888-O TICO-TICO- Histórias do Carteiro Henrique-3º
Histórias do Carteiro Henrique – 3º.
Ver # 650- Bar do Ino – Histórias do Carteiro Henrique # 1
Ver # 887 – Quem não Quer Henrique Ser? – H.do Cart. Henrique # 2
Henrique Serra, carteiro da cidade de Dores do Grotão Fundo, era muito bom no que fazia: entregar a correspondência na metade da cidade que lhe competia. Tão competente que arranjou um pequeno negócio, paralelo ao serviço, que lhe rendia um dinheirinho a mais: levava consigo algumas revistas novas, consignadas pelo Alfredo Jornaleiro, que oferecia aos residentes onde entregava a correspondência. Uma coisa não atrapalhava a outra e Ricão formou uma clientela que lhe comprava as revistas, tão logo elas lhe eram entregues por Alfredo.
Eram as revistas da época: Cruzeiro, Carioca, Vida Doméstica, e algumas revistas em quadrinhos, os gibis mais comuns: Globo Juvenil, Gibi, O Guri, Lobinho. Na década de 1940, o mercado era pequeno e poucos os títulos disponíveis. Ah, sim, também O Tico-Tico, infantil, com assuntos variados, e que vinha sendo publicada desde 1905. Mas dessa chegavam poucos exemplares, e não eram entregues ao Ricão.
Aos domingos, Henrique saia a caçar passarinhos. Tinha um viveiro em casa, diversas gaiola com sanhaços, canarinhos e outros pássaros que enchiam a casa com seus chilreios e trinados. De vez em quando negociava um de seus pássaros, mas isto a muito custo, pois tinha uma estima especial pelas avezinhas.
Um dia, enquanto cortava o cabelo na barbearia do Seu Armando, este falou com o Ricão:
— Ô Henrique, vê se me arranja um exemplar do Tico – Tico.
— Uai, Seu Armando, prá que ocê vai querer um tico-tico?
E antes que seu armando explicasse, completou:
— Semana que vem trago o tico-tico pro senhor.
Na semana seguinte, aparece o Ricão com um alçapão, dentro do qual está um tico-tico.
— Ta aqui, Seu Armando, o tico-tico que você me pediu. O sinhor tem gaiola prá colocar? Peguei ele ontem e como é um passarinho muito vagabundo, não botei ele na gaiola, as minhas tão todas ocupadas.
— Ora, Ricão, eu te pedi foi O Tico-Tico, uma revista que o Alfredo recebe todos os meses.
E vendo a cara de surpresa do carteiro/passarinheiro, nem quis prolongar o caso.
— Quanto é que é esse passarinho?
— Pro senhor, que é meu amigo, é dez paus.
O barbeiro foi ao fundo da barbearia, abriu uma caixa de madeira onde tinha o dinheiro, tirou uma nota de dez e entregou ao Ricão. E pegando o alçapão, o abriu, dando liberdade ao pequeno pássaro, famoso por ser nome de revista infantil.
Ricão, é claro, ficou ali, de pé na porta da barbearia, sem entender nada.
ANTONIO ROQUE GOBBO
Belo Horizonte, 10.02.2015.
Conto 888 da SERIE 1OOO HISTÓRIAS
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