A Quadratura do Círculo-cap. II

Cap.2

Tudo isso pode ser resumido , sem delongas; olha eu novamente falando de amor entre homem e mulher; sim, mas fomos habituados a isso; tudo,a mídia, os livros, mas menti ali atrás quando disse que fui o bom moço; nunca aspirei a esse título, embora fosse condicionado a isso e por inércia seguia esse destino, mas nada mais contrário aos nossos instintos. Rufino é mau realmente ou segue os instintos e a lei da vida, apenas? Paloma é vulgar...ou eu sou tolo?

Quando criança tinha meus toques de maldade:

-Me dá, me dá, me dá um pedaço!

-Não, é meu !

Eu e minha irmã discutíamos por causa de um pacote de biscoitos. Dei-lhe um peteleco daqueles; está certo que as consequências foram nefastas depois para mim. Outras vezes atazanei colegas de classe e maria-vai-com -as –outras , fiz coisas que não devia para não ficar de fora da turma, mas nada que prejudicasse a minha fama de bom rapaz.

Mas agora vou me dedicar ao riso, pois me convenci de que todos os males do homem advêm do mau-humor e tornar a nossa vida mais leve é nossa obrigação; isso independe do caráter do indivíduo, se ele é bom esposo, sócio da união dos escoteiros ou se votou nas últimas eleições.

Ah, mas o leitor quer saber do meu encontro com Paloma; não se satisfez com a minha teoria sobre o sorriso. Pois bem ,leitor convencional, vamos ao convencional, pois não assusta. Vamos lá:

-Você sabe onde fica a plataforma de embarque?

-Tomei um susto; olhei fundo naqueles olhos diáfanos e profundos; tomei coragem:

-Eu sei onde é...quer que eu a leve lá? É perto...

-Eu adoraria ;estou meio perdida por aqui...

-Ah, é? De onde você é?

-Do interior...pertinho...

-Mas nem tem sotaque!

Pela primeira vez na vida a conversa entabulou; sentia uma afinidade no olhar; ela eu conseguia encarar nos olhos. Perceba que não encaram: ou são tímidas, inseguras ou, dissimuladas; as dominadoras soltam chispas do olhar. Oh, olhos, espelho da alma; lugar-comum mais que válido.

-É ali, plataforma cinco...

-Obrigada...

-Qual seu nome?

-Paloma...

O que aconteceu depois? Ora, nada aconteceu depois. Num ato de coragem pedi seu telefone. As coisas fluíram lentamente; tijolo a tijolo fui construindo aquela relação, mais por insistência minha:

-Alô, ah..., você de novo. Tá bom , vamos sair essa noite!

Sabia que ela se encontrava com outros rapazes; vi quando a espreitei se encontrando e dando um beijo em outro que nunca vi. A sua natureza é assim; sente-se bem assim, se fazendo bela, vaidosa, desejada.

Paloma, um belo nome, um nome poético... mas que estou a dizer? E se me dedicasse às outras coisas desse modo, seria um campeão de pingue-pongue e falaria norueguês, mais útil que esses devaneios tolos. Conheço um homem que dedicou sua vida a colecionar caixas de fósforos: tinha uma tonelada delas em casa, de todos os países, de todas as formas, cores, tamanhos...não deixou de casar, de ter filhos; sua mulher achava ruim a bagunça, o espaço ocupado, mas essa era sua maior força: conhecia caixas de fósforo como ninguém.

Que disse que nossa vida tem de ser como nesses folhetins baratos? Ainda suspiramos por uma donzela, como no embolorado Romantismo.

Rufino, como admiro você! Homem de ação, decidido, postura firme. Eu nunca tive seu desembaraço. E me roubou Paloma. Certamente ela viu suas qualidades viris e, em comparação com as minhas intelectuais, a balança pendeu a seu favor.

-Eu sou seu amigo! Pode contar comigo!

Ah, mas que afirmação mais falsa! Amigos servem para roubar sua mulher?

-Você hoje vai conhecer meus pais...

Para quê? Que inutilidade...

-Ah, não sei se devo...

-Ah, é? Não quer assumir compromisso sério!