UM GRANDE SUSTO
Estava já na 3ª série do Curso Primário. Grupo Escolar Professor Morais. Hoje, escola estadual com o mesmo nome.
Minha nova professora se chamava Ísis. Grande pessoa! Eu sempre ocupava um lugar de destaque nas séries que cursava. Era estimado pelas mestras por ser muito dedicado. Estava quase completando 10 anos de idade, bem pequeno e magrinho, – o menor aluno da sala.
Chegou o sinistro 12 de agosto de 1959. Retornei da escola ao meio-dia, mais ou menos. Almocei, lavei as vasilhas do almoço, como era costume em minha casa, atividade que revezava com minha irmã Aparecida enquanto minha mãe trabalhava firmemente na máquina de costura, tarefa que sempre realizava a fim de ajudar meu pai nas despesas que eram grandes.
Liguei o nosso velho rádio Philips, na Rádio Aparecida, e coloquei mamãe para ouvir o programa “Marreta na Bigorna”, comandado pelo Padre Galvão. Em seguida disse a ela: - Mamãe, vou soltar papagaio! Lembro-me de alguns detalhes desse fato até hoje. Era um papagaio azul, bonito, que eu tinha feito uns dias atrás. Até aqui tudo bem.
13 de agosto de 1959. Acordei no leito do Hospital de Pronto Socorro, que funcionava na Rua dos Otoni, esquina com Av. Bernardo Monteiro, em Belo Horizonte. Minha mãe estava na janela. Eu sentia uma dor terrível na barriga que estava costurada e com um grande curativo. Perguntei à mamãe o que havia acontecido. Ela me contou toda história: que eu tinha caído em uma cisterna de nove metros de profundidade, no lote vago dos fundos de nossa casa, quando, de ‘marcha à ré’, puxando a linha do papagaio, mergulhando em um metro e meio das águas claras do profundo buraco, o pior, de cabeça para baixo. Minha tia, Cacilda, que morava no barracão dos fundos de minha casa, me gritara: “Luiz, cê cai aí. Cuidado!”. Mas era tarde. Meu tio, Valdir, marido da tia Cacilda, comunicou o fato à minha mãe que se descabelava desesperadamente, gritando por Nossa Senhora Aparecida para me salvar, já que ninguém tinha coragem de entrar na cisterna para efetuar meu resgate. Até que a dona Mercês, vizinha, lavadeira, lembrou-se do senhor Osório, motorneiro de bonde, que, certa vez, havia salvado uma criança, por sinal, cunhada de meu irmão Geraldo,irmã da Rosinha, a qual caíra, naquela época, numa fossa. Correu para chamá-lo. Ele morava a uns duzentos metros do local. Imediatamente foi ao meu socorro. Retirou-me com muita dificuldade do fundo das águas. Sangrando na cabeça, com um grande corte, desmaiado, fui levado por meu avô, Padrinho Aprígio, ao Pronto Socorro, quando fui atendido e operado às pressas. Papai estava trabalhando na Fábrica de Tecidos Renascença, junto com o meu tio, seu irmão Francisco. Recebendo um telefonema, foram correndo os dois ao hospital para saber direito o que estava acontecendo. Grande parte desta narração está sendo possível, já que ela me foi passada por meus pais. Como havia desmaiado, não ficou registrado em minha mente o acontecido.
No segundo dia de hospital, a primeira visita que recebi foi do saudoso Padre João Kooyman*, vigário de minha igreja, onde eu era coroinha. Estava de batina preta, e se mostrava muito preocupado. Conversou com mamãe, me abençoou, depois foi embora, demonstrando estar mais tranquilo. Na parte da tarde do mesmo dia, esteve no hospital minha professora do terceiro ano, D. Ísis, também muito preocupada, beijou meu rosto e ficou conversando com mamãe que lhe explicara o que havia acontecido.
Fiquei internado durante cinco dias e, graças a Nossa Senhora Aparecida, que intercedeu a Deus por mim, saí vivo e sem sequelas, continuando o trajeto de minha vida simples, ao lado de minha família.
* Existe em Belo Horizonte, Minas Gerais, no bairro Nossa Senhora da Glória, uma escola com o nome de "Escola Estadual Padre João Maria Kooyman". Em homenagem a este grande sacerdote. Ele tinha por mim um verdadeiro carinho e consideração. Foi ele que me levou para o seminário Nossa Senhora de Fátima, em Itaúna, MG, no ano de 1961.