudo guardado em latas de alumínio para macias conservarem.
Pão de sal vindo da cidade quase não se via, nem se comia.
Pois na cidade, pouco ele ia.
A turma quase toda acordava.
Com o alvoroço das conversas e barulho das vasilhas.
Éramos dez filhos e minha mãe.
Leite tirado na hora pra casa ele trazia.
Acredite Toddy já existia!
Enchia todos os copos.
Uma camada de espuma na borda do copo se formava.
Devido á forma como no copo caía.
Sorridentes a gente bebia.
E ríamos um do outro que um bigode de leite, maior fazia.
Era tudo alegria, lá nem televisão havia.
Nossa diversão e passatempo era fazer e inventar brinquedos.
Ajudar a limpar a casa, varrer o terreiro em volta da casa, o dia inteiro a gente corria.
Não tinha como nosso corpo e mente adoecerem, porque sempre ativos estávamos, ninguém dormia de dia.
Somente meus pais tiravam um cochilo após o almoço para a tarde recomeçarem a rotina.
O rádio, somente à noite o som dele se ouvia.
Fazermos as tarefas e brincarmos tínhamos todo o dia.
Até quando íamos para a roça.
Para plantar milho e feijão a gente se divertia.
Depois de uma boa chuva á noite.
Ao amanhecer saíamos, estava escuro ainda.
Ele fazendo as covas e nós colocando os grãos.
Tapando os grãos com terra deixando os pés enlameados.
As formigas picavam nossos pés e as picadas ardiam.
Colocando os grãos na cova que ele abria.
Mas passava logo, era só continuar o trabalho.
Logo as horas passavam e já era meio-dia.
O sol abrasador fazia o corpo escorrer gotas de suor.
Sentávamos á sombra das árvores para almoçarmos.
O arroz cozido com batata doce, pedaços de carne conservados na banha de porco, feijão ao fundo era o que comíamos. Para beber, água era o suficiente, a sede reprimia.
Opção de alimentação equilibrada ainda não existia.
Alimentávamos do que a fazenda produzia.
Lá pelas quinze horas o trabalho estava terminado.
Hora de lanchar na beira do rio e depois nadar.
Brincar na água, porque nadar ninguém sabia.
Voltávamos à tardinha, antes do dia escurecer.
Frutas e plantas pelo caminho colhíamos.
Feixes de lenha carregávamos para aproveitar a passagem pela mata.
Um atrás do outro, parecendo formiguinhas.
Cada um dos filhos levava um, em cima de uma rodilha de pano que meu pai fazia.
Para a cabeça não machucar nem doer com a dureza dos paus secos que continha.
Nas noites, antes de dormirmos, brincávamos no terreiro; de "roda" ou "pique- esconde," onde ficava a casinha do cachorro Joli ou então ficávamos dentro de casa, escrevendo, desenhando, colorindo ou fazendo "guerra de travesseiros", até meu pai mandar a gente dormir.
Assim eram os filhos mais velhos, os mais novos na cidade foram criados e educados.
Rotinas diferentes, outra forma de encarar a vida.
Meu pai na fazenda continuou até o fim dos seus dias.
Deus o levou, foi uma perda marcante em minha vida.
Minha mãe, hoje idosa, depende dos filhos pra fazer quase tudo.
Mas às vezes lembra-se do passado e aqueles olhos meigos fixam o teto ou “o nada” e ela repete saudosa o que muitos filhos lembram e os netos nem fazem ideia do que é.
Com tanta tecnologia e conforto a nova geração não sabe o que sentimos ao lembrar daquilo que foi bom e nos ensinou a resistir, quando as dificuldades apareciam.