A garota solidão
Ela gostava de ficar sozinha. Gostava de ler sozinha e escutar música sozinha também. Só arrumava a casa quando estivesse sozinha. Preferia assistir a filmes e seriados sozinha do que acompanhada. Gostava até de sair sozinha, ir ao shopping, a praia, a um restaurante. Não gostava muito de falar, nem de ouvir demais. Preferia o silêncio. O sossego. A paz. Ela era a paz. Estar sozinha para ela era tão fundamental que a companhia dos outros costumava incomodá-la. Estar sozinha permitia-lhe pensar. Ela gostava de refletir sobre tudo e sobre nada. Se pudesse passar a vida inteira sozinha, passaria. Uma ilha isolada onde somente ela existisse era seu desejo ardente. Tudo o que fazia sozinha era satisfatório.
Não ansiava a presença de ninguém, pois sabia se divertir bem com sua própria companhia. Cantava, dançava, lia, encenava, falava sozinha à torta e a direita, andava de um lado para o outro inventando cenários e personagens e falas e tudo. Gargalhava-se de si própria. Exercitava seu corpo e sua mente. No cotidiano se sentia inferior à maioria das pessoas, mas quando estava sozinha se achava a mais linda do mundo, a mais inteligente, a mais esperta. Orgulhava-se dela mesma. Nunca vi uma pessoa tão feliz consigo quanto ela era. Uma pena se sentir tão minúscula com a humanidade que a acha tão silenciosa e diferente. Retraída. Reprimida. Ela não ligava. Vivia mesmo. Estar sozinha era tão mais importante, que tudo que as pessoas lhe faziam, fosse bom ou ruim, não lhe afetava tanto. Não lhe magoava ou não lhe trazia tanta felicidade quanto o intencional. Era de se admirar tanta alegria que nela vivia. Se as pessoas soubessem o quanto ela era feliz e ao mesmo tempo triste. Ela gostava da solidão, porque nela poderia viver a vida que quisesse, mesmo que apenas dentro do seu pensamento. Imaginava uma vida que jamais viveria.
Ela gostava de ficar sozinha, mas não queria estar sozinha. No mundo dos seus sonhos as pessoas eram diferentes, a vida era diferente. E era com essas pessoas que ela queria viver. Pessoas que a entenderiam. Que não invadiriam seu espaço. Ela queria estar afastada apenas da realidade que vivia. Ah se seus sonhos se tornassem realidade... Ela queria viver tudo o que lia, seja história de suspense ou de romance. Ela mesma criava suas próprias histórias de tanta imaginação que obtivera extraída de tanta leitura ficcional. Gostava de aventuras. Gostava dessas histórias, dessas vivências. Até que um dia mergulhou tão profundamente na sua incrível imaginação que não quisera mais voltar para a realidade. Enlouquecera de vez. Desvinculou-se do real e finalmente foi ser feliz no mundo que sempre quis viver. O mundo da sua imaginação.