SAMU
Gosto de forrar o meio-fio com pedaço de papel e me estatelar, ali, para assistir ao desfile no aniversário da Pátria.
Numa dessas ocasiões, uma menina vestida de bailarina desfilava e pedia aplausos. Mais pessoas aplaudiam e gritavam "fofa"! Mais graciosos tornavam-se seus passos... Era uma delícia aquele diálogo!
Rapazes marchavam enquanto várias moças gritavam "Lindooo..." estridentemente. Elas mandavam-nos aplaudir. Obedecíamos.
Cães adestrados eram ovacionados primeiro por criancinhas que soltavam guinchos de tanta excitação e alegria.
Mas houve um momento em que todas as vozes se calaram e os dois lados da avenida aplaudiram, espontaneamente, o carro do SAMU.
Fiquei admirada com aquilo... Carro do SAMU, como assim?
Passaram-se alguns meses e presenciei um episódio chocante: Uma mulher tinha convulsões terríveis deitada na rua. O esposo apoiava a cabeça dela em suas pernas enquanto alisava-lhe os cabelos com afeto.
No grupo que se ajuntava uma pessoa perguntou porque ele não a deixava em casa. O marido paciente respondeu que precisava resolver umas coisas e ela não podia passar mal sozinha. Explicou também que, no fim do mês, compraria os remédios e a esposa ficaria bem por bastante tempo.
- Fim do mês? Ainda é dia dez!
Estava ali pasma, inútil, presa naquela cena quando alguém mais solícito resolveu que era preciso chamar o SAMU.
O atendimento chegou rápido. Atendentes de roupa muito branca, silenciosas carregaram a moça, sentaram-na numa cadeira confortável de um carro limpo e prestaram o socorro.
Aquilo marcou, em minha memória, os dois momentos daquele marido: Um trabalhador entregue às próprias limitações e um cidadão assistido pelo Poder Público.
De novo aplaudi o SAMU.