A Quadratura do Círculo-cap. XII
Os Brontolonni eram uma família de imigrantes que chegaram aqui no começo do século e enriqueceram vendendo linguiças e azeitonas na feira; depois, Babbo Brontolonni montou a Peneteria Brontolonni e a família toda trabalhava ali. Primo Brontolonni, seu pai, casou-se com Manolita filha de catalães, daí o nome Paloma, Paloma Herrera Brontolonni, apesar dos protestos da família , que queria que seu nome fosse Annunziatta.
Chegamos; a mãe, toda falante :
-Sigam; primo a tua filha chegou. Mamá, a Palomita está aqui.
-Vuela!
-Palomita, mi hirra!-E deitaram aquela falação característica de castelhanos.
Primo, o pai dela, cumprimentou-nos daquele jeito durão dos Brontolonni, “um vero babbo”, quer dizer, o “chefão” da família. Pegou um uísque do barzinho; preparou o aperitivo, e com má vontade falou para mim :
-Quer?
-Não, obrigado !
Um mistério absoluto era o Babo Primo; fazia seus negócios, mas não havia como me inteirar. Qual o segredo de ganhar dinheiro? Ele conversava com seus outros parentes e trocavam segredos. Senti-me isolado; não havia interesse por meu trabalho; acho que julgavam insignificante frente a seus “negócios”.
-Por que não conversa com eles; misture-se- era Paloma a falar.
-Eles não me dão atenção. Podiam perguntar sobre meu trabalho, sobre meu time preferido, sobre meu signo.
-Você não quer se entrosar !
“O homem é um ser social” -lembrei-me das velhas aulas de Educação Moral e Cívica. A professora usava óculos grossos e os livros mostravam o protótipo da família feliz: loira, cumpridora dos deveres; cantava o hino nacional com a mão no peito; as meninas de trancinhas, os meninos de cabelos cortados...
-Tremendo som, cara!
Meu amigo colocava o vinil na vitrola; eu tinha 17 anos; aqueles sons estridentes diziam algo no meu peito; era uma maneira de descarregar a raiva contida, as humilhações, a vontade de gritar, de xingar o mundo, de libertar a sua vontade de rir, de cantar. Aquela moça de que gostava ia lá, na casa dele; era alegre, despudorada, dançava bem , um pouco como Paloma. Agora sei por que gostei dela...Mas meu pai gostava de Chopin. Comecei a ouvir.
-O quê? Você vai ouvir isso?
-Mas os Beatles ouviam música clássica também, como em Penny Lane...
Meu pai é quitandeiro, mas também fez Sociologia na Puc. Me ensinou que as profissões proletárias são uma forma de conhecermos melhor as agruras dos trabalhadores. Talvez isso justificasse ter recebido a quitanda do avô e sua pouca habilidade nos negócios.
Cheguei a escrever o Rock do Chuchu; a letra incluía batatas, mandiocas, abobrinhas.
-Legal, cara, manero!
Meu amigo, Ubirajara, o Bira, achou bom; até tirou umas notas na guitarra.
Uma vez cantei a música para Paloma; achou que estava ficando louco!