Pode ser
- Vamos assistir um filme? - você disse, sorrindo.
Fazia muito tempo que eu não te via, mais de um ano. E você agia como se ainda fôssemos amigos.
Amantes.
Como se fosse natural, depois de tanto tempo reencontrar alguém com quem você perdeu contato.
- Pode ser, escolhe aí.
É estranho você estar aqui, na minha cama, depois de uma festa. E você está sóbrio! O que é ainda mais estranho.
- Você está sóbrio - não consigo não fazer essa observação.
- Sim. Você sabe como é… eu não gosto que você me veja bêbado.
- Por que você está aqui?
- Não sei - você continua sorrindo, e diz - acho melhor você escolher o filme, você sempre foi melhor nisso.
- Você sempre odiou os filmes que eu escolhia - retruco.
Eu não estou entendendo nada do que está acontecendo.
Estávamos numa festa e viemos parar aqui, no meu quarto.
Você está sorrindo. Você está feliz. Você está mudado de algum modo.
- Eu amei 500 dias com ela.
- Você nunca terminou de assistir!
- Mesmo assim… Só escolha um que você quiser.
- Então vamos terminar 500 dias, pode ser? - digo, você acena que sim com a cabeça.
Me levanto da cama, para pegar o dvd. Você me segura, e diz:
- Nós passamos 500 dias juntos já?
- Juntos somente três meses. Cinco, com o tempo que conversávamos pela internet.
- E quanto tempo desde que não nos vemos?
Você está deitado na minha cama, e eu não consigo lidar com isso.
- Um ano, mais ou menos.
- Caraca, quanto tempo!
- Posso pegar o dvd? - pergunto e me levanto.
- Ah, sim…
São somente cinco passos até a caixa em que guardo os dvds que compro na esquina de casa. Mas a cada passo um pensamento. Ou seriam sentimentos? Os sentimentos são pensados? Não sei, mas na minha mente o mundo está acabando e sendo reconstruído continuamente. Mas uma coisa está sempre presente: você.
Mais cinco passos na volta. E você ali, deitado, apenas de cueca. Com o mesmo corpo de um ano atrás. Com o mesmo olhar de um ano atrás.
Coloco o dvd.
Aperto o play.
Deito de bruços na cama, assistindo o filme.
Você deita ao meu lado.
Você apoia sua cabeça em meu ombro.
Você apoia sua mão na minha nuca. E acaricia meu cabelo.
- Eu sinto sua falta…
São as últimas palavras que lembro de ouvir antes de cair no sono.
Quando acordo, estou sorrindo. Sozinho na cama. A tv ainda está ligada.
Mas sei que tudo não passou de um sonho.