QUEM CONTA UM CONTO ... (versão Jogon)

Sete horas da manhã. Um embrulho comprido, coberto por um plástico negro, à volta do qual alguém acendera quatro velas, era cercado por pequena multidão de moradores do local, alguém, provavelmente jazia ao chão da calçada em frente a banca de jornais.

Nas proximidades, quando Marcelo e Raul se encontraram:

- Oi Raul, Você viu o corpo caído lá na esquina?

- Não, o que houve?

- Rapaz! Assaltaram o jornaleiro na madrugada, quando o pobre chegava com os jornais, parece que ele reagiu e o bandido atirou duas vezes.

- É mesmo!? Coitado do Seu Chico, o coroa era gente boa, você sabe se o bandido chegou a levar alguma coisa?

- Parece que só o celular dele

- Pô cara! a barra aqui está ficando cada dia mais pesada, valeu. Vou lá dar uma olhada.

Raul saiu em direção à banca de jornais e no caminho encontrou Dona Laurinda na entrada da grande vila onde a senhora morava na casa numero um, cuja família do jornaleiro ocupava a casa cinco.

- Bom dia Dona Laurinda, já sabe o que aconteceu?

- Não, só agora estou saindo para comprar pão.

- Pois é assaltaram o jornaleiro, ele se atracou com o ladrão, rolaram pelo chão e ele perdeu o celular, o dinheiro que tinha e ainda levou 3 tiros.

- Nossa Senhora! Será que a Madalena, minha vizinha, a esposa dele já sabe? Eu não tenho coragem de dar-lhe essa notícia. Meu Deus!!! Que tragédia!

Dona Laurinda, bateu a porta da vizinha da casa dois, pasma e em voz alta:

- Isaura querida! Você não sabe o que aconteceu!

- Que foi mulher?

- Mataram o Seu Chico, marido da Madalena, em um assalto de madrugada lá na esquina.

- O que? Cruzes! Bem que eu ouvi uns cinco tiros um pouco mais cedo – afirmou a outra.

- É mais parece que só quatro acertaram ele, uma bala está cravada na parede do supermercado em frente.

- E agora? - disse Isaura – como vamos dar a notícia à sua mulher, eu não tenho coragem!

- Nem eu!

Bateram então as duas na casa três e Isaura foi logo se adiantando em contar, quase gritando, o fato a Seu Homero, que chegara à porta:

- Tragédia Seu Homero! Mataram o marido da Madalena em frente a banca de jornais dele com cinco tiros, não se sabe se foi execução ou assalto.

- O que? Quando foi isso?

- Ainda agorinha, foi tanto tiro quem nem se sabe se tem mais alguém ferido.

Laurinda só balançava a cabeça confirmando.

- Pobre do Chico, perdi meu parceiro de sinuca, nem posso acreditar, a Madalena já sabe?

- Não tivemos coragem de lhe contar esperamos que o senhor o faça.

- Puxa, mas logo eu que, recentemente sofri um infarto? Péra aí, que vou chamar o Pereira, ele tem mais jeito para essas coisas – e dirigiram-se os três a casa quatro.

A essa altura, outros moradores das vinte casas da vila, já tendo ouvido o falatório, tinham saído de suas casas para saber o que acontecera. Então um consternado batalhão incluindo o Pereira dirigiu-se à casa de Seu Chico. Bateram à porta e Madalena, ainda sonolenta, pois acordara muito cedo para preparar o café da manhã do marido e voltara a dormir. De camisola e descabelada atendeu à porta apenas entreabrindo-a. Então Pereira com sua voz de Padre, não querendo exagerar:

- Madalena querida, tenha calma, estamos aqui pra te ajudar, parece que o Chico foi ferido em um assalto lá na esquina.

- O QUE!? MEU MARIDO? MEU DEUS! O QUE FIZERAM COM ELE!?

Paulinho, o menino, neto de Laurinda, então emendou com os olhos arregalados:

- Ele não está ferido nada, ele está é morto!

Foi aquela confusão. Madalena gritava desesperada. E descalça, de camisola e descabelada como estava, saiu correndo à rua seguida pela solidária tropa de vizinhos. De longe já se podia ver a pequena multidão que cercava o corpo e a banca do Seu Chico fechada. Quando chegaram ao local a comoção era geral. A mulher desmanchando-se em lágrimas atirou-se, sobre o embrulho ao chão sem coragem de destapar-lhe o rosto.

Finalmente, quando o fez, para surpresa de todos o “corpo” era apenas um boneco, cuidadosamente confeccionado de jornais e revistas empilhadas dando-lhe essa forma e que tinha como cabeça uma pequena melancia representando um Judas, pois era sábado de Aleluia e Seu Chico, velho brincalhão que combinara com Marcelo e que não imaginara o alcance de sua brincadeira, havia confeccionado e colocado sobre seus peito uma placa que dizia:

“FELIZ PÁSCOA AOS CURIOSOS E FOFOQUEIROS DO LUGAR”

Aquela páscoa só não foi feliz para ele, que levou uma tremenda surra de Madalena e dos vizinhos ali mesmo, quando abria a banca onde estava escondido e acabou no pronto socorro.

Jogon Santos
Enviado por Jogon Santos em 17/05/2015
Reeditado em 19/05/2015
Código do texto: T5245129
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