Conversa de comadre
Cada qual que cate seu feijão, né não, filhote de tejo! Ou então que coloque no fogo cheio de gurgui! Eu que não vou ficar dando colher de xarope pra quem gosta de tossir e ficar mastigando as prastadas de catarro pensando ser o tutano do osso do feijão, tá me entendendo? Se não tiver, pra mim tanto faz, nunca quis ser professora mesmo, se não entende o que eu digo, é porque é do outro lado de lá. Desde que entendo quanto custa um quilo de feijão que sou do lado encarnado, não é agora que serei azul, nunca fui Diana... Espia os olhos do gato pra cima do meu peixe! Sai pra lá rabissaca do meu agouro que já rezei meu rosário pras santas almas do purgatório e minha oração de São Jorge para que meus inimigos, pois bem, já fui inté no banco pegar meu aposento! Me acordei antes do sol nascer e do galo cantar, acendi meu cachimbo, fiz minha oração e levei o penico pra despejar as mijadas da noite. Me banhei do pescoço pra baixo, passei talco entre os peitos, debaixo dos peitos e no pescoço, escolhi uma das minhas calçolas de sair, uma feita de cambraia bordada e bico de organza, meu vestido preto de rosas estampadas, uma sapatilha baixinha, passei meu pó de arroz no rosto e um batom clarinho que tirei num pedido de revista que comadre Ofélia vende, soltei meu cabelos e botei essa tiara que usei no dia de finados do ano trazado e como tou de promessa, não usei nem pulseira, nem anel, nem gargantilha, coloquei minha água de cheiro por detrás das orelhas, a bolsa dos documentos debaixo do braço, o lenço no bolso do vestido, agarrei a sombrinha, tranquei a porta e saí. Já tinha acertado na noite anterior com Caborezinho, filho do compadre Zé Caboré pra me levar de frete no banco, gosto porque ele de vez por outra solta uns cabimento e tenho umas coceira nas partes santa que fico doidinha do juízo! Tá rindo de que espelho sem luz? A carne parece estragada, mas ainda mata a fome que só! No meio do caminho ele sempre para numa lanchonete com história de mijar e o danado parece que nem sabe balançar direito, vem com a calça toda molhada de pingar na cueca. Pois bem, como já sou idosa e tenho meus direitos, foi rapidinho! Cheguei no banco, fui pra máquina, agitei a senha e o papel dizendo do dinheiro saiu na imprimideira, depois agitei a senha de novo e saiu o dinheiro todinho em notas novinhas. De lá saí correndo que nem bala com medo dos igiotas que quer pegar nós pelo pé com a lengalenga mole de fazer empréstimo! Aqui, que sou velha, mas num tou morta! Por isso que digo, quem quiser que cate seu feijão, eu que não perco meu tempo catando o feijão dos outros.