A Quadratura do Círculo-cap. X
-Mas não podemos evitar os problemas, tomar medidas cabíveis?
-Não, devemos agir como os estóicos e aceitar a dor.
-Ou gozar a vida como os epicuristas.
-Não; não deve haver desperdício de energia inutilmente; quando se é hedonista, a energia a mais de um fará falta para a harmonia universal.
Aquilo me parecia sem sentido. Fiz menção de me levantar; me segurou com os braços; era daqueles idosos, com barba rala, dentes amarelos, que quer um mártir para ouvi-lo.
-Desculpe, tenho que ir- joguei umas notas na mesa e fui. Saí dali cada vez mais convencido de que a função do homem no mundo é plantar batatas; se todos fossem batateiros, ninguém pensaria na roupa que iria usar na festa, no pedigree do cachorro, na torneira quebrada, na comissão nacional da mandioca...
Saindo dali, encontrei o Severino Girimum:
-Olá, Severino!
-Oi, Seu Bartolomeu...tudo bom?
-Tudo; e como vai a horta?
-Tô plantando verdura, um pouco de milho e até uns pés de machucho.
Curioso aquele homem que sofreu tantas agruras na vida; infância miserável; veio como pau-de-arara; chegou aqui há 20 anos e vende suas mercadorias na barraquinha; num canto embaixo do viaduto cultiva uma horta; a prefeitura quis tirar, mas saiu na reportagem, muita gente se comoveu, e aquela réstia de verde em meio ao cimento sobreviveu. Apesar de tudo, os humildes sempre têm uma postura alegre diante da vida, mesmo tendo pouco motivo para isso:
-E a família?
-É, logo vem mais um. Vamos todos comemorar com festa e batucada a noite toda!
É isso-pensei-como um sueco encara a vida? Lá em Estocolmo, como cansamos de elogiar, está tudo limpinho, arrumadinho e a 20 graus abaixo de zero; aquela neve cobrindo tudo; ele encontra aquela sueca loira, o amor de sua vida e vão passear no parque...não, não dá! Quantas vezes eu ouvi da janela o pessoal tocando até altas horas da madrugada; de vez em quando uma briga...mas isso é vida; sim!
-Passe a carteira meirmão!
`Pronto, fui vítima daquela vida que pululava em meu redor; precisamos de leis mais duras; ah ,, na Suécia não é assim!...Bobagem; puro preconceito face ao nervosismo; já vi gente excelente e péssima em todos os lugares e em todas as classes ; ainda mais nas altas esferas.O Severino é meu chapa; quanta gente passa por ele e nem o cumprimenta; gente boa, gente finíssima, que me quebrou tantos galhos quando eu precisei e...não foram os pós graduados não sei onde que me auxiliaram.
-Onde você andou? Nossa, o que aconteceu? Não diga, foi assaltado!
-Tive que fazer ocorrência!
-E o dinheiro da prestação-ficou branca como cera.
-Já tinha pago; ainda bem!
Mais aliviada, Paloma sentou-se no sofá:
-Amanhã tem a festa do filho da Cassildinha; eles fazem questão de nossa presença!
Começo a dar razão ao professor Avogrado.