Por Inteiro
- Eu te quero. - disse ele, com aquele sorriso ensaiado 10 vezes na frente do espelho. - Quero teus olhos claros de propaganda de perfume europeu; quero teus cabelos louros de boneca; quero teu corpo frágil e esguio de boneca. Quero teus lábios carnudos sobre os meus, e teu hálito passeando sobre meu pescoço. Quero cada centímetro da tua pele macia para acariciar e apertar. Quero teu sorriso encantador e quero tua voz baixa, contida. Quero tua risada, mas nada escandaloso, apenas um sonzinho suave para rir das minhas piadas e não me fazer parecer um idiota.
Eu te quero, mas não te quero por inteiro. Foi o que ele não disse. Guarda para ti tua sensibilidade, que não tenho tempo pra ela. Ninguém tem. Não quero tua mente supersônica, pois não consigo acompanhar. Não quero tuas conversas profundas, que elas me entediam profundamente. Não quero teus sonhos inalcançáveis, pois não pretendo ajudar a persegui-los. Não quero teus receios, porque eles são bobagem de mulher. Não quero tuas paranoias, porque vives de exageros. E não quero teu amor, porque amor é coisa de gente fraca, de gente iludida.
Eu te quero, mas não te quero para sempre. Foi o que devia ter lido em seu olhar. Enquanto for bonita, enquanto for interessante, enquanto as qualidades físicas superarem os defeitos de personalidade. Enquanto não houver outra mais bonita, mais interessante, com menos personalidade (digo, com menos defeitos!). Enquanto assim eu quiser, porque não te fiz promessa alguma, não te devo nada. Enquanto estar contigo for mais divertido que beber com os amigos, que assistir ao campeonato europeu de futebol. Enquanto sua cabecinha romântica não confundir cavalheirismo com "felizes para sempre".
E assim, as bordas iam se desgastando. Porque, por mais que tivesse muito para dar, ninguém a queria por inteiro.