O Aborto
- Sinceramente, Não consigo entender a nossa situação e por mais que me esforce para pensar e refletir sobre o caso, mais confusa ainda me sinto - foi a última frase de Elvira à mesa de jantar do restaurante a meia luz. Paolo deixou que ela desabafasse, pois precisava disso. Ao fim de um longo discurso ele finalmente deu seu parecer, a que ela, por sua vez, foi novamente contra.
- Minha querida - disse ainda com o queixo sobre as mãos, mesma posição em que a vinha ouvindo - não tumultue tanto assim os acontecimentos. Desde quando sua mãe é a favor de que nos casemos? Veja só. Acabamos de chegar de deliciosas férias e não conseguimos passar sequer um final de domingo na companhia dela. Ela esteve insuportável. Não gosta de mim; esta é a verdade.
- Você precisa ter um pouco de paciência, meu amor. Mamãe ainda está sentida com a frustração que foi o meu último relacionamento. Da parte de papai até compreendo essa revolta; tudo porque não aceitei casar com Rodolfo, que era tudo o que queriam por causa da situação econômica e do status dele na sociedade. Mas nunca iria casar com um homem que não amo só porque tem muito dinheiro. Não é o que eu procuro.
- Ela não tem que descontar em mim essa raiva. Trata-me como se eu fosse o último dos homens.
- Você precisa ter um pouco de paciência, querido. Mamãe vai acabar mudando ao compreender que não adiantará impedir ou ser contra a nossa felicidade; esqueceu que espero um filho seu?
- Essa é que é minha maior preocupação.
- O que quer dizer?
- Se este filho nascer isto vai significar problemas para nós.
- Não consigo acreditar no que está me dizendo. Você quer que eu aborte o nosso filho; é isto que está me pedindo?
- Você não acha que esta é a solução mais sensata? Um filho agora pode representar o fim da nossa união. Se sua mãe descobre que está grávida ou mesmo que casemos antes, o filho virá fora de época e, nesse caso, ela terá todos os argumentos para nos separar alegando que desonrei sua filha fora do casamento quando não havia sequer consentimento dos pais para uma união legal.
- Você é um monstro! É o que penso de você, se quer saber. - Elvira desabou num choro que chamou a atenção dos que estavam próximos.
- Hei! Pense um pouco. Não haja assim, completamente dominada pela emoção. Pense friamente sobre o caso e me dará razão.
- Jamais! Jamais darei razão a um assassino! Pois, para mim é isto que estará sendo se cometer esse ato. Todavia, jamais o fará. Se pensa que irei submeter-me a isto para satisfazer o seu desejo egoístico está totalmente enganado.
- E o nosso amor; e seu amor por mim, onde fica? - Elvira pensou por um instante, encarando Paolo no fundo dos olhos. Amava-o perdidamente e isto ela não podia negar, posto que estaria enganando a si mesma.
- Infelizmente, ainda o amo. É isso mesmo: infelizmente. Porém nunca irei abortar um filho, está ouvindo? Por mais que esteja apaixonada - disse, tendo agora as lágrimas rolando pela face. Faziam uma cena no recinto em pleno movimento àquela hora.
- Você ainda me dará razão. Está nervosa e não consegue raciocinar friamente. Há de perceber que o aborto é a melhor solução para a nossa felicidade.
- Nunca! Nunca! Está ouvindo? Canalha! Canalha! - desferiu, com toda força de sua ira, um bofetão em Paolo. Tal foi a violência da tapa que ele soltou um gemido de dor. Em seguida, disparou em fortes pisadelas em direção à porta da rua e deixou o local. Foram inúteis as tentativas de Paolo de fazê-la voltar.
- Elvira! Elvira! - Já não mais ligava para os olhares que vinham em sua direção.
- Minha filha! O que aconteceu? - Disse a mãe de Elvira ao vê-la entrar em prantos e jogar-se sobre o sofá da sala de estar.
- A senhora quer mesmo a minha felicidade, mamãe? Promete que não vai me odiar depois da minha confissão; ainda que desaprove o que eu fiz; promete, mamãe; a senhora promete?
- Meu amor; qual a mãe que não quer a felicidade de sua filha? Não tenha dúvida quanto a isso. Mas o que aconteceu? O que você fez de tão errado assim? E por que está neste estado? Já está me deixando preocupada?
- A senhora promete que não vai contar nada para o papai; a senhora tem que prometer.
- Meu amor... eu...
- Ou a assenhora promete ou eu fujo de casa ainda hoje e vou resolver a meu jeito a situação.
- Tem a ver com o seu namorado, não é mesmo?
- Sim.
- Está bem. Tem a minha promessa. Não irei odiá-la e nem falarei com o seu pai.
- Obrigada! Sempre foi minha amiga. Estou esperando um filho de Paolo; esta é a verdade. Desculpe-me, mamãe! - A mãe de Elvira engoliu em seco antes que conseguisse soltar qualquer palavra ou interjeição.
- Sei que agi errado; mas eu o amo. Nunca senti por outro homem o que sinto por Paolo. Mas estou triste, mamãe! Muito triste - e caiu novamente num choro forte e convulsivo.
- E por que essa tristeza? Agora não entendo você.
- É que... bem... é que... Sim, a senhora não gosta de Paolo, esse é o fato que me deixa triste, e muito frustrada.
- Meu amor, ouça-me. Amo você mais do que tudo nesse mundo. E como sou apaixonada por crianças! Isto muda toda a história. Serei vovó, que coisa maravilhosa! Aprenderei a amar esse neto e serei feliz por isso. E como devem estar se sentindo felizes vocês que se amam tanto e já serão papai e mamãe. Só não entendo por que chora; por que chora, meu amor?
- Mamãe; perdoe-me. Já não choro mais. A senhora não sabe o quanto me alegraram essas palavras. E quanto a papai; o que dirá! Como pensa que irá reagir?
- Deixe seu pai por minha conta. Sei como conversar com ele. Ei! Mas aonde vai? - disse ao ver Elvira correr em direção à porta de saída da casa.
- Vou ter com Paolo. Preciso demais conversar com ele; até logo!
- Você gosta de crianças, Paolo? Responda-me unicamente ‘sim’ ou ‘não’.
- Adoro crianças; muito mesmo. Só que...
- Você me ama; ama-me de verdade? Diga-me ‘sim’ ou ‘não’.
- Que pergunta! É claro; você é tudo que eu mais amo nesse mundo. O único problema...
- Esqueça o problema. Não há mais problemas. Suas respostas já foram suficientes para mim. Vamos até em casa; mamãe quer vê-lo imediatamente.
- Mas!...
- Esqueça! Venha comigo - e saiu arrastando-o pela mão - e seremos o trio mais lindo e feliz da face da terra
E Paolo e Elvira casaram-se, tiveram uma linda menina, formando, assim, uma família unida e feliz.