A queda
Aloísio pisou fundo.
Os pneus gritaram num som agudo e histérico. Sentiu o cheiro de borracha queimada... O doce e tentador cheiro da insanidade que lhe devorava a alma naqueles dias; da voz que lhe instigava a pisar mais fundo – a saborear os riscos, a conhecer o mundo além dos limites. Ele obedecia-o respeitosamente. Vinha fazendo aquele percurso há muito dias. Alcançou a primeira curva quando no aparelho de som do veículo, aquele trio de músicos americanos, Bee Gees gritava algo sobre não jogar fora nosso amor. Soltou as mãos do volante e o carro pareceu ganhar vida própria. Por um instante fechou os olhos, a sensação de voar arrebatou-o; no peito o coração batia ao ritmo da música. Naquela noite, entretanto ele foi além dos limites, transpôs a ponte da própria existência. Sentiu-se caindo, mas a própria queda parecia doce e acolhedora...
O quilômetro oito estava parcialmente bloqueado por carros de polícia que lançavam luzes azuis e vermelhas fantasmagoricamente sobre aquele maldito abismo da maldita curva. Lá embaixo, o veículo tombado com as rodas para cima e um tanto escondido pelo mato lembrava um grande animal morto. Quinhentos metros à frente puseram placas de advertência para outros motoristas. Um descuidado já era suficiente, pensava Cléber, um dos rodoviários de plantão aquela noite.
- Certo pessoal! – gritava - Conhecem o regulamento! Aguardaremos o socorro chegar para iniciar essa porra... Raul! Continuaremos o jogo quando voltarmos. Sinto que vou ganhar uma nota hoje! – ambos riram.