A senhora ao lado
Foi apenas um sorriso, nada mais. Despedida simples, sem lenço branco, sem palavras. Parti.
A estrada corria sob as rodas do ônibus. As árvores iam ficando para trás, fazendas e tudo mais. Viajava de pé, pois os lugares estavam todos ocupados. Era cansativo, mas tinha que ser assim, não havia outro jeito.
Meus olhos rondavam todo o ônibus e observavam tudo, até mesmo aquela velhinha lá atrás. Eu ia na frente. E foi então que vi uma linda jovem, loira, vem trajada, ao meu lado. Ela me sorriu. Não foi como aquele da despedida, diferente. Um sorriso encantador. E esse sorriso me deixou desconcertado, tamanha era a nossa proximidade. Mudei de posição para disfarçar, mas voltamos a encontrar nossos olhares, e então...
- O senhor também vai para Brasília?
Não gostei do "senhor" mas respondi.
- Vou... é de lá ou vai a passeio, como eu?
- Moro em Brasília.
Silêncio. Outro sorriso.
- Como se chama?
- Carla... Carla Gonçalves. E o senhor?
- Por favor, não me chame de senhor. Põe-me muito velho...
- Não disse seu nome.
A garota divertia-se.
- É meio comprido... Sou Humberto Cândido da Silva Júnior.
- Acho que conheço seu pai.
Complicou. Dera o nome de um amigo, cujo pai era industrial. Já havia dito, o que fazer: continuar com a farsa.
Uma senhora que ia ao lado da jovem já estava de cara fechada e fazia-se neutra ao assunto. Continuei.
- Sabe que é bastante bonita? Seus olhos são lindos, assim brilhantes.
- Obrigada... Você é muito gentil.
Fiquei olhando a paisagem e pensando o que ia falar. Infelizmente falei:
- Está viajando sozinha?
Dei uma boa olhada na senhora e esperei uma boa resposta.
- Não... Esta é minha mãe.
E foi só. Calei-me e voltei a mudar de posição.
(Extraído do livro "Um prato de
comida" - 1979)