A ARANHA VIVE DO QUE TECE

A ARANHA VIVE DO QUE TECE

Wilman era uma mulatinha daquelas de parar o trânsito. A boquinha bem feita e os dentes bem branquinhos fizeram com que ela se tornasse conhecida como a garota sorriso do Irajá, logo que voltou de Minas Gerais com três filhos, depois de um casamento desfeito, apesar de contar pouco mais de vinte anos.

Ela era daquelas mulheres que, apesar da personalidade tímida, não gostava de ser conduzida, nem levada no cabresto. Engravidou pela primeira vez aos quinze anos, apesar de ter feito porque quis, daí, a sua rebeldia. Também não servia para ser dona de casa. Foi por isso que ela largou o sujeito depois de viver seis anos com ele e voltou para o Rio. Ficou morando com a mãe na mesma casa em que foi criada. Muitos dos vizinhos eram antigos, mas as coisas tinham mudado desde quando ela foi para o interior de Minas Gerais, ainda adolescente.

Sempre reservada, trabalhava, estudava e quase não falava com a vizinhança. Por conta disso achavam que ela era esnobe. Num sábado de verão, quente e ensolarado, Wilman, com a intenção de se refrescar e ao mesmo tempo pegar um pouco de sol, vestiu um biquíni, subiu na laje da casa e deitou-se, despreocupada, sobre uma toalha que estendeu no piso. Não tardou, percebeu que um dos seus vizinhos estava observando o seu corpo bonito, apesar de ter gerado três filhos. Ela, constrangida, retirou-se. Mas, no fundo, queria ficar ali. Tinha gostado de ter atraído a atenção dele, e sentiu-se envaidecida por ser desejada.

Passou a notar que o mesmo vizinho procurava se exibir para ela sempre que podia, mostrando os o corpo musculoso, a pretexto de lavar o carro em frente à janela dela. Ela, carente de afeto, buscou conhecer a respeito daquele homem que estava mexendo com ela e que a olhava sem se preocupar em esconder o interesse. Descobriu que se chamava Edson. Também era casado e, como ela, tinha três filhos. O do meio, inclusive, havia se tornado amigo do seu. Marido e pai dedicado e carinhoso como lhe disseram, fez com que resolvesse não se envolver, a fim de manter a reputação.

Assim, ela continuou a levar a vida. Mas não conseguia esquecer aquele homem que a atraia. O destino resolveu aproximá-los, quando ela acompanhou seus filhos a uma festinha de aniversário de um amiguinho. Ele também estava lá, sem a esposa, e o ambiente festivo deu a oportunidade para se conhecerem. Percebeu que ele era muito carinhoso com os filhos e ficou se imaginando ao lado dele. Quando ele se aproximou, ela ficou nervosa, com medo de que alguém comentasse alguma coisa a respeito deles. Mas, ao mesmo tempo, queria conhecê-lo, porque estava se apaixonando. Ele lhe disse que a esposa tinha ficado em casa cuidando do filho menor, que estava doente, por isso ele estava acompanhando os outros dois.

- Eu estou com os meus três – ela disse.

- Como você pode ter três filhos sendo tão nova? – Ele perguntou.

- Eu não quero falar sobre isso agora. O passado ficou pra trás. Quero viver o presente.

- Você pode me dar o seu telefone?

- Pra quê? Você é casado...

- Eu quero lhe conhecer. Meu casamento é outra história...

- Então anota num guardanapo. Mas me dá o seu também.

Ela guardou rapidamente o papel com o número dele na bolsa, apesar de que não iria ter coragem de ligar. Iria esperar que ele tomasse a iniciativa. Mas nos dias que se seguiram, ele não ligou. Ela não entendia por quê. Ele disse que iria telefonar para ela quando lhe passou o papel e segurou a sua mão por uns instantes.

Certo dia, ela estava chegando do trabalho e o viu limpando o carro justamente em frente à janela dela. Parece que ele adivinhava, porque estava tocando no rádio do carro uma música romântica que ela adorava. Quando ela passou por ele, sem conseguir desviar o olhar, ouviu-o dizer baixinho, que tinha perdido o papel onde havia anotado o seu telefone.

Então, ela ficou muito animada e o seu coração começou a saltar de alegria e ansiedade. Entrou apressadamente em casa. Foi direto para o seu quarto e anotou num pedaço de papel os números do seu telefone. Aproximou-se da janela e, antes de jogar para ele, observou se não havia alguém por perto que pudesse perceber a trama, pois não queria ficar mal falada na vizinhança. Ele abaixou-se, pegou o papel e enfiou no bolso da calça. Estava sem camisa e ela gostava de vê-lo assim, exibindo para ela o corpo musculoso e queimado de sol.

Ele ligou no dia seguinte. A voz mais suave, carinhosa e carente que ela tinha ouvido, dizendo que era o Edson. Nem precisava, bastou ouvir uma vez, para nunca mais esquecer. O seu coração acelerou e o seu corpo se excitou, pelo prazer de estar prestes a realizar o seu desejo do momento. Ficaram mais de uma hora conversando sobre suas vidas até que ela sugeriu um encontro.

Numa quarta-feira, à tarde, eles se encontraram e, dali em diante, tudo mudou na vida de Wilman... Ao ficar frente a frente com ele, sem negar a intenção de ambos, óbvio, mesmo que seu corpo todo pedisse, ela não permitiu, sem saber o porquê, que ele fizesse carícias mais ousadas que um delicioso e ardente primeiro beijo, cujo gosto ficou na sua boca durante várias horas.

Diante da promessa mútua de não revelarem para ninguém o que estava acontecendo entre eles, marcaram um novo encontro, quando aconteceu a primeira vez. Viveram cerca de seis meses de uma paixão louca e insaciável em que o desejo de ambos não se esgotava. Eram encontros furtivos, depois que ela saía do trabalho. Iam ao cinema ou a motéis. Ele, aos sábados dizia que iria trabalhar, era ladrilheiro, o que facilitava a mentira, e, às vezes, iam à praia ou ficavam horas prolongadas num motel. Mas nunca passaram uma noite juntos.

Vivendo esse amor escondido, Wilman não vislumbrava a possibilidade de ter o homem amado só para si e Isso a entristecia. Mas a paixão por aquele homem era mais forte que ela, que se entregava, por inteiro, nos seus momentos de amor. Ela não gostava nem de pensar em perdê-lo. Necessitava dele e, por isso, nada exigia, contentando-se em dividi-lo com uma pessoa que era o oposto dela. Tinha certeza, que ele jamais trocaria a esposa por ela. Era a dona de casa perfeita, a mãe dos seus filhos, sempre servil e dedicada. Por isso merecia todos os presentes, inclusive carro do ano... Talvez, até por remorso de manter relacionamento com uma amante. Era sua triste realidade: Wilman, a amante... que, ao contrário da esposa, de quem foi o único, conheceu outros homens, trabalhava, estudava... e, da maneira que entrou em sua vida, poderia sair e ir para os braços de outro. Talvez, insegurança fosse a maior causa do relacionamento infeliz... Talvez não fosse amor, como Wilman sentia por ele... mas, gratidão, talvez, por ser mãe dos seus filhos... somente desejo, ou necessidade de ter duas mulheres... diferentes...

Não bastasse a condição de ser a amante, Wilman resolveu aproximar-se da rival e tornou-se amiga íntima de Elma, a esposa, com o propósito de conhecer a intimidade do casal e tirar proveito da situação. Mas o tiro saiu pela culatra. Wilman descobriu que Elma, apesar de viver na mesma casa que ele e dormir na mesma cama, havia algum tempo não praticava atividade sexual com o marido. Contou para a nova amiga, que não sabia a razão de ele não procurá-la mais, apesar de estar sempre disposta a fazer o papel de esposa quando ele quisesse, embora não sentisse prazer.

Então, Wilman, depois que se tornou amiga de Elma, não teve mais coragem de ser parceira na traição, e teve medo de que a relação entre ela e Edson fosse descoberta. Viveram, ambos, desde então, angustiosamente, contendo o desejo não esmorecido, sem darem vazão aos seus anseios que afloravam, perturbadoramente, quando se viam.