A sola furada do meu sapato
Era milésima vez que passava pela mesma rua em direção ao lugar onde eu trabalho. A sola furada de meu sapato interrompeu meu percurso normal quando pisei numa poça de água. Meus dedos umedecidos e esfriados á agua me provocaram desconforto.
Não digo que isto me obrigasse a parar e nem que um novo percurso da minha vida seria instaurado por causa disto. Aposto que pensaram isto! Que clichê ordinário, tomara que eu esteja enganado. Mas continuando, comecei a olhar o trânsito e percebi que escorria meu sangue naquela água suja, meio cinzenta.
Fui andando assim mesmo e me apressei para não atrasar a chegada ao trabalho. Será? Na verdade, queria me livrar da repulsa que a cena me causava, embora inicialmente até admirasse vendo a mancha escura do sangue aumentado e misturando com água possivelmente contaminada.
Mas depois, confesso que senti repugnância, amei por alguns segundos me esquecer naquela cena. As pessoas passavam como correntes de corpos, embora só agora me desse conta disto, somente agora escolhi me sentir assim. Sabia também que podia significar alguma coisa meu pé sangrento sujando o carpete, poderia explorar a compaixão ou ser cínico fingindo que nada aconteceu.
Fui direto a porta do banheiro, não percebi se me olhavam ou não, a porta estava entre-aberta algum sem-noção poderia estar lá. Ia mancando, puxando a perna em direção ao banheiro, impávido, como alguém que estivesse prestes a declarar a independência do Brasil.
Senti medo e me escondi sobre sentimentos ridículos...