DO OUTRO LADO DA AVENIDA

Em mais uma quinta-feira num dia 20 de um mês qualquer, o sol não dava trégua, e eu ia andando para o trabalho de cabeça baixa. A vida parecia ser a mesma todas as coisas pareciam iguais, sempre o mesmo percurso, eu vagava pela avenida sempre atrasada , as vezes ousava-me acordar cedo e ser pontual. Na verdade eu sempre acordava cedo, mas me levantava ,sentava na ponta da cama e ficava imaginando a sociedade, o fluxo dos carros na pequena cidade , a fumaça dos caminhões que me doía a cabeça,nas pessoas nunca que respondiam o "bom dia" que eu dava automaticamente por educação e que as vezes tentava convencer a mim mesma de que era real e me perdia nesses pensamentos. Olhava para o relógio que num despertar me avisava que estava perdendo tempo. Pronto... Me levantava vagarosamente , lavava meu rosto e por várias vezes evitava olhar o medo que me assombrava no espelho, a verdade é que sempre evitava me olhar no espelho por ter medo de mim, por temer meus pensamentos. Cheguei na loja e essa quinta-feira de movimento fraco se tornava cada vez mais comum, as pessoas questionavam o preço alto das mercadorias e minha única justificativa era a crise que supostamente atingia o país.

Ficava pensando se aquelas pessoas na rua podiam imaginar a crise que estava acontecendo dentro de mim.

- Será que existe alguém lá fora com esse mesmo sentimento?

Me indagava as vezes em voz alta ,sozinha.

Sempre fui certinha, andava sempre na linha e nunca me permiti sair do limite.

Ainda jovem e com tantos sonhos deixava meus pensamentos voarem num aviãozinho de papel que por um descuido veio parar em meus pés...

Tinha vontade de tomar um uísque e me embebedar com meus livros de poesia, mas faltava-me coragem, tinha vontade de pegar o telefone e ligar pra alguém que eu amava e pedir um afago nos cabelos, mas minha mãe estava tão longe! Longe demais.

Tentava segurar as lágrimas e prometi não chorar mas por diversas vezes que olhava os carros passarem do outra lado da avenida dava-me um nó na garganta e meus olhos lacrimejavam contrariando assim minha promessa. Esperava ansiosamente pelo sábado, mesmo sabendo que não tinha dinheiro para viajar ou mesmo que trabalharia até tarde, mas havia algo me confortava no sábado, a certeza de que no domingo iria de encontro ao meu pai e que dele receberia uma benção seguida de um longo abraço e de minha mãe o tão desejado afago!

Ainda desejava ter um grande amor e beber até ficar de porre por pura curiosidade, mas naquele momento matar a saudade de meus pais era tudo que mais queria.

Naquele momento só queria livrar-me da lembrança que ficava do outro lado da avenida!