POVO DO MATO GROSSO: ENCRENCA É MEU NEGÓCIO !

- Oir a las estrellas? Qué locura!

Y yo os respondo: las adoro tanto,

que a veces en la noche me levanto

para escuchar su música en la altura.

Y el divino coloquio así perdura

hasta el amanecer, que em mi quebranto,

digo palabras úmidas en llanto

a cada estrella que en lo azul fulgura.

Pero dirés: acaso su brilhante

fulgor habla al espíritu distante?

Al férvido cantor qué dicen ellas?

Y yo os digo: amad y habréis adivinado:

sólo el oído de un enamorado

puede oír-lo que cantan las estrellas!

("Estrellas", Don Roberto Liévano, poeta

colombiano, publicado em 1894).

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Não há lugar melhor para se arrumar confusão do que numa festa de confraternização.

Pois que, ainda esses dias, fui a uma com a minha mulher.

Sentei-me à mesa com estranhos;

ou melhor, quase estranhos.

Conhecia os dois outros casais que sentaram-se conosco;

mas não os via há anos!

Trinta anos, talvez; ou até mais.

Um deles eu conhecia a mulher, pouco mais nova do que eu, meio doidinha na juventude; na terceira idade é professora de folclore numa faculdade do Mato Grosso do Sul.

Do outro, conhecia o homem, um pouco mais velho do que eu; sempre bom sujeito; desembargador aposentado do Mato Grosso.

Cumprimentamo-nos, recordamos um pouco o passado, brindamos e bebemos vinho branco frisante, com o qual a doidinha encasquetava encher o copo de todos, mais rápido do que podíamos beber.

Depois seguiu-se mais vinho, mais petiscos, carne, coisa e lousa, etc e tal.

A maluquinha engatou uma conversa alegre, rindo bastante, inclusive do marido que lhe servia de enfeite.

A certa altura, estávamos íntimos;

celebrando o passado;

e festejando o futuro.

Que ao sabor etílico já não era muito firme.

Então, fizemos uma pausa.

E passamos a ouvir, atentos, um violeiro que dedilhava

magnificamente um violão

e cantava musicas do pantanal do Mato Grosso.

Cantou "Chalana";

"cuitelinho";

"trem do pantanal", etc.

Foi quando eu abri minha enorme boca:

____ "Chalana" é de autoria do Mario Zan; "Cuitelinho" é música folclórica recolhida e imortalizada por Paulo Vanzolini; e "Trem do Pantanal", chamava-se "Trilhos da Terra" e é música composta por uma dupla cujo nome não lembro agora.

Disse sem maldade.

Mas foi como um tapa na cara de cada um dos meus companheiros de mesa.

A doidinha bateu na mesa e saiu em defesa da sua região:

____ O senhor está errado; essas músicas são de autoria do Almir Sater; eu ensino isso aos meus alunos. na faculdade.

Retruquei:

____ Então... tenho pena dos seus alunos!

O desembargador, de ofício, meteu a colher de pau:

____ É do Almir Sater! Sim senhor... todo povo do Mato Grosso sabe disso !

Não fundamentou as razões do seu voto, coisa que, por razão de ofício, deveria estar acostumado.

O povo do Mato Grosso é muito sensível quando se trata do pantanal.

A doidinha me jogou a colher e disse:

____ Repita o que disse sobre meus alunos.

O marido fez cara de quem já estava habituado com baixarias.

Pedi perdão pela ofensa.

Minha mulher me deu beliscões.

E o desembargador segurou a garrafa do vinho, para si; no máximo só dividiria agora com maluquinha.

Nadica pra mim:

____ Você já está confundindo Jesus com Genésio; e Almir Sater com outros... outros... compositores sem valor!

Minha mulher resmungou:

____ Você para, senão vou embora!

Ok!

Parei.

Virei-me para o músico e pedi:

____ Toca Sandy e Júnior, por favor!

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No poema "Estrellas" que abre este texto, consta como autor Don Roberto Liévano, que o publicou na Colômbia em 1894.

Olavo Bilac publicou "Ouvir estrelas" seis anos antes, em 1888.

Bilac é o autor da obra.

Menos na Colômbia.

Isso acontece porque Roberto Liévano, espertamente, traduziu o poema e não declinou o autor.

Agora, na Colômbia, é dono do poema.

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Almir Sater é ótimo artista e já vi dois espetáculos dele.

Vale a pena.

Merecidamente é adorado no Mato Grosso.

Mas, com o devido respeito, ele tem um defeito.

Nunca diz o nome do autor das músicas que canta.

Até na internet, na wikipédia, estão listadas músicas que não são de sua autoria.

Embora ele tenha dado excelente interpretação.

Mas autor é autor; cantor é outra coisa.

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"CHALANA", é de autoria de Mario João Zandomeneghi, ou Mario Zan - como é conhecido.

Em 1943, Mário Zan foi a Corumbá numa série de shows que fazia em cinemas (ele era contratado do "Pedutti"). Primeiro passava um filme e depois vinham os artistas.

Naquela época as pessoas iam de trem até Porto Esperança, ali pegavam um navio veterano da Guerra do Paraguai e subiam o rio até Corumbá, a viagem durava um dia e uma noite.

Numa reportagem na rede Globo, (José Hamilton ibeiro - "Globo Rural"), Zan conta que nessa viagem de navio conheceu uma mocinha, cuja fotografia guardava na carteira até pouco antes de morrer. Ele ficou no hotel e a mocinha seguiu viagem. Da janela ele via a "Chalana" fazer a curva do rio, e assim compôs a musica em homenagem a esse dia e sentimento.

O hotel mudou de nome mas ainda existe, com três andares, janelas pintadas de verde, fica na rua Manoel Cavassa (quase em frente a ferradura da praça) nº 109.

"CUITELINHO", (espécie de beija-flor), é uma música folclórica do Mato Grosso e uma das mais lindas músicas do cancioneiro popular brasileiro. A letra foi recolhida por Paulo Vanzolini durante uma pescaria, e até hoje é interpretada por grandes nomes da música popular brasileira.

"TREM DO PANTANAL", é de autoria de Geraldo Roca e Paulo Simões. É considerado o hino não oficial do estado do Mato Grosso do Sul. Em 1975 os dois moravam no Rio de Janeiro mas viajavam para Santa Cruz de la Sierra numa cabine dormitório do lendário Trem do Pantanal da NOB que vai até Corumbá e, dali, embarcaram no chamado Trem da morte boliviano. Durante a viagem que tiveram a feliz e inspiração para compor a musica.

Inicialmente chamava-se "Trilhos da terra"; mas com o sucesso mundial do pantanal convenientemente o titulo definitivo ficou como "Trem do Pantanal".

O ambiente da viagem, a angústia da fuga da ditadura, os induziu a compor a musica, conforme as próprias palavras de Roca em entrevistas, as referencias a "mais um fugitivo da guerra" na música são porque Paulinho fugia dos militares do golpe de Estado de 1964, que tinham atacado a célula do PCB no Rio que Paulinho frequentava em 1975 - apesar de tão novo, na época os dois eram adolescentes com aproximadamente 17 anos.

No inicio de suas carreiras se apresentaram num festival de música no Mato Grosso e foram desclassificados, porque a letra era considerada "subversiva", pois falava em "mais um fugitivo da guerra", que obviamente se referiam a fugitivo da ditadura.

Geraldo e Paulinho fizeram em carreiras solo, apesar da dupla do inicio.

Moram no Rio de Janeiro, mas as suas famílias tem fazendas no Mato Grosso; dai a ligação.

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Ufa! Cansei...

Obrigado pela leitura.

Sajob, dezembro / 2015