Última Aposta

Um tinha dezessete. Pensava ser a hora. Não via mais sentido em existir. Ainda havia o que fazer levando-se em conta os anos que faltavam para a vida adulta e suas imposições naturais. Possuía fôlego de vida, faltava vontade. O coração pulsava, o sangue corria. Mera casualidade. Não há nada que sustente um corpo em estado de morte proposital. A ideia de não ter a menor ideia do que o futuro lhe reservava era o mistério mais doloroso.

Em algum lugar não muito distante, outro desistente prestes a sair de cena. Passara da adolescência fazia algumas décadas. Setenta anos de uma longa espera. Esperava por um milagre e nem mesmo a "família tradicional" formada entre mentiras e falsas tentativas de fingir alegria era capaz de fazê-lo desistir de desistir.

Houve pequenas porções do que supunham ser felicidade em alguns momentos. Ambos sabiam que a reconheceria se fosse real. Saberiam sem que ninguém precisasse dizer. Agora, já nem faziam questão. Não queriam mais encontrá-la, nem serem encontrados. A busca incessante chegara ao fim. Ao mesmo tempo, sem nenhum conhecimento um do outro, partiram rumo à escuridão, o que talvez fosse uma vantagem. Havia graça na surpresa e a essa altura, a incerteza fazia-se muito mais interessante que as constatações indesejáveis.

Roleta russa, caminho sem volta. Arrependimento não valeria de nada quando tudo acabasse, mas numa mente que acredita não ter nada a perder, qualquer aposta parece um bom jogo.