Viajando por Portugal com seis GPSs
Em 2011 encontrava-me em Portugal, quando recebi visita de dois irmãos e respectivas esposas. O destino deles era viajar por alguns países da Europa, como Espanha, França, Suíça, Inglaterra e Itália. Portugal, incluído, é claro! Em Portugal, eles queriam fazer a rota Oeste-Norte, saindo de Carcavelos e chegando ao Porto. Entre estas duas cidades, conheceriam Cintra, Óbidos, Nazaré, Batalha, Caldas da Rainha, Marinha Grande, Fátima, Coimbra, Porto e Nova Vila de Gaia. Alugamos um carro, uma minivan Ford, oito lugares, dotada de direção hidráulica, ar-condicionado e GPS. Confortável e com apenas quatro mil quilômetros rodados.
Saímos de Carcavelos, freguesia portuguesa do conselho de Cascais, distante de Lisboa 18 km. Eram 6h30 quando pegamos a estrada rumo ao nosso passeio tão esperado. Saindo pela A9 Crel - Circular Regional Exterior de Lisboa - até alcançar a A8, a autoestrada do Oeste, que nos levaria até Óbidos, nossa primeira parada. Em seguida rumaríamos para Marinha Grande, nossa segunda parada, descendo antes até Nazaré, uma vila portuguesa, com cerca de 10.300 habitantes, conhecida pelas belas praias, as mais concorridas do litoral Oeste de Portugal. Nelas podem ser vistas algumas mulheres, viúvas de pescadores, vestidas com o tradicional traje preto e por baixo sete saias, a cuidar dos peixes que secam ao sol, alinhados sobre estacas.
Depois de Marinha Grande, seguiríamos até Leiria, passando por Batalha, alcançando a autoestrada do Norte, A1, com destino a Porto e Vila Nova de Gaia, nossa parada para pernoite.
Mas não foi isso que aconteceu. Apesar de contar com um GPS alugado, um copiloto carregando um mapa, tudo ficou confuso. O GPS não indicava certo o caminho a ser tomado, principalmente quando era necessário entrar para a direita ou para a esquerda. Ele, por várias vezes, indicou entrada para o lado que não se podia entrar, não havia entrada. Alguns desvios eram recém-construídos e não estavam assinalados no mapa do GPS nem no mapa de papel.
Os copilotos, os irmãos se revezavam nessa função, também não colaboravam, pois só percebiam a entrada da estrada que deveríamos tomar quando esta já havia passado. Nessas ocasiões todo o grupo se manifestava tal e qual o GPS alugado, uns apontando a entrada certa e outros discordando. Eram cinco GPS humanos a falar ao mesmo tempo. O pior era que ao passar do local de entrada, todos diziam que estavam certos, ninguém se acusava pela indicação errada. O motorista era eu, e isso ia me irritando. Já passava das 11 horas e não tínhamos chegado a nenhum lugar pretendido, e Óbidos fica a apenas 75 km de Carcavelos. Para percorrer de Carcavelos à Marinha Grande são 152 km, apenas 1h30 de viagem, correndo o trecho a 110 km/h.
Não sabíamos onde estávamos, isto é, ninguém se preocupava em se localizar no mapa. A confusão era total, já estávamos quase brigando. Irmãos brigando porque não se entendiam sobre qual caminho a tomar. A brilhante ideia veio; entrar em um posto de abastecimento (posto de combustível) e perguntar como chegar à Fátima. Já havíamos desistido de ir até a cidade do Porto.
A orientação veio dura e mexeu mais ainda com os nossos nervos: voltar 100 km, retomar a autoestrada A1 com destino a Lisboa, prosseguir até Fátima. Foi o que fizemos, e depois de percorrer mais 60 km chegamos ao Santuário de Fátima. Que alívio! Deu tempo para assistir à missa, fazer as visitas de praxe, almoçar e comprar lembrancinhas para os amigos cá do Brasil.
De Fátima, fomos para Marinha Grande, onde residem nossos compadres, pais do marido de minha filha, eles portugueses. Tomamos café e seguimos para Batalha, fundada pelo rei D. João. Em1500 pelo documento (Carta da Vila) d’el Rei D. Manuel proclamou o lugar como Vila da Batalha, com jurisdição própria.
Em Batalha encontra-se o Mosteiro da Batalha ou Convento de Santa Maria da Vitória, classificado pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade desde 2007. Mandado edificar pelo rei D. João I, como agradecimento pela vitória na Batalha de Aljubarrota, representa uma das maiores joias arquitetônicas portuguesas, e também o símbolo mais marcante da Dinastia de Avis. Sua construção é atribuída ao Mestre Afonso Domingues. Esse mosteiro é considerado hoje o grande monumento do Gótico final português e o primeiro onde se estreou a "Arte Manuelina", também conhecida como gótico português tardio ou flamejante, é um estilo decorativo, escultórico e de arte móvel que se desenvolveu no reinado de D. Manuel I e prosseguiu após a sua morte, ainda que já existisse desde o reinado de D. João II.
Óbidos e outros lugares como Cintra, Cascais, Lisboa e Carcavelos ficaram para o outro dia. Eles ainda teriam três dias para visitar as belezas de Lisboa. Na oportunidade foram desligados todos os GPSs, o alugado e os humanos. Não seria possível continuar naquela incerteza. Tivemos o cuidado de preparar antes um roteiro para o nosso passeio, incluindo a numeração de todas as entradas, seus códigos, a quilometragem e os lugares a serem visitados. O passeio foi sem estresse e aproveitamos bastante.
Três dias depois, eles seguiram o roteiro programado para as outras cidades da Europa que pretendiam conhecer. Eu e minha esposa seguimos com eles até Madri, de avião. De Madri, fomos de ônibus até Barcelona, passando por Toledo, Zaragoza. Voltamos para Lisboa de avião. Eles prosseguiram no roteiro, com entrada próxima na França, alcançando por Toulouse. Vinte e seis dias depois nos encontramos no aeroporto de Lisboa, rumo ao Brasil. Felizes pelo retorno, dávamos gargalhadas das confusões que aprontamos em Portugal, terra de que eu gosto de verdade.
Gilberto Carvalho Pereira
Fortaleza, CE, setembro de 2011