896-MARCAS DE BATOM NO ESPELHO
Na Escola Estadual Dr. Gomes Junior, na cidade de Além Morro, uma situação inusitada desafiou o Diretor, homem enérgico mas grande educador e dotado dum grande senso de bom humor: meninas de onze, doze e treze anos, que já usavam batom, todos os dias beijavam o espelhos do banheiro, para remover o excesso de batom nos lábios. Coisa de adolescentes, aparentemente sem importância para elas, naturalmente.
Para o zelador Mariano limpar os espelhos depois de cada intervalo, quando as meninas aproveitavam para “retocar a maquiagem”, era um aborrecimento, que atrasava seu trabalho.
— Professor (era assim que Mariano tratava o diretor) as meninas lambrecam de batom todos os espelhos do banheiro delas. Depois de cada intervalo, tenho de limpar tudo de novo.
— Vamos lá ver. — respondeu o diretor.
Foram os dois após o primeiro intervalo. O que o diretor viu provocou um sorriso disfarçado ao ver todos os espelhos com marcas de beijos em batons das mais variadas cores, do carmim ao azul claro.
Contudo, ao mesmo tempo, viu que tinha de tomar alguma providência. Não havia ainda regras para esse tipo de comportamento. Já cercara muita coisa, como proibindo o uso de celulares, de gorros, casquetes ou chapéus durante as aulas e coisas assim.
Mas agora essa nova atitude...
Na manhã seguinte, o diretor reuniu o bando de adolescentes que presumivelmente estavam marcando os espelhos com os lábios, mostrou-lhes os espelhos e ordenou ao Mariano que os limpasse. Eram dez espelhos, que foram esfregados com um pano limpo, usando um detergente especial para limpar espelhos.
A limpeza durou 25 minutos e foi consumido meio litro de detergente.
— Vejam, meninas, além do trabalho extra (e isto acontece depois de cada intervalo), há o consumo de detergente.
E falou muito mais coisas, numa palestra de mais 25 minutos.
Na manhã seguinte, quando os alunos e alunas entraram para a segunda aula, Mariano viu que nada adiantara a longa conversa do diretor no dia anterior.
— Professor, venha ver o banheiro das meninas. Elas parecem que são surdas
O diretor constatou o mesmo, quando viu os espelhos como sempre, ou até mais sujos de batom.
Na manhã seguinte, novamente o diretor reuniu as garotas no banheiro, após o primeiro intervalo, e pediu ao zelador para mostrar mais uma vez a dificuldade do trabalho. Algumas garotas reclamaram: “Já vimos este filme” ou “estamos perdendo a aula” e coisas assim.
O zelador imediatamente pegou um pano, molhou no vaso sanitário e passou no espelho.
Nunca mais apareceram marcas de batom nos espelhos.
ANTONIO ROQUE GOBBO
Saint Louis, MO, USA – 25 de abril de 2015.
Conto # 896 da SÉRIE 1.OOO HISTÓRIAS